Ter cancro não significa abdicar do sonho da maternidade

1 de Fevereiro 2023

Em vésperas do Dia Mundial do Cancro (4 de fevereiro), Catarina Godinho, ginecologista e especialista em medicina da reprodução, deixa uma mensagem de esperança às mulheres, para que não desistam e se informem sobre todas as formas que existem para preservar a fertilidade.

“É essencial que, no momento traumático do diagnóstico, o doente receba informação médica rigorosa e completa, que tenha em conta os diferentes aspetos e as etapas da vida da mulher, como o seu desejo de ser mãe, e que tenha em conta as suas necessidades e os seus sonhos. Que nenhuma mulher tenha de abdicar da maternidade por causa do cancro e da falta de informação”, sublinha a médica do IVI Lisboa.

Entre as mulheres, o cancro da mama é o que tem maior expressão. Pode afetar uma em cada oito mulheres. No entanto, quando diagnosticado precocemente, tem geralmente um bom prognóstico. A radioterapia e a quimioterapia aceleram a diminuição natural da fertilidade, mas Catarina Godinho lembra que os médicos podem e devem informar as mulheres sobre formas de preservar a fertilidade.

Assegurar que podem ser mães mais tarde também acaba por lhes dar força e coragem para enfrentar e vencer a batalha do cancro. Rute Abade é um destes exemplos de perseverança. Vencida a batalha contra o cancro da mama, apontou as baterias para outra luta: a de concretizar o sonho da maternidade. “O meu filho é um milagre da ciência e também o resultado da sensibilidade da minha médica, que me informou da possibilidade de vitrificar (congelar) os meus ovócitos antes da quimioterapia”, afirma.

Rute tem hoje um menino de dois anos, graças à preservação dos seus ovócitos, feita após o diagnóstico de cancro e antes de iniciar os tratamentos. Tinha na altura 35 anos. O diagnóstico atempado facilitou a cura e a concretização do sonho da maternidade.

A mãe de Rute foi diagnosticada em 2006 com cancro nos ovários e, como já eram conhecidos outros casos na família, solicitou a abertura de um estudo genético no hospital onde era seguida. Este estudo foi inconclusivo mesmo após a morte da mãe de Rute em 2009 e apenas em 2012 se confirmou que a Rute, e todas as mulheres da família do lado materno, tinham uma alteração genética BRCA1, que podia provocar cancro dos ovários e da mama.

“No primeiro ano em que fiz os exames estava tudo bem, mas um ano depois, durante uma ressonância magnética de rotina, a médica disse-me que tinha um nódulo na mama, com o tamanho de um bago de arroz. Fiz uma biópsia e deram-me indicação para dupla mastectomia e quimioterapia”, revela Rute. Acrescenta que, quando soube do diagnóstico, só pensou na cura e foi a médica que a aconselhou a salvaguardar a hipótese de ser mãe. “Estava tão focada na doença que não pensei em acautelar o futuro e a maternidade (…). Este alerta foi muito importante e fazia todo o sentido. No dia seguinte à operação, iniciei o processo de preservação de fertilidade e só depois fiz quimioterapia”, acrescenta.

Três anos depois e uma vez que os médicos que a seguiam em oncologia lhe deram a indicação de que estava preparada para dar início ao tratamento de fertilidade, voltou ao IVI e, dos 9 ovócitos que tinha conseguido preservar quando tinha 35 anos, gerou um embrião. Embrião este que 9 meses depois deu origem ao bebé de 2 anos.

De acordo com Catarina Godinho, entre 2007 e 2022, mais de 1400 mulheres com diagnóstico de cancro vitrificaram os seus ovócitos nas clínicas IVI da Península Ibérica, antes de se submeterem a um tratamento de quimioterapia ou radioterapia. Desde então, nasceram cerca de seis dezenas de bebés, número que aumenta todos os anos.

PR/HN/RA

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