O estudo visou analisar a proteção da população portuguesa contra o serogrupo C, causador da doença, 10 anos após a introdução da vacina no Programa Nacional de Vacinação (PNV), por forma a avaliar se a atual estratégia de vacinação no PNV continua a garantir a proteção da população ou se existe necessidade de uma dose de reforço da vacina na adolescência.
Para isso, os investigadores quantificaram os níveis de anticorpos séricos bactericidas contra o serogrupo C numa amostra representativa da população, que envolveu 1.500 pessoas com idades entre os 2 e os 64 anos que participaram no Inquérito Serológico Nacional 2015/2016.
Os resultados do estudo, a que a agência Lusa teve acesso, revelam que apenas 31,1% dos indivíduos continuavam protegidos, o que indica que uma dose única da vacina numa idade tão precoce não é eficaz a conferir proteção duradoura contra a Meningite C.
A proporção de indivíduos com títulos de anticorpos considerados protetores foi particularmente baixa em crianças dos 2 aos 4 anos que receberam uma única dose de vacina aos 12 meses, mesmo apesar da alta cobertura vacinal alcançada nesta coorte (98%).
As maiores proporções de indivíduos seroprotegidos foram observadas em adultos e jovens (15-24 anos), resultante da vacinação durante a campanha de recuperação dos 5 aos 15 anos.
“O nosso estudo, bem como estudos noutros países, demonstram que os programas de vacinação seguidos de campanhas de recuperação dirigidas a adolescentes e jovens adultos podem contribuir para a redução da proporção global de indivíduos em risco para a doença de meningite C na população, particularmente nas crianças”, defende.
O estudo recomenda que o esquema vacinal atual seja revisto, visando a introdução de uma dose de reforço da vacina meningocócica conjugada durante a adolescência.
Comentando os resultados deste estudo, o pediatra Luís Varanda salientou a sua importância, referindo que Inglaterra já tinha efetuado um estudo semelhante que verificou que ao longo do tempo se vai perdendo imunidade e quando se chega à adolescência, por exemplo, o nível de proteção é bastante baixo.
Atualmente, países, como o Reino Unido, Irlanda, Bélgica, Espanha, Itália, entre outros, já estão a adotar a estratégia de vacinação recomendada pelos investigadores do estudo.
O professor de pediatria da Faculdade de Ciências Médicas do Instituto de Higiene e Medicina Tropical explicou que a bactéria Neisseria, que causa a meningite, é transmitida sobretudo pelos adolescentes e pelos adultos jovens, daí a importância de estarem protegidos.
“Não são as crianças que transmitem a doença. São os adolescentes e os adultos jovens que transmitem a doença aos outros, seja às crianças mais pequeninas sejam aos mais velhos, os idosos”, que são grupos vulneráveis.
Para Luís Varanda, este estudo é muito importante porque “vai obrigar a pensar e eventualmente tomar decisões”.
Questionado se essa decisão seria uma dose de reforço na adolescência, o especialista afirmou que, do ponto de vista de proteção da população, “seria a decisão mais acertada”, mas sublinhou que é uma decisão que terá de ser tomada pelas autoridades saúde em função das análise custo-benefício.
“Se vacinarmos as crianças mais pequeninas não estamos a atuar no reservatório da bactéria que são os adolescentes. Ao vacinar os adolescentes atuamos no reservatório da bactéria e temos uma proteção alargada a toda a população”, defendeu, ressalvando que não quer que as suas declarações sejam tidas como uma forma de pressão sobre as autoridades.
“A Direção-Geral de Saúde já teve este assunto na agenda e penso que não avançou a discussão pela covid e, portanto, não é um assunto esquecido”, salientou.
Segundo Luís Varanda, a meningite C é uma doença é rara, com menos de um caso por 100 mil habitantes, mas deixa sequelas e tem uma taxa de mortalidade muito elevada.
A incidência da diminuiu em Portugal desde a introdução da vacina no mercado privado em 2001 e no PNV em 2006.
LUSA/HN
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