Uma equipa de investigadores da Universidade RPTU Kaiserslautern-Landau, no sudoeste da Alemanha, alcançou um avanço significativo na compreensão dos mecanismos moleculares que permitem às células cancerígenas proliferar, apesar de alterações na sua composição genética. Este estudo, publicado recentemente na prestigiada revista EMBO Journal, pode representar um marco importante no desenvolvimento de terapias oncológicas mais eficazes e direcionadas.
A investigação, liderada pela Professora Zuzana Storchová, responsável pelo Departamento de Genética Molecular da RPTU, focou-se numa característica genética comum nas células cancerígenas conhecida como aneuploidia. Este fenómeno ocorre quando uma célula possui um conjunto alterado de cromossomas.
Surpreendentemente, cerca de 90% dos tumores em pacientes oncológicos são compostos por células aneuploides, frequentemente com mais do que um cromossoma afetado simultaneamente. Esta descoberta levantou uma questão fundamental na investigação do cancro: como é que as células cancerígenas não só sobrevivem, mas também proliferam com esta carga genética adicional, quando a aneuploidia normalmente retarda o crescimento de células saudáveis e muitas vezes leva à morte celular?
Para responder a esta questão, a equipa da Professora Storchová, incluindo o doutorando Jan-Eric Bökenkamp, desenvolveu um modelo laboratorial único. Eles criaram geneticamente células com uma cópia extra de um cromossoma e observaram o seu comportamento ao longo do tempo. “Permitimos que as células stressadas proliferassem durante um período mais longo e descobrimos que elas cresciam significativamente melhor após várias semanas”, explicou Bökenkamp.
Utilizando métodos avançados de biotecnologia e bioinformática, como sequenciação de ADN de nova geração e espectrometria de massa, os investigadores identificaram três mecanismos principais através dos quais as células cancerígenas se adaptam à presença de cromossomas extra:
- Aumento da estabilidade do genoma: As células aumentam o número de fatores de replicação e reparação do ADN, reduzindo simultaneamente a degradação dos produtos génicos.
- Aumento da atividade do fator FOXM1: Este fator está envolvido no crescimento e divisão celular.
- Perda seletiva de ADN: As células perdem partes específicas do ADN extra que codificam genes supressores de tumores, mantendo as partes que codificam genes promotores do crescimento.
Para validar a relevância clínica das suas descobertas, a equipa analisou dados públicos de observação de milhares de tumores com células aneuploides de pacientes oncológicos em bases de dados dos Estados Unidos, comparando-os com os dados experimentais do seu modelo de células aneuploides.
A Professora Storchová enfatizou a natureza única do seu estudo: “A nossa investigação é pioneira, pois somos o primeiro laboratório a desenvolver e analisar um sistema modelo para estudar a adaptação de células cancerígenas humanas à presença persistente de certos cromossomas extra”.
Estas descobertas abrem novas possibilidades para o desenvolvimento de abordagens terapêuticas e medicamentos inovadores. Os investigadores sugerem que as futuras terapias poderiam visar especificamente os processos moleculares que permitem às células cancerígenas crescer e multiplicar-se, apesar de extensas alterações genómicas.
Em particular, o fator FOXM1 surge como um alvo promissor para o desenvolvimento de novos fármacos anticancerígenos, tendo o seu potencial já sido objeto de investigação nos últimos anos.
Esta descoberta representa um passo significativo na compreensão dos mecanismos subjacentes ao crescimento e proliferação das células cancerígenas, oferecendo novas perspetivas para o desenvolvimento de terapias mais eficazes no combate ao cancro.
NR/HN/Alphagalileo
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