Carlos Jalali, professor de Ciência Política da Universidade de Aveiro, e Pedro Magalhães, sociólogo e investigador principal do Instituto de Ciências Sociais (ICS – Universidade de Lisboa), concordam que o efeito Covid-19 é imprevisível e muito difícil de medir e antecipar, utilizando argumentos e dados complementares.
“A grande incerteza será o efeito da pandemia sobre o voto”, admitiu, à Lusa, Carlos Jalali, que estudou várias tendências, “modelos” nos últimos anos e descreve o que é o efeito “iô-iô”: quando há eleições em que os presidentes se recandidatam, a abstenção sobe e desce nas seguintes, cinco anos depois, quando há maior disputa.
As presidenciais em que Mário Soares foi reeleito em 1991 “tiveram a abstenção mais alta até essa altura”, mas esse recorde foi depois “ultrapassado em 2001”, na reeleição de Jorge Sampaio, e “ultrapassado novamente em 2011, na eleição que reconduziu Cavaco Silva” em Belém, descreveu.
Além disso, desde 1991 que, em eleições em que o Presidente se recandidata, que “o número de votantes diminui em média cerca de um milhão relativamente à eleição anterior”, acrescentou.
“Se nesta eleição se reproduzisse essa média, a abstenção oficial seria ligeiramente acima dos 65%”, afirmou ainda o professor da Universidade de Aveiro, que tem estudado comportamento eleitoral dos portugueses.
Mais um fator a ter em conta é o efeito do recenseamento automático dos portugueses do estrangeiro, desde 2018, que pode fazer aumentar a abstenção em 5,1 pontos percentuais, para os 56,4% relativamente a 2016, partindo do pressuposto que os eleitores, em Portugal e “lá fora”, mantinham o mesmo comportamento.
Outra forma de compreender o comportamento do eleitorado é “modelizar” com base no “número de votantes mínimo” em eleições em Portugal.
“Se o número de votantes for igual ao das eleições menos participadas dos últimos 10 anos (contando aqui todas as eleições nacionais, presidenciais, legislativas, europeias e autárquicas), em que votaram ligeiramente menos de 3,3 milhões de votantes, a abstenção oficial nestas presidenciais seria de 70%”, disse ainda Carlos Jalali em respostas, por escrito, a questões feitas pela Lusa.
Jalali avisa, porém, que estes “valores não são previsões de abstenção”, mas sim “modelizações com base em padrões anteriores”, deixando mais uma advertência.
“O passado não determina o futuro. Caso fossemos eternos prisioneiros do passado, Portugal não seria agora uma democracia e não estaríamos agora a falar de sobre eleições presidenciais por sufrágio universal, em eleições livres e justas”, justificou.
Pedro Magalhães, sociólogo e investigador do ICS, com investigações na área da abstenção, tem uma opinião e explicações idênticas e admite ser “muito provável” que o valor dos eleitores a ficar em casa atinja um recorde, e apresenta quatro razões.
Em Portugal, argumentou, há “cada vez menos pessoas” a participar em eleições e é preciso recuar até às presidenciais de 2006 para se encontrar uma eleição com mais de cinco milhões de portugueses.
O segundo é o recenseamento automático dos eleitores no estrangeiro, uma “medida positiva”, por dar “uma estimativa mais realista de quem vota entre o real universo” de eleitores, mas que “revela mais abstenção”.
“O terceiro fator é o facto de eleitores e políticos darem menos importância a eleições onde o Presidente é candidato e claro favorito. São eleições menos mobilizadoras e onde os próprios partidos e candidatos fazem menos esforços para mobilizar os eleitores”, disse Pedro Magalhães, em respostas por escrito a perguntas da Lusa.
O “quarto e último fator” é a pandemia em que vivem Portugal e o mundo, e “os receios e obstáculos que isso coloca à participação”, concluiu.
Carlos Jalali afirma que “o efeito da pandemia quase certamente irá sobrepor-se” aos outros fatores, e que “é difícil antever” o seu efeito sobre o voto nas presidenciais.
No início de janeiro, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) lançou uma campanha intitulada “Votar é seguro”, tão seguro como “uma ida às compras ou ao café”, esperando que a pandemia de cCvid-19 não seja “mais uma desculpa” para não votar.
As eleições presidenciais, que se realizam em plena epidemia de Covid-19 em Portugal, estão marcadas para 24 de janeiro e esta é a 10.ª vez que os portugueses são chamados a escolher o Presidente da República em democracia, desde 1976.
A campanha eleitoral termina em 22 de janeiro. Concorrem às eleições sete candidatos, Marisa Matias (apoiada pelo Bloco de Esquerda), Marcelo Rebelo de Sousa (PSD e CDS/PP) Tiago Mayan Gonçalves (Iniciativa Liberal), André Ventura (Chega), Vitorino Silva, mais conhecido por Tino de Rans, João Ferreira (PCP e PEV) e a militante do PS Ana Gomes (PAN e Livre).
LUSA/HN
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