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As muito descuradas e esquecidas Doenças Profissionais
Em Patologia e Clínica desde há muito que algumas doenças são tão frequentes em determinadas profissões que a sua designação inclui essa “ligação”, como são os exemplos da Asma dos Padeiros, do Eczema dos Pedreiros, do Pulmão do Sulfatador de Vinhas ou do Pulmão dos Criadores de Aves. Apesar dessa tão forte ligação, talvez pela sua incidência e prevalência serem pouco expressivas relativamente às patologias de uma sociedade cada vez mais envelhecida, a atenção que obtêm de todos não é muita, se é que é alguma.
Tal poderia ocorrer essencialmente na população geral, mas até os médicos, para além da evocação da necessidade de conhecer a profissão na colheita de qualquer história clínica em Semiologia ou em Propedêutica não lhe atribuem muitas vezes suficiente importância. De facto, a Patologia e a Clínica do Trabalho não são profusamente abordadas na formação inicial em Medicina. Isso, de resto, também acontece em Toxicologia, e de uma maneira ainda mais marcada e, atrevo-me a dizer, muitas vezes de forma muito desatenta, em Toxicologia Ocupacional ou Toxicologia do Trabalho.
No nosso caso concreto, porquê então o interesse por essas doenças? No decurso do Serviço Médico à Periferia (esse sim o pai do Serviço Nacional de Saúde que talvez tenha mãe desconhecida) deparámo-nos com alguns casos de “infecções respiratórias recorrentes” em diversos doentes que trabalhavam numa fábrica de transformação de cortiça em S. Brás de Alportel e que se vieram a revelar casos de suberose. Tal esforço de investigação (não só clínica) determinou o interesse pela Patologia do Trabalho, pela Medicina do Trabalho e pela Saúde Ocupacional que não só se mantém, como actualmente até se intensifica.
A Suberose é, de facto, uma alveolite alérgica extrínseca provocada pela exposição a poeiras de cortiça, descrita clinicamente por Vinte-e-Um Mendes e por Lopo Cancella de Abreu em meados do século passado, ambos médicos portugueses, que ligaram diversa sintomatologia respiratória à exposição a poeiras de cortiça, denominando-a, como se referiu, Suberose.
Estudos subsequentes, designadamente de Ramiro Ávila1, e de alguns outros como são os casos de Thomé Vilar, de Telles de Araújo e, por exemplo, de Cortez Pimentel (todos já falecidos, alguns dos quais recentemente) foram decisivos para o conhecimento da história natural dessa doença2. Esses autores deveriam ser mais recordados pela sua excelência de médicos e investigadores, “geminação” hoje, felizmente, cada vez mais frequente ou, quanto mais não seja, por terem “descoberto” a nível mundial (e descrito) esse quadro nosológico3.
As doenças profissionais, cujo exemplo da Suberose distingue a Medicina Portuguesa essencialmente nas especialidades de Pneumologia, e de Medicina do Trabalho, não têm uma importante frequência, mas são doenças quase sempre incapacitantes e até, por vezes, auto-evolutivas mesmo após o afastamento do agente etiológico, como sucede, por exemplo na Silicose.
A pergunta que se pode colocar é se perder a saúde (ou a vida) a “ganhar a vida” fará algum sentido? A prevenção das doenças profissionais é, por isso, indispensável e, de facto, “só se previne o que se conhece”. A COVID-19 como doença profissional em profissionais de saúde, agora tão propagada, espera-se que seja um bom incentivo para aumentar o nosso conhecimento sobre doenças profissionais que não se esgota na Patologia e na Clínica.
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