FMI diz que “Choque” económico em Cabo Verde será “mais forte do que o previsto”

3 de Abril 2021

O Fundo Monetário Internacional (FMI) admite que o “choque” económico da covid-19 em Cabo Verde “foi mais forte do que o previsto”, mas que as medidas de apoio tomadas pelas autoridades cabo-verdianas ajudaram a “conter o impacto”.

No relatório final sobre a terceira e última revisão do programa de assistência técnica PCI (Instrumento de Coordenação de Políticas, na sigla em inglês), agora concluído, o FMI alerta para as “incertezas” sobre a duração da pandemia, que continuam a pesar sobre a economia do arquipélago, dependente da retoma do turismo, que ameaça a recuperação económica esperada em 2021.

“O choque da covid-19 foi mais forte do que o previsto e as perspetivas económicas estão sujeitas a incertezas e riscos de revisão em baixa. Embora as medidas de apoio tomadas pelas autoridades tenham ajudado a conter o impacto do choque, a contração em 2020 foi significativa”, lê-se no relatório do FMI, consultado hoje pela Lusa.

O FMI estimava uma recessão económica equivalente a 6,8% do Produto Interno Bruto (PIB) de Cabo Verde em 2020, previsão revista agora para 14% – o Instituto Nacional de Estatística aponta para 14,8% -, em larga medida pelo impacto da ausência de turismo desde março, devido às restrições internacionais provocadas pela pandemia de covid-19, num setor que garante 25% do PIB do arquipélago.

No documento, a equipa do FMI “insta as autoridades a prepararem medidas de mitigação” contra os “riscos” de queda na retoma esperada para 2021 – o Fundo admite um crescimento económico de 5,8% este ano – e que, “após a crise”, as autoridades “devem manter a implementação de políticas para apoiar a estabilidade macroeconómica e acelerar as reformas estruturais que estimulam o crescimento” para “reconstruir os ganhos perdidos e retornar às trajetórias de médio prazo pré-pandemia”.

Alerta igualmente para a execução do Orçamento do Estado para este ano, que “precisará de ser monitorizada cuidadosamente”, tendo em conta que as perspetivas económicas são “incertas”, apontando que o Governo atual – Cabo Verde realiza eleições legislativas em 18 de abril – assumiu o compromisso de congelar 1% do PIB em despesas orçamentadas para este ano, como publicidade e viagens, em função da avaliação da arrecadação das receitas fiscais esperadas.

Para o FMI, as medidas de mitigação às consequências da covid-19 – que envolvem linhas de crédito, moratórias a créditos bancários e de pagamentos de impostos, ‘lay-off’ simplificado ou subsídios às famílias – “devem continuar a ser monitorizadas de perto e eliminadas quando as condições permitirem”.

No relatório é reconhecido que o plano de mitigação às consequências da pandemia, lançado em março de 2020 pelo Governo cabo-verdiano, “ajudou empresas, famílias e grupos vulneráveis a lidar com o impacto da pandemia”, além de “melhorar os requisitos” de segurança sanitária na hotelaria.

Para o FMI, o plano “teve um impacto importante”, desde logo com as linhas de crédito com garantias do Estado estabelecidas a apoiaram mais de 500 empresas, “ajudando a proteger cerca de 12.300 empregos”, através de 3.900 milhões de escudos (35,2 milhões de euros) em empréstimos, incluindo para micro, pequenas e médias empresas.

Também a suspensão dos contratos de trabalho, que custou ao Estado 1.400 milhões de escudos (12,6 milhões de euros), “ajudou a salvaguardar empregos para cerca de 32.000 trabalhadores evitando despedimentos”.

“Medidas destinadas a proteger a renda familiar ajudaram a garantir a subsistência de famílias extremamente pobres e trabalhadores do setor informal durante a paragem [limitações impostas à atividade no estado de emergência]. As autoridades também tomaram medidas para preparar o retorno do turismo, incluindo a formação de pessoal do setor hoteleiro nas áreas de segurança, a exigência de obtenção de selo de segurança para hotéis e restaurantes e a abertura de dois centros de saúde nas duas ilhas turísticas, do Sal e Boa Vista”, reconhece o FMI.

