Estudo sobre cenários para Portugal em 2030 propõe cuidados de saúde primários reforçados e articulação com privados

18 de Fevereiro 2022

A sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde para os próximos dez anos passa pelo reforço dos cuidados de saúde primários e por uma maior articulação com o setor privado, propõe um estudo divulgado esta sexta-feira.

O estudo do projeto Foresight Portugal 2030, da Fundação Calouste Gulbenkian, é “um exercício de prospetiva”, que cruza questões económicas e financeiras com questões demográficas, sociais, tecnológicas, ambientais, geoeconómicas e geopolíticas.

Coordenado pelo economista José Félix Ribeiro, o projeto tem três objetivos assumidos: “retomar o crescimento do país, após décadas de quase estagnação; contribuir para a mitigação e a adaptação às alterações climáticas, sem travar o crescimento; e promover a coesão e a mobilidade sociais, num contexto de mais forte solidariedade intergeracional”.

O estudo traça três cenários, que aplica a cada tema analisado, sendo que o primeiro assenta na “continuidade” do que já existe atualmente, enquanto os outros dois sugerem estratégias de “ajustamento” ou “reposicionamento” para “mudar a trajetória de Portugal das últimas décadas”, de forma a “que o país chegue a 2030 muito mais capaz de crescer e prosperar”.

Atualmente, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) apresenta “crescentes dificuldades em termos de sustentabilidade financeira”, assinala o estudo, projetando um agravamento em resultado da conjugação de três fatores: prolongamento do tempo de vida na população com 80 e mais anos, maior consumo de medicamentos e maior impacto de doenças crónicas na população em idade ativa.

“O setor público continua a ser o principal financiador da saúde em Portugal. Os serviços de saúde que hoje geram maior despesa pública são, por ordem de investimento, os curativos, paliativos, de reabilitação, continuados e preventivos”, retrata o estudo, acrescentando que “é com a manutenção de hospitais, com cuidados de saúde em ambulatório e com farmácias que mais se gasta”.

Face a isto, a proposta de “ajustamento” (cenário 2) sugere uma “dupla evolução do SNS”: por um lado, o reforço do papel dos cuidados de saúde primários e, por outro, uma maior articulação com seguradoras privadas.

A proposta de “reposicionamento” (cenário 3) sugere a “articulação do SNS e do setor privado com a possível criação de um seguro universal de saúde cobrindo os cuidados de saúde primários e os cuidados hospitalares”.

Qualquer um dos cenários implica uma abordagem integrada e uma digitalização aplicada ao funcionamento dos sistemas de saúde.

Reconhecendo que “a preocupação com o acesso a cuidados de saúde tem estado até hoje subordinada aos custos que tal facto pode implicar”, o estudo convoca “um novo olhar sobre a utilização de tecnologias para a gestão da doença”, apelando à “coordenação” entre indústrias, profissionais de saúde e utentes.

Para as várias personalidades que participaram no estudo, com três volumes, “parece desejável passar do atual sistema centrado nos hospitais e na doença, para um outro centrado em pessoas (…), em que todos os cidadãos serão parceiros na promoção e nos cuidados de saúde fiáveis”.

O documento defende que é “urgente repensar as políticas de saúde, centrando-as nas populações, em detrimento da questão estritamente economicista” e a criação de “mecanismos de controlo que obriguem à implementação efetiva da Lei de Bases da Saúde”.

As políticas de saúde devem responder às “especificidades reais da população” e basear-se “na transparência e no assumir das responsabilidades por parte das instituições e dos profissionais”, realçam os autores do estudo.

Simultaneamente, devem ser transversais a outros setores, pois só assim será possível passar de uma lógica de quantidade de vida para uma lógica de qualidade de vida.

“Pensar o futuro do funcionamento do sistema de saúde impõe uma gestão racional das despesas, significa apostar na qualificação dos recursos humanos”, destacam.

Para os autores do estudo, “além de responsabilizar o cidadão utente, há que responsabilizar os profissionais detentores de informação e competências para definir as escolhas mais racionais e eficazes de diagnóstico e tratamento”, assegurando sempre que “a falta de recursos não impeça” o acesso a cuidados de saúde, nem “crie diferenças entre quem pode ou não pagar”.

LUSA/HN

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

Internamento do Hospital de Amarante terá 150 novas camas

O internamento do Hospital de São Gonçalo, em Amarante, vai ter mais 150 camas, alargamento incluído numa obra que deverá começar no próximo ano e custará 14 milhões de euros, descreveu hoje fonte da ULS Tâmega e Sousa.

Combinação de fármacos mostra potencial para melhorar tratamento do cancro colorretal

Estudo pré-clínico liderado pela Universidade de Barcelona descobriu um mecanismo metabólico que explica a resistência das células de cancro colorretal ao fármaco palbociclib. A investigação demonstra que a combinação deste medicamento com a telaglenastat bloqueia essa adaptação das células, resultando num efeito sinérgico que reduz significativamente a proliferação tumoral, abrindo caminho para futuros ensaios clínicos

XIV Congresso da FNAM debate futuro do SNS em momento decisivo

A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) vai realizar nos dias 15 e 16 de novembro de 2025, em Viana do Castelo, o seu XIV Congresso, sob o tema “Que Futuro Queremos para o SNS?”. Este encontro, que terá lugar no Hotel Axis, surge num contexto de grande incerteza para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e reunirá mais de uma centena de delegados de todo o país.

Motards apoiam prevenção do cancro da próstata no “Novembro Azul”

No âmbito do “Novembro Azul”, mês dedicado à sensibilização para o cancro no homem, o Núcleo Regional do Sul da Liga Portuguesa Contra o Cancro (LPCC-NRS) organiza a iniciativa “MEN – Motards Embrace November”, um passeio solidário de motociclistas que combina a paixão pelas duas rodas com a promoção da saúde masculina.

Hospital de Vila Real investe 13 milhões na ampliação da urgência

A Unidade Local de Saúde de Trás-os-Montes e Alto Douro (ULSTMAD) anunciou um investimento de 13 milhões de euros para a ampliação do serviço de urgência do Hospital de Vila Real. O valor, financiado a 50% pelo programa Norte 2030, destina-se a melhorar as condições de trabalho dos profissionais e o atendimento aos utentes.

André Gomes (SMZS) “Médicos satisfeitos não precisam de ser prestadores de serviços”

Em entrevista exclusiva ao HealthNews, André Gomes, recém-eleito presidente do Sindicato dos Médicos da Zona Sul (SMZS) para o triénio 2025-2028, traça as prioridades do mandato. O foco absoluto é inverter a perda de poder de compra e a degradação das condições de trabalho no SNS. A estratégia passa por pressionar o Ministério da Saúde, já em mediação, para repor direitos como as 35 horas e atualizar salários. Combater a precariedade e travar a fuga de médicos para o privado e internacional são outras batalhas, com a defesa intransigente de um SNS público como bandeira

MAIS LIDAS

Share This
Verified by MonsterInsights