A grande maioria dos jovens que se mutilam ou têm pensamentos suicidas mostram apenas um transtorno mental “leve a moderado”, em vez de sintomas mais óbvios associados a doença psiquiátrica suscetível de ser diagnosticada, de acordo com um novo estudo.
As medidas para reduzir o risco de suicídio nos jovens devem concentrar-se na globalidade deste grupo etário e não apenas naqueles que estão mais angustiados, deprimidos ou ansiosos, afirmaram investigadores da Universidade de Cambridge durante a semana “Mental Health Awareness”.
Os especialistas argumentam que os pequenos aumentos de stresse em toda a população, devido ao confinamento provocado pelo coronavírus, podem aumentar o risco de suicídio nos jovens, não sendo detetado por não existirem evidências de doença psiquiátrica.
“Parece que a automutilação e o pensamento suicida entre os jovens aumentam dramaticamente na fase normal ou não clínica de sofrimento mental”, referiu Peter Jones, do Departamento de Psiquiatria de Cambridge e autor sénior do estudo.
“Estas descobertas mostram a necessidade de estratégias políticas públicas para reduzir o suicídio, que apoiem uma melhor saúde mental para todos os jovens e não apenas para aqueles que estão mais gravemente deprimidos ou ansiosos”, disse Jones, que também é consultor do “Cambridgeshire and Peterborough NHS Foundation Trust”.
Os investigadores de Cambridge realizaram o estudo em conjunto com colegas da Universidade de Londres. O trabalho foi apoiado pelo” Wellcome Trust” e pelo “National Institute for Health Research”, e recentemente publicado na revista “BMJ Open”.
Estudos recentes sugerem uma ampla gama de problemas de saúde mental – por exemplo, depressão, ansiedade, comportamento impulsivo, baixa auto-estima, etc. – que podem ser consideradas como um todo para medir os níveis de “sofrimento mental comum” (CMD).
Os investigadores analisaram este tipo de sofrimento em dois grandes grupos de jovens através de uma série de questionários. E também reuniram, separadamente, dados auto-referidos sobre pensamento suicida e auto-lesão não suicida. Estes são os marcadores preditivos para o aumento do risco de suicídio, a segunda causa mais comum de morte em crianças e jovens dos 10 aos 24 anos em todo o mundo.
Ambos os grupos incluíram jovens de 14 a 24 anos de Londres e Cambridge. O primeiro reuniu 2.403 participantes. Os métodos do estudo – e os resultados – foram então reproduzidos num grupo separado de 1.074 participantes.
“As nossas descobertas são dignas de atenção por terem sido idênticas nas duas amostras independentes”, disse Jones.
Os jovens com grave sofrimento mental apresentaram maior risco de suicídio. No entanto, a maioria dos participantes que tiveram pensamentos suicidas ou que se auto-lesionaram – 78% e 76%, respetivamente, na primeira amostra; 66% e 71% na segunda – foi classificada como tendo níveis “leves ou moderados” de sofrimento mental.
“As nossas descobertas ajudam a explicar por que motivo a investigação focada em indivíduos de alto risco ainda não se traduziu em ferramentas clínicas úteis para prever o risco de suicídio”, disse Jones. “Auto-agressão e pensamentos suicidas merecem uma resposta rápida, mesmo que ocorram sem mais evidências de uma doença psiquiátrica”.
Os resultados apontam para uma situação aparentemente contraditória, na qual a maioria dos jovens que se suicidam podem, de fato, pertencer ao grupo daqueles que são considerados de” baixo ou nenhum risco de suicídio”.
“É sabido que, para muitas condições físicas, como a diabetes e doenças cardíacas, pequenas melhorias ao nível do risco da população em geral se traduzem em mais vidas salvas, em vez de nos focarmos apenas nas pessoas com risco extremamente elevado”, disse Jones.
“A isto se chama “o paradoxo da prevenção”, e acreditamos que o nosso estudo é a primeira evidência de que a saúde mental pode ser vista da mesma maneira. Precisamos de uma saúde pública e de uma abordagem clínica para o risco de suicídio”.
“Estamos rodeados de tecnologia pensada para atrair a atenção das crianças e jovens, e o seu efeito no bem-estar deve ser visto pela indústria como uma prioridade além do lucro”.
“Ao nível governamental, as políticas que afetam a economia, o emprego, a educação e a habitação, a saúde, a cultura e o desporto, devem ter os jovens em consideração. Apoiar o seu bem-estar é um investimento, não é um custo. Isso é particularmente importante à medida que os efeitos generalizados da pandemia de Covid-19 se multiplicam”.
HN/AO
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