CPLP pode ajudar a eliminar a lepra e a discriminação dos doentes

28 de Janeiro 2022

A Relatora Especial da ONU para a Lepra, a portuguesa Alice Cruz, defende uma estratégia da CPLP para eliminar a discriminação e a própria doença, sublinhando que alguns dos Estados-membros têm uma elevada incidência desta patologia.

A Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é “um espaço importante para a lepra, embora não exista uma estratégia da própria CPLP em relação à lepra, o que eu lamento”, afirmou Alice Cruz, em entrevista à agência Lusa a partir do Equador, onde reside.

“Há países importantes da CPLP que constam entre os 23 países prioritários da OMS para a lepra. Temos o Brasil, que é simplesmente o país com a maior incidência relativa. Depois, temos Angola, Moçambique e temos outros países da CPLP que, embora não tenham números tão significativos, têm questões sociais de extrema exclusão das pessoas afetadas”, afirmou.

A primeira Relatora Especial para a Eliminação da Discriminação contra as Pessoas afetadas pela Lepra e seus Familiares, funções que assumiu em 2017, identifica na CPLP “um papel importante para eliminar esta discriminação e para a troca de conhecimento entre os países”.

“Há países da CPLP que estão a fazer um trabalho muito bom no que respeita à lepra. O que é curioso é que é em diferentes áreas. Se existisse esse espaço de troca de conhecimento e de boas práticas, eu acho que seria extremamente benéfico, não só para eliminar a discriminação, mas também a doença”, referiu.

Um “dado importante” sobre a comunidade que Alice Cruz faz questão de sublinhar é que “não há países da CPLP com leis discriminatórias” em relação à lepra – existem mais de 100 em todo o mundo.

“Do ponto de vista daquilo que a gente chama harmonia legal, entre as leis nacionais e a lei internacional de direitos humanos, de facto houve um avanço importante nos países da CPLP. Há áreas-chave, que realmente são os direitos sociais e económicos”, adiantou.

Classificada pelas ONU como doença tropical negligenciada e associada à pobreza, a distribuição da lepra também acompanha a capacidade dos países de garantirem aos seus cidadãos um acesso equitativo a bens, recursos e oportunidade.

Por isso, “encontra-se a lepra em países com maiores dificuldades estruturais e, dentro dos países, tem também uma maior incidência em espaços subnacionais que estão mais associados à pobreza e à falta de acesso”.

Segundo Alice Cruz, “o Brasil é, nada mais nada menos, que o segundo país no mundo com a maior incidência absoluta e o primeiro país do mundo com maior incidência relativa de lepra”, existindo ainda um número importante de casos diagnosticados em alguns países da América do Sul e Central, mas o que se destaca de facto na região é o Brasil.

A lepra “continua a ser muito importante na região asiática. A índia destaca-se, porque é o país com maior número absoluto de casos, mas depois há outros países da região asiática que são importantes – a Indonésia, o Nepal, o Bangladesh”.

“A Ásia é um fator muito importante em termos de incidência, mas também no que se refere à discriminação institucionalizada, porque a maioria das leis discriminatórias que ainda estão em vigor – e que carecem em absoluto de qualquer justificação científica – encontram-se justamente na Ásia e Pacífico”, disse a relatora.

Em relação ao continente africano, Alice Cruz classificou a região como “um espaço de grande preocupação, sobretudo porque é altamente provável que os números que são reportados à Organização Mundial da Saúde não correspondam à realidade e que exista uma forte endemia oculta nos países africanos”.

“A lepra é uma doença que está tão fortemente associada à exclusão, mas a tantos níveis, que é uma luta gigantesca sequer para assegurar o acesso ao diagnóstico”, disse.

De acordo com a relatora, “muitas das vezes são populações, e em África isso acontece muito, que, perante um problema de saúde, não vão aos estabelecimentos de saúde públicos, vão aos médicos tradicionais”.

“O contexto africano é um contexto onde é absolutamente necessário pensar em estratégias interculturais de saúde pública, porque muitas vezes são os médicos tradicionais que têm acesso a essas pessoas e podem fazer o primeiro diagnóstico”, defendeu.

Em África, “os números que existem são preocupantes, há muitos países prioritários que estão na África, levantam questões: até que ponto refletem a realidade, embora existam países que fazem um esforço muito grande, mas a lepra é uma doença tropical negligenciada e essas doenças estão muito associadas a fragilidades dos sistemas de saúde e esse é o caso do continente africano”.

Todos os anos surgem cerca de 200 mil novos casos de lepra em todo o mundo, segundo dados das Nações Unidas.

O Dia Mundial de Combate à Hanseníase (lepra) assinala-se este ano em 30 de janeiro. O dia foi instituído em 1954 pelas Nações Unidas, que estipularam que se assinala todos os anos no último domingo de janeiro.

LUSA/HN

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