Ao identificar as fragilidades e necessidades sentidas no concelho a Câmara Municipal de Cascais deu asas a um novo projeto. O Vida Cascais permite, a mais de 200 mil cidadãos, o acesso a consultas de telemedicina de Medicina Geral e Familiar e Pediatria de forma gratuita e ilimitada. Em entrevista ao HealthNews, o Vice-Presidente da autarquia, Miguel Pinto Luz, destaca que a iniciativa irá aliviar “tanto as urgências do hospital, como as urgências dos centros de saúde”. “Queremos continuar a servir como retaguarda ao SNS”, garante.
HealthNews (HN)- A Câmara Municipal de Cascais anunciou recentemente o lançamento de uma iniciativa que prevê complementar o SNS e retirar a pressão dos centros de saúde do concelho através de consultas de telemedicina de Medicina Geral e Familiar e pediatria, de forma gratuita para todos os residentes. Os médicos que integram este projeto são médicos que trabalham nos centros de saúde do concelho ou são médicos contratados pela Câmara?
Miguel Pinto Luz (MPL)- Consultamos várias empresas prestadoras deste tipo de serviços, avançamos com a realização de um concurso e a empresa que ganhou é responsável por garantir os profissionais de saúde. São médicos que podem ser de diferentes partes do país. São teleconsultas, o que significa que podem estar em qualquer região a prestar este serviço.
HN- São médicos com especialidade em Medicina Geral e Familiar. Correto?
MPL- Claro. São médicos especialistas nesta área e em pediatria.
Quando um munícipe entra em contacto com a linha de telemedicina é feita uma triagem. O doente fala com um enfermeiro e esse enfermeiro percebe se é uma consulta de Medicina Geral e Familiar ou se é uma consulta de pediatria e analisa o grau da urgência.
No prazo de 30 minutos é disponibilizado um link que encaminha o doente à consulta de telemedicina.
HN- O doente é visto sempre pelo mesmo médico?
MPL- Pode ser visto ou não. O doente pode solicitar isso e, se houver disponibilidade por parte do médico, pode ser acompanhado. Caso não haja disponibilidade, o doente é visto por outro médico.
HN- Nesse caso como conseguem garantir o acompanhamento holístico e global da família?
MPL- Esse não é o objetivo. São coisas distintas… Em Cascais há cerca de 23 mil cidadãos que não têm médico de família e, para esse problema, temos um acordo celebrado com a ARS de Lisboa do projeto Bata Branca, onde vamos conseguir, ainda este ano, garantir a toda a população de Cascais o acesso a um médico. Esse é um outro projeto com a ARS e os centros de saúde. O projeto Vida Cascais prevê garantir que todos os cidadãos do município, durante 24h por dia, têm acesso a um médico num espaço de meia hora.
Imaginamos que as duas da manhã tenho um filho que está com febre e não sei o que fazer. No passado tinha duas hipóteses: ia para as urgências do hospital ou ligava para a linha de saúde 24 e falava com um enfermeiro. Agora, tenho a possibilidade de, às duas da manhã, ligar para este serviço e receber o acompanhamento de um médico através do meu telemóvel.
HN- Por tanto não vai ser um médico de família a realizar o acompanhamento do doente?
MPL- Não. São médicos de Medicina Geral e Familiar.
HN- Este projeto é uma resposta encontrada pela Câmara Municipal de Cascais para aliviar a pressão dos centros de saúde do concelho?
MPL- Sim. Hoje os centros de saúde têm uma pressão muito grande para questões que fazem quase urgência quando não deviam. Neste sentido, o projeto visa aliviar, tanto as urgências do hospital, como as urgências dos centros de saúde.
HN- O Vida Cascais inclui ainda consultas de pediatria. Foram contratados pediatras para este projeto?
MPL- Claro, só assim faria sentido.
HN- Como é feito esse processo? O doente quando liga para esta linha passa primeiro pelo médico e depois é reencaminhado para a pediatria ou não há necessidade de ser visto pelo medico previamente?
