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O primeiro doente chegou. Para se multiplicar rapidamente
O povo português está a mostrar uma capacidade de resposta à ameaça representada pela COVID-19 que é, no mínimo, exemplar. Somos um povo resiliente, naturalmente solidário. Perante o perigo, somos capazes de nos mobilizar em bloco e respeitar as regras definidas pela autoridade. Somos um estado social, em que o bem comum e a proteção dos cidadãos, prevalece. O Serviço Nacional de Saúde (SNS) e as suas instituições, apesar das fragilidades financeiras bem conhecidas, reúne um grupo de profissionais que garante cuidados de excelência.
O hospital onde trabalho é um dos centros em Portugal preparado para responder a doenças emergentes. Os nossos peritos nacionais alertaram para o problema que se avizinhava, antes mesmo de estar plasmada nos meios de comunicação social a catástrofe que grassava em Itália. Foi necessário tomar decisões rápidas, bem fundamentadas, envolvendo os diferentes intervenientes. A resposta da teia de profissionais hospitalares foi de um rigor e uma generosidade inultrapassáveis. Foi necessário repensar o hospital como um organismo único, com um foco bem definido. Limitar a atividade ao essencial e preparar a resposta ao cataclismo que se adivinhava. Essa resposta foi rápida e eficiente, formaram-se equipas multidisciplinares, redigiram-se protocolos, definiram-se circuitos. De peito aberto, preparamo-nos para o embate. E o primeiro doente chegou. Para se multiplicar rapidamente. O nosso mundo passou a ser norteado por riscos vermelhos e verdes desenhados no chão, por equipamentos de proteção individual que dificultam a respiração e impedem os movimentos, por novos gestos que desafiam a vontade indómita de agir o mais rápido possível. O medo perdeu. Os profissionais agarraram este desafio e mostraram a sua força. A primeira vaga passou. Temos que nos preparar para voltar à normalidade num mundo em que a ameaça se mantém. Vai ser mais difícil agora. Temos algum tempo para nos prepararmos, mas também para refletir. De todo este processo, retenho algumas mensagens indeléveis.
Primeiro, a imensa mais valia da saúde são os seus recursos humanos. O rigor e a preparação técnica, o sentimento primordial de ajudar o próximo, são transversais aos profissionais de saúde. A comunidade reconheceu esta realidade, manifestações de solidariedade e de suporte estenderam-se durante semanas.
Segundo, o SNS é único na capacidade de resposta às necessidades da comunidade. Os hospitais públicos assumiram a posição de primeira linha na resposta à pandemia. Vamos todos ter um papel essencial na retoma dos cuidados de saúde aos portugueses, mas financiar o SNS e capacitar os hospitais públicos, tem que ser uma estratégia nacional para os próximos anos.
Terceiro, a forma como nos posicionamos como prestadores e recetores de cuidados de saúde tem que ser repensada. A utilização desorganizada de serviços de saúde não pode ser tolerada numa era em que se exige a sua racionalização. As instituições precisam garantir planeamento, agendas rigorosas, planos de tratamento realistas, contacto fácil com os hospitais. É necessário investir mais em hospitalização domiciliária, em cuidados de proximidade, em soluções de dispensa de medicamentos em farmácias de comunidade. Otimizar o tempo de todos, garantir a fluidez dos processos, evitar aglomeração de pessoas, tem que estar na ordem de trabalho.
Quarto, é inquestionável a incorporação de novas ferramentas informáticas e plataformas digitais na rotina clínica. O tratamento de dados e a possibilidade de prever a evolução da pandemia foram fulcrais na tomada de decisões. O acesso remoto a instrumentos de apoio clínico permitiu a realização de consultas não presenciais, aumentando a segurança do utente. No futuro, esta realidade estará mais presente, com benefício ao evitar deslocações desnecessárias.
A definição de estratégias, a capacidade de comunicar e o envolvimento de toda sociedade vão ser decisivos nas próximas etapas da resposta à pandemia.
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