Estudo conclui que glicose pode beneficiar tratamento do cancro com células imunitárias

18 de Janeiro 2021

O tratamento do cancro com certas células do sistema imunitário pode ser beneficiado pela glicose (açúcar simples) e prejudicado pelo colesterol (tipo de gordura), conclui um estudo hoje divulgado que foi feito em Portugal com ratinhos.

O estudo, desenvolvido pelo Instituto de Medicina Molecular (IMM) João Lobo Antunes, em Lisboa, e hoje publicado na revista da especialidade Nature Immunology, revela que a glicose adicionada a linfócitos T gama-delta (células imunitárias) que são preparados em laboratório para serem usados como terapia celular para o cancro faz com que tenham “uma capacidade anti-tumoral bastante aumentada, inibindo o crescimento tumoral”.

A explicação foi dada à Lusa pelo líder da equipa do IMM, o imunologista e vice-diretor do instituto, Bruno Silva-Santos, que clarificou que se trata da glicose fornecida às células manipuladas em laboratório para combater o cancro.

“Não se trata de uma ‘dieta’ rica em açúcar! Esse tipo de alimentação ajudaria também o tumor a crescer, pelo que não é recomendável”, frisou.

O estudo concluiu, por outro lado, que “altas concentrações de colesterol favorecem funções imunitárias pró-tumorais, a produção de moléculas que ajudam o tumor a crescer”.

“No caso do colesterol, o estudo mostra que ele é prejudicial tanto no cultivo dos linfócitos T gama-delta, como após injeção no organismo”, assinalou Bruno Silva-Santos.

A imunoterapia celular caracteriza-se pela transferência para o organismo de células imunitárias, no caso linfócitos T gama-delta, um subtipo de linfócitos T, para tratar o cancro, o que “requer a sua ativação e expansão durante o cultivo em laboratório”.

Para o trabalho hoje publicado foram cultivados em laboratório, a partir de ratinhos, linfócitos T gama-delta, considerados promissores no tratamento do cancro, com várias “receitas mais ou menos ricas em glicose ou colesterol”.

A equipa científica estudou o metabolismo destes linfócitos e o “seu impacto na multiplicação e produção de moléculas essenciais para a resposta a tumores”, tendo depois injetado as células em ratinhos com cancro da mama e cancro colorretal e seguido “o impacto sobre o crescimento do tumor”.

Para o imunologista Bruno Silva-Santos, que tem estudado o papel destas células na imunoterapia do cancro, as conclusões revelam-se importantes, na medida que indiciam como será possível otimizar as funções anti-tumorais dos linfócitos T gama-delta para que, uma vez injetados no organismo, “consigam fazer o seu trabalho”, isto é, “persistir no corpo, reagir contra o tumor e matar as células malignas poupando as células saudáveis”.

O estudo concluiu, ainda, que é no timo, órgão por cima do coração onde são gerados os linfócitos T, incluindo os gama-delta, que estes últimos são como que “instruídos” com “a correspondência entre glicose e funções anti-tumorais e entre colesterol e funções pró-tumorais”.

O próximo passo da investigação é “como tirar partido deste conhecimento em seres humanos”, disse Bruno Silva-Santos, acrescentando que a equipa irá “analisar o impacto da regulação metabólica” na produção de linfócitos T gama-delta humanos para fins terapêuticos.

Ensaios clínicos com estas células, para uso como tratamento para o cancro, deverão iniciar-se ainda este ano, adiantou, sublinhando que “será importante seguir os níveis do ‘mau colesterol’ nos doentes tratados para inferir o possível impacto que altos níveis de colesterol possam ter na eficácia do tratamento”.

O estudo hoje publicado teve a colaboração de investigadores da Harvard Medical School, nos Estados Unidos, e da Queen Mary University of London, no Reino Unido.

LUSA/HN

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