Rui Cernadas Assistente Graduado MGF

Filosofia, Alquimia E Medicina

06/25/2020

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Filosofia, Alquimia E Medicina

25/06/2020 | Opinião

Vai-se dizendo que a pandemia da COVID-19 tudo mudou ou que, no mínimo, deixará traços para uma nova normalidade.
Por todas as razões e euros ou dólares, a indústria farmacêutica também saberá responder a este desafio.

Vimos de resto como, por uma grande diversidade de países, o valor do medicamento e o do profissional de saúde foram revalorizados. Pelos Estados, pela Comunicação Social e pelo público em geral. Mas não nos iludamos, como nas Bolsas, tratam-se puros movimentos especulativos, vazios de sentimento, ocos de racionalidade.

Longe vão os tempos em que eram as pessoas, os investigadores que, em cada Companhia, marcavam a diferença pelo seu saber e intuição.

Os custos dessa genialidade foram sendo substituídos por processos de detecção dos receptores farmacológicos celulares, estruturados em unidades de análise e experimentação de dimensão. Talvez a consequência mais óbvia tenha sido a da concentração de novas soluções em patologias de mais vasta e profunda compreensão das correspondentes fisiopatologias.

Por tudo isto o continuum de desenvolvimento farmacológico foi tornando-se diferente, também mais arriscado, logo mais dispendioso.
E os períodos de patente encurtaram, desde logo, porque a contagem temporal arranca desde o início…

Pelo meio a indústria farmacêutica, para onde se dirigem agora as preces por uma vacina ou fármaco para a COVID-19, seguiu a tendência de outras indústrias e negócios. Conceitos de melhoria da rentabilidade, necessidades de redução de custos, as grandes aquisições, as fusões sucessivas, as novas opções de investimento e as deslocalizações respectivas.

E claro a aposta em nichos de mercado, porventura de até alguma compreensão dos Reguladores, nas chamadas doenças órfãs. Ou seja, perceber a diminuta dimensão do potencial mercado, antecipar a capacidade para impor preços e resolver os paradoxos na investigação clínica contra placebo ou a própria história natural da doença.

A pandemia surgida da China veio demonstrar que o Mundo, em matéria económica e política, e igualmente em termos clínicos, não se pode alhear nem ignorar as ameaças que se podem sempre imaginar, ainda que se não conheçam, e também não pode contar como boas ou certas as respostas que não asseguram, de facto, prevenção e cura em tempo útil!

Talvez por aqui se compreenda ainda o esforço generalizado da investigação e da indústria no sentido mais abrangente, da Academia e dos médicos em tentar encontrar em moléculas já experimentadas e comercializadas novas indicações terapêuticas, mesmo que em recurso ou situações muito restritas.

Que no limite, sejamos claros, e a serem favoráveis nos seus resultados, equivaleriam a um alargamento ou prolongamento dos prazos de patente.

E como as circunstâncias já deixaram de o ser, ninguém discutirá certamente os usos off-label ou as implicações ou limites éticos ou sequer o aproveitamento comercial lógico e consequente.

Para os mais inquietos ou bem esperançados não deixo de sugerir uma leitura que pode valer uma vida. Falo de uma das obras-primas clássicas europeias, assinada por uma mulher e escritora extraordinária, Marguerite Yourcenar.

O romance histórico intitula-se “A Obra ao Negro” e a personagem central, Zenão, era um filósofo, alquimista e médico. A descrição da peste por Basileia ou Colónia, no século XVI, é extraordinária e confirma que apesar de tudo não estamos ainda muito adiante…

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