A investigadora Sara Falcão Casaca ainda não teve acesso a dados desagregados por sexo (que não estão a ser disponibilizados pelo Ministério do Trabalho e da Segurança Social), mas já consegue antecipar que as mulheres estão mais expostas aos efeitos da pandemia covid-19 no mercado do trabalho, por duas razões: porque têm vínculos mais precários e porque são a maioria nos setores mais afetados.
“Aquilo que já sabemos é que esta crise é sanitária, mas é, também já, económica e laboral. E é distinta da crise que se iniciou em 2008, que começou por afetar as atividades mais vulneráveis ao setor financeiro. O novo [na atual crise] é que os setores de produtividade onde as mulheres estão mais representadas estão mais expostos a vários níveis”, observa a professora no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) da Universidade de Lisboa e coordenadora do projeto Women on Boards.
Entre essas atividades “amplamente feminizadas” estão a saúde e a assistência – as mulheres são a maioria entre auxiliares de saúde (92%), enfermeiros (82%) e médicos (55%) e também entre quem presta cuidados a idosos e dependentes (80%) –, os serviços de subsistência (como supermercados) e a restauração e a hotelaria – onde dois terços do trabalho é assegurado por mulheres.
“Muitas das atividades encerradas ou contraídas são feminizadas”, frisa Sara Falcão Casaca, dando os exemplos de cabeleireiros, esteticistas e limpezas, serviços prestados por mulheres em 90% dos casos. Também 64% das pessoas que estão ao balcão de lojas e comércio são mulheres.
A somar a isto, “a precariedade é muito elevada” em grande parte dessas atividades e inviabiliza “almofadas financeiras”, assinala, acrescentando que muitas mulheres trabalham por conta própria, a recibo verde, e três quartos delas não empregam outros trabalhadores, trabalhando sozinhas.
Ora, a pandemia impôs outras duas circunstâncias que tornam tudo mais complicado ainda: as mulheres deixaram de ter a “retaguarda fundamental dos avós”, grupo de risco da covid-19, e o teletrabalho trouxe o que fazem para dentro de casa, dificultando ainda mais a conciliação.
Outro dado significativo é o impacto que a crise terá nas comunidades imigrantes, nomeadamente nas mulheres que as integram, e nas famílias monoparentais (em 85% compostas por mulheres).
“Sabemos que as mulheres estão muito mais fragilizadas do que os homens e vão sofrer muito mais com as consequências desta pandemia”, corrobora Helena André, diretora da OIT/ACTRAV (Centro das Atividades para os Trabalhadores).
“Se houver um aumento forte do desemprego – e sabemos que vai haver um aumento muito forte do desemprego –, as mulheres vão ser as primeiras a serem penalizadas no regresso ao mercado de trabalho e em praticamente todos os setores de atividade”, constata.
“Não é nada de novo, que não tenha acontecido em crises anteriores, mas mostra-nos que a nossa capacidade para estabilizar a situação e a posição das mulheres no mercado de trabalho não tem sido feita com o cuidado que devia ser feito”, admite a antiga ministra do Trabalho.
Helena André deixa um aviso: “se o teletrabalho passar a ser algo muito mais expandido do que até agora, terão que se procurar seriamente infraestruturas de apoio às mulheres em teletrabalho, sobretudo as que têm familiares a cargo, quer sejam crianças ou pessoas mais idosas”.
LUSA/HN
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