No laboratório 427 do edifício de Química, Marta Marques e Tânia Neto, ambas bolseiras, estão atarefadas com as suas experiências. Os dois meses de paragem devido à pandemia de covid-19 foram “muito longos” e Marta diz que vai ser difícil recuperar todo o tempo perdido.
“Foi uma coisa repentina, ninguém estava à espera de parar tanto tempo. Agora estamos a retomar aos poucos, mas temos o trabalho um pouco atrasado”, assume a bolseira, ainda a tentar habituar-se ao “novo normal”.
“É um bocado complicado. Neste momento estamos a trabalhar por turnos, temos uma lotação máxima permitida e temos de tentar planear o trabalho de forma a cada um de nós poder continuar o seu trabalho. Não vai ser fácil”, admite.
Num edifício em que circulam habitualmente mais de 1.000 pessoas por dia, os corredores estão agora desertos, muitas portas fechadas e as poucas abertas desvendam salas com pouca atividade face ao que acontecia há pouco mais de dois meses.
“Tipicamente, antes da pandemia, o estudante vinha e perguntava ao orientador o que tinha de fazer. Estava cá todos os dias e todos os dias ia ao laboratório. Agora há alguma limitação à presença física, que foi reduzida para um terço, e têm de planear o que vão fazer e regressar a casa para tratar os dados. O planeamento é mais exigente, mas é também mais eficiente. É também a oportunidade de mudar alguns hábitos, deixarmos de estar apenas de corpo presente e vir para trabalhar em tarefas especificas”, explica o professor João Lima.
Quanto à paragem e ao que significou no trabalho de muitos investigadores, João Lima considera que até ao verão os alunos poderão pôr os trabalhos em dia.
“Esta é a altura certa para começarmos a reabrir e até ao verão conseguiremos recuperar. Se planearmos com cuidado e formos objetivos é um atraso recuperável”, diz o responsável do departamento de Química, referindo que “é importante realizar o máximo de trabalho experimental nesta fase” para o caso de serem forçados a uma nova paragem.
É o que está a fazer André Seco, aluno de doutoramento, que consegue ver o lado positivo da paragem e o aproveitou para “adiantar trabalho”.
“Durante o tempo em que estive em casa deu para pôr alguns dados em ordem e escrever coisas que já andava a adiar há algum tempo. Aproveitei para rever os dados e as experiências que tinha feito. Com base nisso planeei trabalho para os próximos tempos e o que venho fazer é esse trabalho, procurando estar aqui o mínimo tempo possível”, diz André Seco.
Ainda assim, assume que nos próximos meses será difícil se tiver de enfrentar um novo confinamento.
“O meu trabalho agora está numa fase que envolve uma componente experimental muito forte e a paragem prolongada pode condicionar o desenvolvimento do projeto”, confirma.
Uma preocupação partilhada pelo reitor, João SàÁgua.
“Quando implementamos as medidas tivemos uma dupla preocupação: respeitar as normas de saúde e, simultaneamente, atender às necessidades do que primeiramente era necessário reabrir para permitir que a atividade e o semestre se concluísse com sucesso”, diz à Lusa o reitor.
Apesar das limitações, o responsável classifica como “positivo” o processo iniciado a 04 de maio.
“Tudo o que estava a ser feito à distância de um modo incompleto pode agora ser complementado com esta parte presencial. O que se nota nestes 15 dias é o retomar da atividade no ensino, sobretudo aulas práticas e laboratoriais, e também um pouco já de ensino clínico, com retoma do campo da investigação”, resume.
A avaliação destes alunos é também um tema em análise pela direção da FCT e o seu diretor, Virgílio Machado, afirma que a faculdade quer garantir que os que foram afetados por este período de pandemia saem para o mercado de trabalho “exatamente com as mesmas competências” que colegas de outros anos. Para isso, há medidas excecionais que podem ser adotadas.
“No processo de avaliação há uma grande necessidade de rigor e temos de garantir que um aluno que sai da FCT nesta fase tem as mesmas competências que qualquer outro que o fez sem ser no período de pandemia. A avaliação à distância não é completamente fiável e o pior que podemos fazer é enganar o mercado. Há limitações que pretendemos colmatar e ponderamos até que possa haver um período para complementar as formações”, assegura.
Agradado com a capacidade de resposta que a comunidade escolar deu à pandemia, Virgílio Machado aguarda com ansiedade o regresso de todos, mas reconhece que há ainda muito a percorrer até essa data.
“As pessoas estão com muita vontade de vir, mas também têm receio de afetar terceiros. Vamos ver o que pode acontecer quando acontecer o desconfinamento completo”, termina.
Portugal contabiliza 1.190 mortos associados à covid-19 em 28.583 casos confirmados de infeção, segundo o último boletim diário da Direção-Geral da Saúde (DGS) sobre a pandemia.
LUSA/HN
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