Especialista recomenda reeducação do desejo quando o medo e a dor emocional afetam os casais inférteis

14 de Fevereiro 2024

Vânia Costa Ribeiro, ginecologista e especialista em procriação medicamente assistida no IVI Lisboa, diz que é importante olhar para a sexualidade "como um todo e não nos focarmos apenas na função reprodutiva", e explica o que fazer quando o medo do fracasso e a dor emocional prejudicam a vida sexual dos casais inférteis.

Que o stress é inimigo de uma sexualidade saudável e prazerosa não é novidade. Mas, se somarmos a pressão (tanto pessoal, como social) para alcançar uma gravidez que tarda em chegar, a vida sexual do casal pode ser “atropelada” por um turbilhão de acontecimentos. Os casais à procura de um filho passam por várias fases. Inicialmente, sem problemas de fertilidade à vista, continuam a manter relações como habitualmente. Depois, passam por ajustar essas relações aos dias férteis e, quando veem que a gravidez não é facilmente alcançada, aumentam essa frequência para alcançá-la.

Nesta última fase, a frustração de não alcançar o objetivo desejado começa a tomar conta do casal. O que era divertido e emocionante torna-se, pouco a pouco, menos apetitoso e até mesmo insatisfatório no contexto de uma sexualidade planeada. “A paixão e a espontaneidade iniciais podem desaparecer com o passar do tempo. A nível sexual, a partir do sexto mês, as taxas de stress e ansiedade causadas pelo contacto íntimo começam a aumentar e, a médio e longo prazo, podem traduzir-se no aparecimento de disfunções sexuais”, explica Vânia Costa Ribeiro, ginecologista e especialista em procriação medicamente assistida no IVI Lisboa.

Especificamente, nos homens, é mais comum encontrar alterações na ereção ou ejaculação precoce. Nas mulheres, há uma diminuição do desejo, incapacidade de orgasmo ou mesmo desconforto ou dor devido ao stress que o ato pode gerar, bem como uma diminuição na resposta sexual em ambos. Isto porque, nas tentativas para alcançar uma gravidez, especialmente a médio e longo prazo, o encontro sexual é cada vez mais mecânico e planeado em torno da ovulação, o que causa uma perda progressiva da libido e ansiedade por antecipação.

“O desejo é uma resposta sexual humana, na qual intervém o sistema parassimpático, que regula comportamentos que dependem do ser humano, ou seja, comportamentos involuntários. O problema surge quando acrescentamos a imposição de fazer sexo, por assim dizer, a algo que é naturalmente instintivo. É aqui que entra em jogo o ramo simpático, que regula os voluntários. E esses dois sistemas funcionam como as comportas de um rio, eles não podem estar ativos ao mesmo tempo se quisermos que eles funcionem. E o que às vezes acontece é que acabamos por ter cada vez mais relações sem desejo, com tudo o que isso implica, tanto a nível da resposta sexual como a nível mental e afetivo”, acrescenta Vânia Costa Ribeiro.

Evitar falar sobre o assunto só vai piorar a situação e afastar cada vez mais o casal. E quando chega o momento em que a dinâmica sexual se deteriorou, ou até desapareceu, o casal precisa de dar um passo em frente e procurar a ajuda de um especialista.

O apoio psicológico será útil para delinear as melhores estratégias para ajudar os casais a superar dificuldades. Após uma avaliação da situação inicial, o especialista ajudará a “reprogramar” esta área da intimidade do casal, separando-a da finalidade reprodutiva e afastando sentimentos de ansiedade, aconselha o IVI.

“Muitos casais já nos chegam com uma mochila de exaustão emocional depois de meses de tentativas falhadas. Estamos a falar de um contexto em que as relações sexuais podem tornar-se sinónimo de medo do fracasso ou de dor emocional. E é por isso que é essencial ter ferramentas para desbloquear essas sensações e reativar o desejo”, sublinha a especialista.

Muitos casais com problemas de fertilidade olham para a relação sexual como um meio para atingir um fim. Para mudar essa mentalidade, é necessário promover a comunicação entre os casais, além de encontrar momentos em que essa abordagem possa ser promovida (mesmo sem ter em conta os dias férteis da mulher).

“Sentir essa proximidade e conexão novamente é fundamental para que o desejo não se dilua no casal que está a passar por um momento difícil. Não nos esqueçamos que uma vida sexual satisfatória aumenta a endorfina e melhora o humor e a autoestima. Ao nível do casal, é muito benéfico tanto para a relação sexual como afetiva. Devemos olhar para a sexualidade como um todo e não nos focarmos apenas na função reprodutiva. E, claro, o sexo em si é um grande aliado para melhorar e recuperar a comunicação nos casais”, conclui.

PR/HN

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