“Há dezenas de planos nacionais gerais e planos nacionais setoriais como os da obesidade, da hipertensão, da diabetes, mas nunca ninguém os avalia”, lamentou à agência Lusa Luís Cunha Miranda, que apresentou ontem no Congresso Português de Reumatologia um estudo que avaliou a taxa de execução em 2021 do Plano Nacional Contra as Doenças Reumáticas (PNCDR): 2004-2014.
Para o ex-presidente da Sociedade Portuguesa de Reumatologia (SPR), é “inexplicável” que o PNCDR, “um dos planos principais e prioritários de 2004 a 2014”, tenha de repente deixado de existir, considerando também ser um erro “ninguém saber” a taxa de efetividade dos planos ao longo dos anos.
Foi por esta razão que Luís Cunha Miranda, juntamente com outros reumatologistas, decidiu avaliar o que estava previsto no plano e o que foi concretizado.
“Mesmo sete anos depois de ter terminado, temos apenas dois terços do plano feito”, criticou, defendendo um novo plano com estratégias para reduzir a incapacidade e melhorar a qualidade de vida dos doentes, que passam pelo encaminhamento precoce para a reumatologia e a redução do intervalo de diagnóstico.
Segundo o especialista, existem 16 hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) que, “apesar de o Estado e do Ministério da Saúde dizerem que fazem parte da rede de referenciação hospitalar de reumatologia, não tem um único reumatologista”.
“Em Portugal 50% da população não tem acesso à reumatologia, são mais de cinco milhões de pessoas”, elucidou, apontando que há pouco mais de um ano faltavam 72 especialistas por todo o país, uma situação que deve manter-se e que se reflete nas listas de espera.
No Hospital Amadora-Sintra, ironizou, a lista de espera é de 25 anos, porque nunca teve um reumatologista e no Hospital Santo António no Porto é de cerca 150 anos.
“A questão fundamental é que nós sabemos e trabalhámos estes dados para poder dá-los à tutela, e sempre os demos ao longo do tempo”, mas, vincou, “a inação e a falta de planeamento” resulta nesta realidade.
Aludindo à “grande discussão” que existe sobre a falta de médicos em diversos hospitais, Luís Cunha Miranda afirmou que só acontece porque “a tutela não quer saber quantos médicos é que faltam”, porque “é facílimo saber esses dados”.
“O que acontece é que se não se souber quantos anestesistas faltam, quantos reumatologistas faltam, quantos pediatras faltam, eles não estão em falta. Só quando há uma rutura numa urgência ou num hospital é que dizemos que faltam cinco no Barreiro, faltam dez noutro sítio”, criticou.
No seu entender, isto acontece porque “não há um planeamento estratégico”: “Aquilo que temos vindo a assistir é uma mentira calada que é: não queremos saber quantos faltam e quando faltam a gente vai vendo o que é que consegue desenrascar. Isto acontece com a reumatologia desde sempre”.
Por isso, acrescentou, “o único planeamento estratégico que existe por parte dos ministros da Saúde em Portugal é o planeamento estratégico da sua carreira e dos seus, não é o planeamento estratégico dos doentes, das especialidades e dos hospitais”.
Há também “uma mentira tremenda” ao dizer que é a Ordem de Médicos ou os médicos que bloqueiam a formação de outros especialistas.
“Dou o exemplo da reumatologia que tem feito um esforço tremendo para pôr mais reumatologistas ao serviço do SNS. Neste momento, temos 84 internos, numa especialidade de 200 e tal pessoas, é muita gente”, disse.
Contudo, lamentou, “o que acontece é que vão ser desperdiçados porque ninguém os vai contratar porque não há planeamento, porque não há vagas”.
Luís Cunha Miranda admitiu, contudo, que os formadores são “cada vez mais raros e mais escassos” no SNS porque estão a ir para o privado por falta de condições.
“É esse desbaratar do SNS e da qualidade assistencial do SNS que está a impedir que o SNS tenha maior capacidade de formar mais especialistas”, rematou.
LUSA/HN
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