Mais de quatro décadas após a criação do Serviço Nacional de Saúde, pode-se questionar a sua vitalidade, mas ninguém de bom-senso ousará questionar o carácter estruturante que ele assume na sociedade portuguesa como símbolo maior de equidade e bem público, que deve ser preservado a todo o custo.
Os portugueses – mesmo aqueles que, muitas vezes com razão, desesperam com a falta de resposta adequada e atempada às suas necessidades – sabem como as coisas mudaram. Nas mais de quatro décadas que leva de vida, o SNS pôs à disposição das populações mais médicos, enfermeiros e outros profissionais, mais centros de saúde e hospitais. Ao mesmo tempo, a esperança de vida, considerando homens e mulheres, galopou para além dos 80 anos. Já a mortalidade infantil foi razão para que todos se orgulhassem quando desceu abaixo dos dois dígitos por mil.
Não quero com isto dizer que o SNS está bem como está. Seria uma insensatez. São abundantes os sinais incapacitantes que o podem levar à paralisia. Direi, por isso, que é uma emergência nacional fazer-lhe um “check up”. Não um “check up” promocional para propaganda política, mas um exame geral a um adulto que teve uma vida difícil e que, por isso, carece de cuidados especiais e teme pela iminente senioridade.
A questão que se põe – ou a questão que me foi posta – é saber se este tão necessário avanço qualitativo é compaginável com o envolvimento democrático e participativo dos cidadãos. Não hesito em dizer que sim, quer do ponto de vista individual, quer fazendo apelo às organizações sociais, às diferentes associações e mesmo às autoridades regionais e locais. Hoje, mais do que nunca, o primado da transparência dever presidir à tomada de decisões. A título de exemplo, consideraria inaceitável que a complexa decisão de erguer um novo hospital fosse deixada à mercê de caciques, suplantando as decisões técnicas e ao arrepio do interesse maioritário das populações.
Coincidindo o Dia Nacional do SNS com o Dia Internacional da Democracia, ouso dizer que quanto mais saudável estiver a nossa democracia mais forte estará o Serviço Nacional de Saúde. Compete ao poder político definir os melhores caminhos e afastar os bloqueios – a persistente suborçamentação, os baixos salários, o pluriemprego e a desmotivação são alguns deles – que podem levar à implosão. É o poder político que tem a tarefa de definir com clareza os campos de acção dos diversos agentes – públicos, privados, sociais…- garantindo que nenhum cidadão se sinta marginalizado ou discriminado em função dos seus proventos. Num Sistema Nacional de Saúde que se pretende responsável e eficaz não deve haver lugar a querelas nem preconceitos ideológicos.
Sendo a Liberdade o húmus da nossa sociedade democrática, o nível de satisfação com o SNS é o barómetro que todos devem ter em conta como referencial. Uma sociedade descrente é uma sociedade doente. E o País democrático, que tem no SNS uma das maiores conquistas, não pode consentir que esse pilar da Democracia seja torpedeado por interesses distanciados do bem geral. Fortalecer o SNS é fortalecer a Democracia. Como tal, espero que assim continue a ser.
E, acima de tudo, há que manter o inapagável carácter universal e tendencialmente gratuito do SNS, que é a sua marca de água.
11 de Setembro de 2023
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