Para a ministra Catarina Sarmento e Castro, esta iniciativa traz como grande novidade o facto de se tratar da “primeira estratégia nacional para as vítimas de crime” e, além disso, ser “dirigida a todas as vítimas de crime”.
“Esta estratégia pretende olhar para as vítimas de crime em todas as suas cambiantes”, incluindo não só aspetos patrimoniais, mas “também fundamentalmente olhando para o aspeto psicológico, que é preciso apoiar”, mencionou a titular da pasta de Justiça.
“Olhando não apenas para as respostas que são diretamente dadas por um tribunal, ou seja as respostas jurídicas ou judiciais, mas também para as respostas das várias áreas do saber, que podem passar, por exemplo, por respostas no âmbito da segurança social ou da saúde, com o apoio psicológico”, precisou Catarina Sarmento e Castro.
“Era, de facto, necessário ir mais longe”, adiantou, ao discursar no encerramento da sessão de apresentação da ENDVC 2024-2028, que contou também com a perspetiva das Organizações Não Governamentais de Apoio à Vítima (AMCV, APAV, IAC e UMAR) e do Ministério Público.
Entre as características inovadoras da estratégia, a ministra apontou a “criação de um fundo de reparação para as vítimas”, que permita apoiar as vítimas das diferentes tipologias de crime.
Falando aos jornalistas, realçou ainda que “o apoio à vítima não deve terminar no dia da condenação [por exemplo, do agressor] em que o sistema jurídico reconheceu que houve a prática de um crime.
“A vítima deve, no fundo, encontrar respostas holísticas de reparação, não só de um crime que pode ser patrimonial, mas muitas vezes fundamentalmente de danos, que são danos psicológicos”, sublinhou a ministra, notando que “esta atenção ao dano psicológico” é trazida por esta estratégia virada para os direitos das vítimas de crime.
Catarina Sarmento e Castro aludiu ainda aos progressos realizados desde 2019 pelo Governo, em colaboração com o Ministério Público, e que levaram já à entrada em funcionamento de 10 gabinetes de apoio à vítima, juntamente com a ideia de criar anualmente dois novos gabinetes.
“Em 2019 não tínhamos nenhum gabinete de apoio à vítima a funcionar nos Departamentos de Investigação e Ação Penal e nos tribunais. Hoje temos 10. Esta obrigatoriedade legal é fundamental porque de facto põe em letra de lei a obrigatoriedade de a cada ano serem instituídos dois gabinetes de apoio à vítima”, disse a ministra.
Acrescentou que um deles foi criado em Setúbal ou outro em Leiria.
Catarina Sarmento e Castro confirmou que esta estratégia de proteção de vítimas contempla vários projetos-piloto, sendo um deles a retirada do infrator da casa da família (por exemplo, no caso de violência doméstica), pois embora esta medida esteja já prevista na lei é “necessário torná-la operativa”, pois a prática continua ser “a vítima a sair de casa”.
Segundo a ministra, isso permitirá que “a vítima possa permanecer naquilo que é o seu espaço [de conforto] e que nada fez para desmerecer” e que, pelo contrário, seja “o agressor ou a agressora a serem, de facto, obrigados a sair da sua casa”.
Na cerimónia de hoje no Campus de Justiça, em Lisboa, coube a Sónia Reis, adjunta do gabinete da ministra, apresentar as grandes linhas da Estratégia que, através de 92 medidas, garante “a cobertura de uma rede nacional de serviços de apoio às vítimas de crime” nas diversas vertentes, não descurando a questão do financiamento.
O diploma prevê um fundo “resultante da afetação parcial das multas pagas em virtude de condenações em procedimento criminal” e reconhece “prioridade à reparação da vítima” de crimes (assegurando a inclusão dos danos psicológicos na determinação de indemnizações).
Sobressai ainda a intenção de reforçar os gabinetes de apoio às vítimas e outros serviços no território nacional, a criação de uma aplicação digital que permita aceder a informação sobre direitos e serviços e fazer denúncias em diversas línguas.
A garantia de número de utente no Serviço Nacional de Saúde para vítimas indocumentadas, criação de centros de atendimento para vítimas de violência sexual nas urgências dos hospitais ou a retirada de infratores da casa de família (e encaminhamento para os recursos sociais locais) são outras medidas propostas.
A ENDVC contempla ainda o estabelecimento de protocolos de encaminhamento e referenciação entre forças policiais e serviços de apoio à vítima, bem como o desenvolvimento de circuitos de atuação nos estabelecimentos de saúde e escolas em casos de identificação de vítima de crime, estando aqui previsto o dever de denúncia obrigatória.
A ENDVC atribui especial atenção e consideração às vítimas especialmente vulneráveis.
Entre estas encontram-se crianças e jovens, mulheres grávidas, idosos, doentes, pessoas com deficiência, pessoas LGBTQIA+ e imigrantes, mas também vítimas de homicídio, de tráfico de pessoas e crimes conexos, de crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual, de crimes de ódio, de violência de género, de violência doméstica, de cibercriminalidade, de terrorismo, de outros associados a criminalidade violenta.
A nova estratégia assenta em seis eixos estratégicos: criação de uma cultura de prevenção; desburocratização dos mecanismos de participação das vítimas na justiça; reforço das estruturas e dos serviços de apoio; aumento da influência das vítimas no processo penal; desenvolvimento de uma cultura organizacional de empatia pelas vítimas; e a realização de um estudo abrangente para conhecer a realidade deste fenómeno social.
LUSA/HN
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