Entrevista António Diniz: “Vai haver sempre pessoas que mesmo vacinadas vão contrair a doença”

05/15/2021
A realidade é mesmo esta. Sem ilusões o pneumologista alerta que existe o risco de haver estirpes resistentes às vacinas. Critica o "estado de euforia" com que foi recebida a chegada das primeiras doses e diz que "aquilo que estamos a fazer é semear para o futuro". António Diniz avisa que ainda há muitas dúvidas sobre a duração da imunidade. 

A corrida pela imunidade de grupo já arrancou em vários países do mundo. A este ritmo de implementação do plano de vacinação é esperado alcançar-se a tão desejada imunidade de grupo?

É esperado alcançar-se essa desejada imunidade de grupo. A questão que se coloca é quando. O objetivo da vacinação é, para além de prevenir a mortalidade, a morbilidade, a incidência da infeção, que se alcance a imunidade de grupo. Portanto, mesmo que o vírus ainda esteja em circulação, a vacinação permite assegurar a sua não transmissibilidade à população ainda não imunizada.

E quanto tempo vai demorar até atingirmos a imunidade de grupo?

O que dizem é que no mínimo é preciso que 60 a 70% da população esteja imunizada. Parte dela estará, eventualmente, protegida por ter contactado com o vírus e a outra parte através da vacina.

O problema é que ainda não sabemos um conjunto de coisas em relação à vacina nem sobre a duração da imunidade. Ao desconhecermos isto ficamos sem saber se será necessário que as pessoas sejam revacinadas seis meses ou um ano e meio depois ou se não necessitarão de revacinação, mas isso é algo que nesta altura é impossível sabermos. Só com o tempo é que nos iremos apercebendo e os estudos diferidos no tempo poderão dar-nos alguma resposta em relação a isso.

Falando sobre estudos, considera que os ensaios clínicos efetuados incluíram uma amostra suficientemente segura para garantir resultados?

Acho que sim. Não é só uma vacina e não são apenas um ou dois estudos que estão em curso. São várias vacinas e cada uma delas, pelo menos, com vários estudos que sustentam a sua aplicação. Portanto, as pessoas podem ter confiança na vacina que lhes for proposta.  

A confiança na disponibilidade de uma vacina poderá influenciar negativamente a curva epidémica?

Essa é uma questão interessante… acho que um dos fatores que terá contribuído para a situação em que estamos hoje foi o estado de euforia que se viveu na última semana do ano. Foi uma euforia geral no qual a comunicação social também alinhou. Aquilo tinha apenas um valor simbólico. Parece que se transmitiu às pessoas essa sensação de que: a maior parte dos problemas estavam resolvidos. Não estavam. Não estão nem vão estar. É apenas um início. Aquilo que estamos a fazer é semear para o futuro… ora, interessa-nos pouco estar a semear para o futuro se o fulano que está a pôr as sementes morrer no meio do caminho. Temos permitir que as sementes possam florescer.

Até agora foram aprovadas apenas duas vacinas na União Europeia. Com a entrada de novas vacinas, com diferentes níveis de eficácia, como deve ser feita a gestão?

O que é preciso é que elas tenham um nível de eficácia superior a 70%. Vai haver sempre pessoas que mesmo vacinadas vão contrair a doença.

Agora, há uma coisa que eu sei… vamos admitir que a vacina tem um nível de eficácia de 70%, em cada dez pessoas que vacino, sete ficarem protegidas eu dou muito bem empregue o meu esforço. Se forem oito ou nove ainda melhor. Se fossem dez era ótimo, era o pleno, mas isso não vai ser possível. É mesmo de aproveitar todas as oportunidades, mesmo que o seu nível de eficácia possa variar, umas mais acima e outras mais abaixo, mas sempre acima de um patamar aceitável.

Há uma questão que suscita muitas dúvidas na comunidade e está relacionada com o surgimento de novas estirpes, existe o risco de haver variantes resistente às vacinas atualmente disponíveis?

Teoricamente existe sempre essa possibilidade. Não é aquilo que se está a passar nesta altura. Mesmo com as novas variantes que apareceram tudo indica que essas novas estirpes serão sensíveis à vacina, mas isso é algo que se passa sempre com vacinas quando envolve um vírus. Existe sempre a possibilidade do vírus sofrer uma mutação de tal forma importante que a vacina que está a ser administrada não confere imunidade. Foi o que se passou em 2009 com o aparecimento de uma nova estirpe do vírus da gripe. As diferenças eram tão significativas que a vacina não conseguia ter eficácia em relação a essa mesma estirpe. Portanto, do ponto de vista teórico será sempre possível, mas d0 ponto de vista prático não é isso que está a acontecer.

No caso de nos vermos confrontados com uma estirpe resistente às vacinas que medidas devem ser implementadas?

Para já estamos muito melhor armados do ponto de vista científico e técnico, basta olharmos para a rapidez com que foi desenvolvida esta nova vacina, inclusive com recursos a metodologias que ainda não estavam a ser aplicadas. Isto quer dizer que estaremos muito mais preparados nesse aspeto para preparar uma nova vacina no mais curto espaço de tempo.

Por outro lado, a alternativa que temos até surgir essa vacina é a alternativa que tivemos agora durante este tempo, ou seja, são as medidas de prevenção clássicas que continuamos a praticar.

Entrevista por Vaishaly Camões

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