Hoje, quando pesquisamos por doenças ginecológicas, a endometriose é uma das abordadas. Mas nem sempre foi assim e ainda existe um longo caminho de consciencialização e literacia por fazer em Portugal e no mundo. A endometriose é uma doença inflamatória crónica, estrogénio-dependente, que se caracteriza pela presença de tecido similar ao endométrio em localização extra-uterina, provocando uma resposta local inflamatória.
Estima-se que afete uma em cada 10 mulheres em todo o mundo e o tempo médio até ao seu diagnóstico varia entre os seis e 10 anos. Frequentemente o diagnóstico surge após tentativa de gravidez, uma vez que cerca de 50% das mulheres com problemas de fertilidade têm endometriose.
Numa altura em que o conhecimento está à distância de um clique, uma das principais questões que se coloca tem a ver com o tempo de diagnóstico. Porque é que as estimativas apontam para um atraso de seis a 10 anos no diagnóstico e em Portugal mais de 40% das mulheres com endometriose demoram mais de 10 anos a serem diagnosticadas. Podemos decompor a resposta em dois grandes grupos: a sociedade e a comunidade médica.
É uma doença que, apesar dos sintomas incapacitantes, ainda é desvalorizada pela sociedade. “Ter dores menstruais é normal”, “não sejas picuinhas”, “eu e a tua avó também sofremos, por isso, habitua-te” e “quando engravidares, isso passa” são algumas das expressões mais frequentes que as mulheres com endometriose ouvem. Este tipo de crenças e expressões condiciona a procura de ajuda por parte da mulher e faz com que o diagnóstico se atrase ou aconteça só quando se tenta engravidar
A somar às crenças enraizadas e perpetuadas ao longo de gerações, os médicos, ao longo dos anos de formação, (mesmo os especialistas em ginecologia) não falam muito sobre esta doença. É uma doença que tem apenas cerca de 100 anos de estudos científicos dedicados, a sua definição foi revista em 2021 e ainda não se encontrou uma explicação consensual que esclareça o seu surgimento. Por isso, quando uma mulher tem queixas menstruais, a pílula é a primeira linha de tratamento sem se procurar o diagnóstico para as queixas, acabando por mascarar os sintomas durante anos. Por outro lado, quando se procura o diagnóstico, por desconhecimento (uma vez que tem de se procurar em localização extra-uterina) muitas vezes acaba por não se chegar à doença.
Depois de esclarecida a dúvida sobre o tempo de diagnóstico, a questão seguinte prende-se com o que cada um destes grupos pode e está a fazer para mudar o paradigma da literacia de saúde dedicada à endometriose em Portugal.
A comunidade médica, através dos médicos especialistas, procura criar centros e equipas dedicadas e dar formação aos colegas de ginecologia e de medicina geral e familiar (a primeira linha de contacto dos pacientes em Portugal). A sociedade tem vários grupos altruístas a trabalhar na consciencialização dos quais destaco a Associação MulherEndo e a Catarina Maia do blog O meu útero. A Mulherendo trabalha gratuitamente no apoio e orientação das mulheres que chegam até si, dá sessões de esclarecimento junto das escolas, universidades, empresas e centros de saúde e procura ter uma intervenção política para incluir a endometriose no conjunto de doenças crónicas. O blog O meu útero partilha a jornada de uma paciente com endometriose e divulga informação dedicada que ajuda a desbloquear o processo de pesquisa.
Mas como informação fidedigna nunca é demais, num formato diferente decidi desafiar a comunidade médica e pacientes a gravar um podcast, PodEndo Endometriose: e agora?, com o propósito de partilhar conversas de 25 a 40 minutos com testemunhos e especialistas de saúde (ginecologistas, psicólogos, nutricionistas, etc.), que procuram ajudar as mulheres a ter uma vida equilibrada apesar desta patologia. O lançamento do primeiro episódio ocorreu no dia 22 de maio e conta já com sete episódios lançados. Organicamente, tem cerca de 2 700 seguidores no Instagram e, na totalidade, atingiu um alcance superior a 100 000 utilizadores. No YouTube e Spotify apresenta números impressionantes de visualizações, 6 400 e 600 respetivamente.
A endometriose, sendo uma doença crónica, exige um acompanhamento multidisciplinar para controlo dos sintomas. Esta visão multidisciplinar de acompanhamento é determinante para as mulheres terem uma vida mais equilibrada. Assim, com o podcast pretendo criar conteúdo em vídeo e áudio para ajudar as mulheres a ter uma vida equilibrada apesar desta patologia.
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