HealthNews (HN)- Foi desenvolvido um novo parâmetro de avaliação de controlo glicémico. Como funciona o Time in Range (TiR)?
José Silva Nunes (JSN)- O Time in Range, conhecido em português como o Tempo no Alvo, consiste numa métrica em que, através de sistemas de monitorização do controlo glicémico mantido ao longo das 24 horas, permite verificar qual é a percentagem de tempo que o doente permanece com a glicemia dentro daqueles que são o limite superior e inferior recomendado.
Já existem recomendações no sentido de qual deve ser a percentagem de tempo dentro desse ‘alvo’ que, para a generalidade das pessoas com diabetes, se situa entre os 70 mg/ dl (como limite inferior) e os 180 mg/dl (como limite superior). O que é suposto é que a generalidade das pessoas esteja dentro destes valores pelo menos 70% do tempo, ao longo do dia.
As recomendações definem ainda qual é o máximo de tempo que deve estar abaixo do limite inferior e qual a percentagem de valores que não deve ser ultrapassado em termos de limite superior. Portanto, as medições destas pessoas não devem estar abaixo dos 70 mg/ dl mais do que 4% do tempo, assim como não devem estar acima dos 180 mg/dl mais do que 25% do tempo.
HN- A que tipo de doentes se destina. É para todos os doentes com diabetes ou apenas para aqueles com dispositivo de controlo contínuo da glucose?
JSN- O problema tem a ver exatamente com esta questão. A hemoglobina glicada (HbA1C) pode ser aplicada a qualquer doente, em qualquer altura do dia e consegue avaliar a média de controlo dos últimos três ou quatro meses. No caso do sistema de monotorização continua ou ‘flash’ da glicose está, neste momento, unicamente indicado para pessoas que têm diabetes tipo 1 (que, obrigatoriamente, fazem insulina) ou pessoas com diabetes tipo 2 (que fazem múltiplas administrações de insulina). Portanto, atualmente o Time in Range não pode ser utilizado na generalidade da população diabética.
HN- Quais as principais diferenças entre o TiR e o HbA1c?
JSN- A HbA1C é um conceito de média, pode-se ter os valores sempre dentro do normal e ter uma média normal, como também pode ter uma média normal resultado de valores altos e valores baixos. Esse é o ‘calcanhar de Aquiles’ da hemoglobina glicada – não dá informação sobre a variabilidade do controlo glicémico ao longo do tempo, dá apenas um valor médio e essa média pode ser o resultado de amplitudes mínimas ou muito amplas.
Enquanto a hemoglobina glicada é um conceito de média, o TiR é um conceito prático que avalia a amplitude de variação das glicemias ao longo do tempo. Contudo, tal como acontece com a HbA1c, também o TiR deve ser individualizado para o tipo de diabetes e para cada indivíduo. Por exemplo, com uma mulher grávida com diabetes tipo 1, o grau de controlo deve ser mais exigente. Neste caso, os valores devem estar entre os 63 mg por dl e os 140 mg por dl e deve estar pelo menos 70% dentro desse alvo.
HN- Significa que o TiR fornece informação mais ampla?
JSN- Sim, as principais vantagens são que temos uma avaliação global e geral do controlo glicémico. Com TiR sabemos qual será a média, o tempo dentro daquele ‘alvo’ que definimos e a percentagem de tempo acima ou abaixo desses valores que são estabelecidos para aquele doente em concreto. Portanto, o TiR é uma ótima métrica e dá muita mais informação do que a HbA1c, mas o problema é que está restrita ainda a um pequeno grupo de doentes com diabetes.
HN- Qual o seu impacto em termos de prevenção de comorbilidade da diabetes?
JSN- Para o desenvolvimento das complicações tardias da diabetes temos de ter em conta não só o controlo glicémico em termos médios, mas também as amplitudes de variação. Grandes amplitudes de variação da glicemia incorrem num aumento de vários fenómenos nocivos, nomeadamente, aumento do stresse oxidativo (que vai acelerar os mecanismos subjacentes ao desenvolvimento das complicações tardias da doença) e não só. Portanto, se tivermos um retrato mais apurado de como é o grau de controlo glicémico em termos gerais conseguimos ter informação concreta que nos ajude a evitar o desenvolvimento das complicações agudas e tardias da doença.
Entrevista por Vaishaly Camões
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