Dia de África sob o signo da covid-19 e da urgência de calar as armas

24 de Maio 2020

O continente africano assinala, na segunda-feira, o Dia de África, marcado, este ano, pela luta contra a covid-19 numa região a braços com vários conflitos e onde a integração económica continua longe do desejado.

Em maio de 1963, à medida que a luta pela independência do domínio colonial ganhava força, líderes de Estados africanos independentes e representantes de movimentos de libertação reuniram-se em Adis Abeba, na Etiópia, para formar uma frente unida na luta pela independência total do continente.

Da reunião saiu a carta que criaria a primeira instituição continental pós-independência de África, a Organização de Unidade Africana (OUA), antecessora da atual União Africana.

A OUA, que preconizava uma África unida, livre e responsável pelo seu próprio destino, foi estabelecida a 25 de maio de 1963, que seria também declarado o Dia da África.

Em 2002, a OUA foi substituída pela União Africana, que reafirmou os objetivos de “uma África integrada, próspera e pacífica, impulsionada pelos seus cidadãos e representando uma força dinâmica na cena mundial”.

Cinquenta e sete anos depois, e devido à pandemia de covid-19, o Dia de África vai ser assinalado com série de iniciativas “online”, promovidas pela União Africana, pelos países individualmente e por organizações parceiras, estando previstos também dois concertos de angariação de fundos para a luta contra o novo coronavírus.

A União Africana realiza uma jornada de eventos, a transmitir pelas principais plataformas digitais, tendo como ponto alto uma cerimónia com intervenções do chefe de Estado da África do Sul e presidente em exercício da organização, Cyril Ramaphosa, e do presidente da Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat.

Previsto está também um debate sobre o tema “Silenciar as armas, criar condições favoráveis para o desenvolvimento em África”.

O programa para o silenciamento das armas em África até 2020 foi lançado dez anos e adotado em 2013 pelos líderes da União Africana como um dos projetos emblemáticos da organização, que considera os conflitos como um dos maiores impedimentos à implementação da sua agenda de desenvolvimento para o continente (Agenda 2063).

A proposta era acabar com todas as guerras, conflitos armados, violência sobre mulheres e violações de direitos humanos, bem como prevenir a ocorrência de novos genocídios no continente.

Apesar de o objetivo estar longe de ser alcançado, nas duas últimas décadas foram resolvidos conflitos em países como Angola, Costa do Marfim, Libéria ou Serra Leoa e feitos progressos em casos considerados difíceis, como a Somália e o Sudão, de acordo com uma avaliação do Institute for Security Studies (ISS) africano.

Por outro lado, segundo dados do Instituto de Investigação pela Paz de Oslo, o número de países africanos com conflitos triplicou nos últimos 15 anos, existindo agora 17 estados africanos em que existe algum tipo de conflito armado.

Conflitos armados, violência étnica e ataques extremistas continuam a afetar países como a Líbia, o Sudão do Sul, a República Centro-Africana, a República Democrática do Congo, bem como partes da Nigéria, Níger e Camarões, Mali ou Burkina Faso.

“Vamos redobrar os esforços para calar as armas no continente para conseguirmos resolver de forma eficiente os impactos da covid-19”, desafia a União Africana.

A pandemia causada pelo novo coronavírus será, de resto, o tema marcante das comemorações do Dia de África, com a organização pan-africana a lançar o desafio para a recolha, durante o dia de segunda-feira, de um milhão de dólares para o fundo de resposta à covid-19.

“No Dia de África, todos os africanos, pessoas de origem africana e amigos de África são encorajados a dar um pouco. A meta para o dia é de 1 milhão de dólares”, apela a organização.

Será ainda lançado, pelo Centro para o Controlo e Prevenção de Doenças (África CDC), o programa de Liderança em Saúde Pública Kofi Annan, que visa honrar a contribuição do antigo secretário-geral das Nações Unidas, já falecido, para a criação do Fundo Global para o HIV/Sida, Tuberculose e Malária.

A UA defende a necessidade de uma “nova ordem de saúde pública” para defender os africanos de ameaças à saúde e à segurança económica, sublinhando o papel essencial de “líderes experientes, bem treinados e informados” para transformar eficazmente as instituições de saúde africanas “em entidades técnicas geridas de forma eficiente”.

Por seu lado, a agência de desenvolvimento da União Africana (AUDA-NEPAD) promove um “webinar” sobre as oportunidades em África durante e após a pandemia, com a discussão a abordar, entre outros temas, na Zona de Comércio Livre em África (AfCFTA, na sigla em inglês), cujo arranque oficial da fase de operacionalização foi adiando de julho de 2020 para janeiro de 2021.

“Durante este período invulgar, precisamos de pensar em termos das nossas próprias cadeias de valor regionais porque as cadeias de valor globais estão a ser perturbadas”, apontam os promotores da iniciativa.

A discussão acontece poucos dias depois do lançamento da segunda edição do Índice sobre a Integração Regional em África, a primeira edição é de 2016, que avalia os progressos da integração regional no continente.

De acordo com o relatório, embora 20 países tenham uma pontuação acima da média, nenhum país africano pode ser considerado bem integrado na sua região.

O relatório concluiu que é necessário fazer muito mais para integrar as economias regionais de modo a torná-las mais resistentes a choques como a atual pandemia da covid-19.

Globalmente, o índice mostra que os níveis de integração no continente são relativamente baixos, com uma pontuação média de 0,327 em 1.

Em África, há 3.246 mortos confirmados em mais de 107 mil infetados em 54 países, segundo as estatísticas mais recentes sobre a pandemia naquele continente.

Entre os países africanos que têm o português como língua oficial, a Guiné-Bissau lidera em número de infeções (1.114 casos e seis mortos), seguindo-se a Guiné Equatorial (719 casos e sete mortos), Cabo Verde (371 casos e três mortes), São Tomé e Príncipe (291 casos e 11 mortos), Moçambique (168 casos) e Angola (61 infetados e quatro mortos).

LUSA/HN

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