MPL- O munícipe liga para o número único e pede uma consulta para o filho. Passa por um enfermeiro que faz a triagem e, no prazo máximo de meia hora, é disponibilizado uma consulta com um médico de pediatria.
HN- E caso haja necessidade de observação presencial, como é garantida essa observação?
MPL- Quando o médico percebe que não consegue resolver a questão em teleconsulta são dadas duas hipóteses: se o doente quiser que o médico se desloque ao domicílio existe um custo associado que não é comparticipado pela Câmara ou é reencaminhado para as urgências do hospital.
HN- Como funciona a prescrição de medicamentos?
MPL- É feita de forma eletrónica. O médico pergunta ao doente se quer que os medicamentos sejam entregues no domicílio, não havendo qualquer custo.
HN- Existe algum tipo de articulação com os centros de saúde?
MPL- Não, são serviços independentes.
HN- Quem assume o custo dos meios complementares de diagnóstico prescritos pelo médico? É inserido na rede do SNS? É a Câmara ou é o próprio doente que paga?
MPL- Os custos são pagos pelo utente. A Câmara oferece consultas e a entrega de medicamentos em casa de forma gratuita para todos os cidadãos de Cascais, sem limite.
HN- No o Plano Local de Saúde 2015-2017 e na Estratégia Local de promoção de Saúde 2016-2020 os eixos prioritários identificados incluem: cuidados de saúde oral e de psiquiatria. Tendo em conta que, com a pandemia, tem havido um aumento da depressão e da ansiedade, o projeto Vida Cascais tem previsto algum tipo de apoio nesta área?
MPL- O que está no plano é aquilo que já tínhamos. Reforçamos agora. Tínhamos apoio psicológico a vários níveis, nomeadamente nas escolas, nas nossas unidades de ação social e nos nossos centros ligados à juventude. Conseguimos prestar apoio psicológico nas várias faixas etárias.
HN- E sobre a saúde oral?
MPL- Temos um problema já antigo e só conseguimos dar apoio às escolas.
HN- Para as restantes faixas etárias está a ser pensada alguma solução ou não é uma prioridade?
MPL- Não é uma prioridade. Não conseguimos ir a todas as faixas etárias. Já é único o que estamos a fazer de oferecer consultas gratuitas a todos os residentes. Para além do projeto Bata Branca que já mencionei… para as 23 mil famílias que não têm médicos de família fizemos quase um centro de saúde extra para garantir o acesso destas pessoas ao médico. Atacamos por duas vias: agregando valências para colmatar os 23 mil cidadãos que não têm médico de família e lançámos um grande plano, que é este das teleconsultas, para todos os cidadãos que passam a ter, à distância de um telefonema, acesso a um médico de Medicina Geral e Familiar ou de pediatria.
HN- O que distingue este projeto da linha de saúde 24?
MPL- É completamente diferente ligar para a linha de saúde 24 ou ligar para a nossa linha. Aqui os doentes têm um médico do outro lado, havendo um outro tipo de interação.
HN- Podemos assumir que o projeto é uma espécie de “seguro de saúde” gratuito?
MPL- Sim. É um serviço que garante, a quem vive em Cascais, uma rede de suporte e que alivia o SNS. Com este tipo de telefonemas deixa de ser necessário que as pessoas se desloquem às urgências do Hospital de Cascais, que muitas vezes estão caóticas.
HN- O projeto foi motivado por causa da pandemia. A Câmara tem previsto prolongar este serviço por mais tempo?
MPL- Sim, queremos continuar. O projeto surgiu porque detetámos, durante a pandemia, essas lacunas. Mas temos intenção de continuar no pós-pandemia. Queremos continuar a servir como retaguarda ao SNS.
HN- Apesar de ser um projeto muito recente consegue fazer algum balanço?
MPL- Começou há muito pouco tempo. Estamos com algumas dezenas de consultas por dia. As pessoas estão a aderir aos poucos. Para já estamos com números bastante apreciáveis para início do processo, mas o projeto é para continuar.
Entrevista de Vaishaly Camões
0 Comments