Universidade de Bristol: estudo revela que a solidão torna mais difícil parar de fumar

15 de Junho 2020

Num estudo publicado na revista “Addiction”, investigadores da Universidade de Bristol encontraram um nexo de causalidade entre solidão e tabagismo.

Embora numerosos estudos tenham mostrado que existe uma associação entre ambos, tem sido difícil perceber se a solidão leva ao abuso de substâncias ou se, pelo contrário, é o abuso de substâncias que conduz à solidão.

Ao aplicar um novo método de pesquisa a esta questão – randomização mendeliana – que utiliza dados genéticos e exames de centenas de milhar de pessoas, a equipa descobriu que a solidão parece traduzir-se numa maior probabilidade de fumar.

“Este método nunca tinha sido aplicado a esta questão anteriormente e, portanto, os resultados são novos, mas também preliminares. Encontramos evidências que sugerem que a solidão leva ao aumento do tabagismo, com maior probabilidade de as pessoas começarem a fumar, consumirem mais diariamente, e dificuldades acrescidas para deixar de fumar”, referiu a co-autora do estudo, Robyn Wootton.

Estas evidências refletem as tendências observadas durante a pandemia: o “YouGov Tracker” sugere que 2,2 milhões de cidadãos ingleses estão a fumar mais do que antes do confinamento. No sentido oposto, também existem evidências de que começar a fumar aumenta a solidão dos indivíduos.

“A conclusão de que fumar também pode aumentar a solidão é provisória, mas está de acordo com outros estudos recentes que identificaram o tabagismo como um fator de risco para problemas de saúde mental. Um mecanismo potencial para esta relação poderá ser a interferência da nicotina com os neurotransmissores, nomeadamente a dopamina, no cérebro”, referiu Jorien Treur, autor sénior do estudo.

Deborah Arnott, diretora executiva da “Action of Smoking & Health”, comentou que “se as pessoas solitárias têm maior probabilidade de começar a fumar e têm mais dificuldade para parar, também têm maior probabilidade de   sofrer os danos provocados pelo tabaco. O tabagismo é a principal causa de morte prematura evitável. Esta investigação destaca a necessidade de os fumadores, sobretudo os mais solitários, receberem apoio para parar de fumar, melhorando não apenas o seu bem-estar mas também a sua saúde mental”.

A equipa da Universidade de Bristol investigou igualmente a relação entre solidão e o abuso de álcool, mas não encontrou evidências claras de uma relação causal. “Embora o método que usamos tenha vantagens importantes, é cedo para este tipo de estudo. Sugerimos, portanto, que sejam realizadas novas investigações quando se souber mais sobre a genética da dependência do álcool e a solidão”, referiu Jorien Treur.

De acordo com o Gabinete de Estatísticas Nacionais, durante o primeiro mês de confinamento, cerca de 7,4 milhões de ingleses disseram que se sentiram sozinhos e sem redes de apoio.

“De repente, todo o Reino Unido ficou socialmente mais isolado do que nunca, e para muitas pessoas isso provavelmente significa solidão. Ficamos realmente interessados quando verificámos que a solidão diminui a probabilidade de deixar de fumar. Pensamos que este é um dado realmente importante para quem tenta parar de fumar durante a pandemia”, afirmou Robyn Wootton.

“Embora o nosso estudo não analise os efeitos da solidão e do isolamento social como resultado da pandemia, pode lançar alguma luz sobre as consequências da solidão em geral”, acrescentou.

Nota bibliográfica
Bi-directional effects between loneliness, smoking and alcohol use: Evidence from a Mendelian randomisation study by Robyn E Wootton†, Harriet S R Greenstone, Abdel Abdellaoui, Damiaan Denys, Karin J H Verweij, Marcus R Munafò and Jorien L Treur in Addiction, June 2020.

NR/HN/Adelaide Oliveira

 

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