O programa de assistência técnica PCI (Instrumento de Coordenação de Políticas, na sigla em inglês), iniciado em 15 de julho de 2019, e que visa apoiar as reformas em curso no Estado, nomeadamente ao nível do sistema fiscal e das privatizações, foi concluído com uma aplicação “satisfatória”, apesar dos efeitos da pandemia de covid-19.

“As autoridades mantiveram um forte desempenho no âmbito do programa, apesar das circunstâncias difíceis”, salienta a avaliação do FMI, concluindo que todas as principais metas do programa foram cumpridas.

Acrescenta que a execução deste programa “apoiou os objetivos de médio prazo das autoridades para sustentabilidade fiscal e da dívida”, bem como “reformas mais amplas de promoção do crescimento”.

O PCI é um programa de assistência técnica disponível para todos os membros do FMI que não necessitem de recursos financeiros no momento da aprovação, sendo projetado para países que procuram “demonstrar compromisso com uma agenda de reforma ou para desbloquear e coordenar o financiamento de outros credores oficiais ou privados”, explica a organização.

NR/HN/LUSA

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

Promessas por cumprir: continua a falta serviços de reumatologia no SNS

“É urgente que sejam cumpridas as promessas já feitas de criar Serviços de Reumatologia em todos os hospitais do Serviço Nacional de Saúde” e “concretizar a implementação da Rede de Reumatologia no seu todo”. O alerta foi dado pela presidente da Associação Nacional de Artrite Reumatoide (A.N.D.A.R.) Arsisete Saraiva, na sessão de abertura das XXV Jornadas Científicas da ANDAR que decorreram recentemente em Lisboa.

Consignação do IRS a favor da LPCC tem impacto significativo na luta contra o cancro

A Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC) está a reforçar o apelo à consignação de 1% do IRS, através da campanha “A brincar, a brincar, pode ajudar a sério”, protagonizada pelo humorista e embaixador da instituição, Ricardo Araújo Pereira. Em 2024, o valor total consignado pelos contribuintes teve um impacto significativo no apoio prestado a doentes oncológicos e na luta contra o cancro em diversas áreas, representando cerca de 20% do orçamento da LPCC.

IQVIA e EMA unem forças para combater escassez de medicamentos na Europa

A IQVIA, um dos principais fornecedores globais de serviços de investigação clínica e inteligência em saúde, anunciou a assinatura de um contrato com a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) para fornecer acesso às suas bases de dados proprietárias de consumo de medicamentos. 

SMZS assina acordo com SCML que prevê aumentos de 7,5%

O Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS) assinou um acordo de empresa com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) que aplica um aumento salarial de 7,5% para os médicos e aprofunda a equiparação com a carreira médica no SNS.

“O que está a destruir as equipas não aparece nos relatórios (mas devia)”

André Marques
Estudante do 2º ano do Curso de Especialização em Administração Hospitalar da ENSP NOVA; Vogal do Empreendedorismo e Parcerias da Associação de Estudantes da ENSP NOVA (AEENSP-NOVA); Mestre em Enfermagem Médico-cirúrgica; Enfermeiro especialista em Enfermagem Perioperatória na ULSEDV.

DGS Define Procedimentos para Nomeação de Autoridades de Saúde

A Direção-Geral da Saúde (DGS) emitiu uma orientação que estabelece procedimentos uniformes e centralizados para a nomeação de autoridades de saúde. Esta orientação é aplicável às Unidades Locais de Saúde (ULS) e aos Delegados de Saúde Regionais (DSR) e visa organizar de forma eficiente o processo de designação das autoridades de saúde, conforme estipulado no Decreto-Lei n.º 82/2009.

MAIS LIDAS

Share This
Verified by MonsterInsights