Ricardo Veloso, diretor do Serviço de Gastrenterologia do Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, disse esta quinta-feira, no webinar organizado pela Associação Portuguesa para o Desenvolvimento Hospitalar em colaboração com a FDC Consulting, que o tempo do médico autoritário já passou, e assume-se defensor do doente e do Serviço Nacional de Saúde. A relação médico-doente tem de ser equilibrada, de parceria, para melhorar a qualidade de vida do utente, discutindo e escolhendo caminhos em conjunto. Para tal, o médico tem de preparar o doente fornecendo-lhe as “armas” necessárias para uma decisão partilhada. “Também temos que ter a humildade suficiente para compreender que o doente pode ter expectativas diferentes das nossas”, acrescentou o médico.
Nos Cuidados Paliativos do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, esta parceria concretiza-se, com o doente e com o cuidador, garantiu a enfermeira especialista Dora Santos. É preciso tempo – explicou a enfermeira – para avaliar o doente, o seu percurso de doença e as experiências passadas. “O nosso referencial teórico [na enfermagem] é ‘cuidado centrado na pessoa’, que felizmente, nos últimos anos, foi adquirido em termos políticos e organizacionais”, referiu a oradora.
Também houve uma “mudança de paradigma muito importante” na indústria farmacêutica: “Os doentes não são vistos, neste momento, como meros destinatários dos tratamentos que se pretendem desenvolver, mas sim como parceiros ativos na evolução, na investigação e no desenvolvimento de tratamentos mais eficazes e, também, mais seguros”. Esta parceria com os doentes “é fundamental”, torna a investigação mais célere e melhora a adesão terapêutica, frisou Heitor Costa, diretor de Assuntos Institucionais e Inovação da APIFARMA (Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica).
Os doentes estão efetivamente mais capacitados, participam mais e são mais ouvidos, mas alguns ainda não querem ter a responsabilidade de decidir e há profissionais do setor com alguma dificuldade em acolher os doentes mais capacitados e com vontade de intervir mais. “Sobretudo, temos um grande caminho a percorrer na capacitação de todo o sistema”, “porque para tomar decisões é preciso estar informado”, disse Elsa Frazão Mateus, presidente da Liga Portuguesa Contra as Doenças Reumáticas.
Para Ana Escoval, administradora hospital e vogal da APDH, é importante que os profissionais de saúde queiram essa participação porque o doente conhece bem a sua condição e não há dois doentes iguais, e como nem doentes nem profissionais estão habituados a esta colaboração mais ativa, “temos de aprender todos”.
No debate de ontem, moderado por Marina Caldas, foram também sinalizados problemas relacionados com a rede de cuidados continuados, entraves à divulgação de ensaios clínicos, falta de apoio aos cuidadores, falta de literacia na navegação do sistema de saúde, atrasos em relação a outros países, ideias interessantes que não são implementadas, constrangimento temporal nas consultas, apoio psicológico e psicoterapêutico aos doentes com doença crónica e a fragilidade dos doentes em situações de vulnerabilidade económica. “A medicina em Portugal, infelizmente, não é gratuita”, alertou Ricardo Veloso.
“Os doentes não têm culpa nenhuma disto. Isto são as nossas dores, não são as suas, mas que se vão infelizmente refletir nos cuidados de saúde”, disse o médico.
HN/RA
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