António de Sousa Uva Médico do trabalho, Imunoalergologista e Professor catedrático da NOVA (ENSP)

A propósito da COVID-19: o invisível ganha visibilidade!

05/29/2020

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A propósito da COVID-19: o invisível ganha visibilidade!

29/05/2020 | Opinião

De repente começam a soar todos os avisos relativamente ao número muito desproporcionado de casos de COVID-19 na região onde vivo (LVT). Fazendo um “fine tuning” identificam-se, entre outras, cadeias de transmissão em aglomerados de empresas, em trabalhadores da Construção Civil e Obras Públicas, em Lares (alguns ilegais) ou em estabelecimentos da área da restauração em zonas habitacionais concretas.

A área que estudo, investigo e ensino é a área da Saúde (e Segurança) Ocupacionais e, aparentemente, essa relação poderá até parecer errática. De facto, não é!

Não sei se é uma característica nossa ou se é apenas muito frequente, nós temos algum hábito de “varrer para debaixo do tapete”. Todos sabemos há muito (incluindo alguns reguladores), mas fazemos “vista grossa” que haverá provavelmente quatro dígitos” gordos” de Lares ilegais, que é muito frequente ou que existe a contratação extemporânea de trabalhadores da Construção Civil (à jorna) e das condições com isso correlacionadas.

Eu, que começo a trabalhar muito cedo (sou uma “cotovia”), “tropecei” há uns anos atrás nessas contratações diariamente no Campo Grande onde não era preciso ser muito atento para reconhecer diariamente essa realidade. Nos últimos tempos isso não tem sido tão visível.

Mas o que tem isso a ver com a Saúde Ocupacional (ou se se preferir com a Saúde e Segurança do Trabalho)? Tudo!

É outra área onde é muito frequente, se não o incumprimento, o pseudo-cumprimento das obrigações normativas onde a componente substantiva é quase sempre ocultada por exigências “administrativas” que concentram a atenção de todos, mas que também todos sabem, que ocultam a razão da sua existência: a promoção e a proteção da saúde de quem trabalha e a manutenção da capacidade de trabalho em termos físicos e psicológicos. A vigilância de saúde periódica, ritualizada e “inespecífica” é disso um bom exemplo muito generalizado e bem conhecido de quase todos ao “actores” que intervêm nesta área.

De facto, a proteção da saúde e da segurança dos trabalhadores, realizada por Serviços de Saúde Ocupacional competentes, com profissionais competentes e com formação específica adequada, são insubstituíveis para que essas tarefas sejam cumpridas. É o que se passou agora também a propósito do risco de COVID-19 como risco específico, risco geral ou risco geral acrescido.

Quando esta actual “onda-canhão” (não necessariamente da Nazaré) atingiu a continuidade de negócio do nosso tecido empresarial, os recursos “para cumprir a lei” não serviram para “fazer o que deveriam” na proteção da saúde da população trabalhadora. A gestão eficaz desse risco e a sua “geminação” com a continuidade do negócio (produção) e a preservação e proteção da saúde de quem faz parte desse processo produtivo não se pode dizer que tenha sido generalizada.

Mas nada está perdido! Tenho uma enorme convicção que a aprendizagem é o motor do desenvolvimento e oxalá que possamos aproveitar a atual situação para aprender a melhorar o panorama atual da saúde e segurança dos trabalhadores em Portugal. Tenho a profunda certeza que isso vai acontecer porque a boa produção exige bons produtores e a sua saúde e segurança não se pode circunscrever a um “adereço” e acredito muito nas empresas e nos empresários.

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