Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina: CIG na linha da frente do combate em Portugal

8 de Fevereiro 2021

No Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina, que se assinalou no sábado, dia 06, a presidente da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG), Sandra Ribeiro, disse ao HealthNews que “muito tem sido feito” em Portugal para combater esta prática, que já afetou cerca de 200 milhões de meninas e mulheres em todo o mundo.

Estima-se que a mutilação genital feminina (MGF) coloque em risco três milhões de meninas e jovens todos os anos. Na Europa, encontram-se pelo menos 600 mil mulheres excisadas e estima-se que 6500 delas vivam em Portugal, sendo estas últimas maioritariamente provenientes da Guiné-Bissau.

Em 2020, os profissionais de saúde detetaram 101 casos de mutilação genital feminina em Portugal – menos do que em 2019, ano em que se registaram 129, segundo dados do gabinete da secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, solicitados pela Lusa, fez saber a agência de notícias.

A presidente da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género escreveu ao HealthNews que o que “mudou nos últimos 3 anos é que os médicos estão mais sensibilizados para o assunto e identificam o caso no registo nacional de saúde”, explicando que a “maior parte das situações detetadas pelos serviços de saúde ocorre aquando das consultas pré-natais, em mulheres adultas, sobreviventes de MGF, que já aconteceram há vários anos”.

“Claro que o grande desafio é conseguir evitar que meninas de comunidades de risco venham a ser mutiladas, o que é hoje cada vez mais possível porque há várias associações da sociedade civil que contam com o apoio da CIG” e “sensibilizam através de ações de proximidade”, sendo que “cada vez são mais as vozes dentro dessas comunidades contra a MGF e que se tornam ativistas na sua prevenção”;  “por outro lado, porque também estão no terreno profissionais formados para identificarem sinais de risco e estão definidos os fluxogramas de alerta e acompanhamento e atuação”, indicou Sandra Ribeiro, concluindo que “muito tem sido feito”.

Juntamente com a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e o Alto Comissariado para as Migrações, a CIG coordena as iniciativas do projeto “Práticas Saudáveis – Fim à Mutilação Genital Feminina”, uma iniciativa da secretária de Estado Rosa Monteiro, que foi criada em 2018. Sandra Ribeiro sublinhou que este projeto “tem sido fundamental para a sensibilização, informação, esclarecimento e capacitação, quer das mulheres e homens dessas comunidades, quer dos profissionais de saúde, ação social e educação”. E continuou: “Para além disso, com o apoio da Secretária de Estado para Cidadania e a Igualdade, a CIG, reconhecendo o importante trabalho desenvolvido pelas associações da sociedade civil no terreno, tem uma linha de financiamento destinada a apoiar medidas, projetos e ações que ajudem a prevenir práticas nefastas”.

O Governo lançou uma linha financeira de 50 mil euros para apoiar as organizações da sociedade civil portuguesa com projetos de prevenção e combate à mutilação genital feminina no passado dia 3. As candidaturas podem ser apresentadas a partir de dia 8 (próxima segunda-feira) e até 08 de março.

Este ano fica também marcado pela primeira condenação em Portugal pelo crime de mutilação genital feminina. O Tribunal de Sintra condenou, a 08 de janeiro, a mãe da criança excisada, de origem guineense e que também havia passado pelo mesmo na infância, a três anos de prisão efetiva.

A presidente da Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género entende que, em 2015, se deu um “passo muito importante” ao tornar a mutilação genital feminina crime em Portugal, mas a criminalização “não é determinante para prevenir e combater a MGF”. Segundo Sandra Ribeiro, a “melhor forma de prevenir este fenómeno de forma sustentável é a adoção de estratégias de trabalho em rede entre as instituições públicas e as associações da sociedade civil, que permitem uma atuação de proximidade e que privilegiam a informação, o esclarecimento e a capacitação de profissionais em áreas de intervenção fundamentais como a saúde, ação social, educação, direito”.

Sandra Ribeiro esclareceu ainda o HealthNews quanto ao modo de atuação em casos concretos: “Há um fluxograma pré-definido de ação que tem variantes de acordo com a situação em concreto. A primeira abordagem é feita com a família e com a criança, tendo em conta as referências culturais e a natureza sensível do tema, explicando-se as possíveis consequências para a saúde física e psicológica da menina ou rapariga, bem como qual a lei em vigor no país, as consequências legais/judiciais, esclarecendo-se sempre que o que se pretende é ajudar a família e evitar a MGF. Se for identificada uma situação de risco de MGF, em que a situação analisada não indicia a presença de um perigo iminente, é chamada a intervir a CPCJ, que delibera a instauração de um processo de promoção e proteção e procura obter o consentimento dos pais e mães e a não oposição da criança, se maior de doze anos, para a aplicação das medidas necessárias. Nos casos em que existe a suspeita consistente de que uma menina foi submetida à MGF, a situação é de imediato comunicada ao Ministério Público ou às entidades policiais, conforme o artigo 70.º da Lei de Proteção” e há uma preocupação em “providenciar os apoios médicos e psicológicos de que a vítima possa necessitar”.

A pandemia dificultou o desenvolvimento das atividades, mas não parou a CIG: “Houve adaptação” e “a articulação e o trabalho em rede mantêm-se”, nomeadamente “com recurso aos instrumentos de tecnologia digital”, uma vez que todos os dias há meninas e mulheres para defender.

“Estamos a lutar para trazer para a luz do dia o fenómeno, sem estigmatizar ou hostilizar, mas antes empoderando meninas e mulheres, por via da capacitação”, afirmou Sandra Ribeiro.

HN/Entrevista de RA

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