A recente decisão de distribuir produtos como fraldas, cuecas e pensos de incontinência, bem como dispositivos menstruais, nos centros de saúde, nomeadamente nas Unidades de Saúde Familiar (USF), tem gerado perplexidade entre profissionais de saúde e utentes. Paralelamente, a transferência de competências como a vacinação e o tratamento de “infeções ligeiras” para as farmácias coloca em causa a eficácia e a organização do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
A medida, que visa disponibilizar gratuitamente estes produtos à população, foi implementada sem que os centros de saúde estivessem preparados para a logística pesada que implica. A falta de espaço adequado, equipamentos como leitores de códigos de barras e pessoal especializado para gerir a distribuição tem perturbado significativamente a atividade das USF. Estas unidades, que já enfrentam limitações em recursos humanos e infraestruturas, veem-se agora sobrecarregadas com tarefas que não se enquadram nas suas funções essenciais.
Por outro lado, a transferência de serviços como a vacinação para as farmácias tem levantado dúvidas sobre a capacidade destas para assumirem tais responsabilidades. Dados indicam que as metas de vacinação contra a gripe só foram atingidas nos grupos populacionais vacinados exclusivamente nos centros de saúde, o que demonstra a eficácia deste modelo. A dispersão da logística pelas farmácias resultou em resultados aquém do esperado, colocando em risco a saúde pública.
A USF-AN (Unidades de Saúde Familiar – Associação Nacional) tem sido veemente na crítica a estas medidas, defendendo que a principal missão das USF é a prestação de cuidados de saúde primários, prevenção de doenças e acompanhamento clínico. A distribuição de produtos não farmacológicos, como fraldas e pensos menstruais, deve ser assegurada por outras instituições ou mecanismos de apoio social, e não pelos centros de saúde.
A associação alerta ainda para o facto de a maioria das USF não dispor de assistentes operacionais, sendo este papel desempenhado por empresas de outsourcing, o que agrava as dificuldades logísticas. A falta de armazéns adequados e de pessoal para gerir a distribuição destes produtos compromete a qualidade do serviço assistencial prestado aos utentes.
A Direção da USF-AN reitera que a prioridade das USF deve continuar a ser a prestação de consultas, promoção da saúde, prevenção de doenças e gestão de patologias crónicas. A atribuição de tarefas como a distribuição de produtos não médicos desvia recursos essenciais e coloca em causa o funcionamento adequado destas unidades.
Esta reestruturação do SNS, que parece desviar as USF das suas funções primárias e transferir responsabilidades para as farmácias, levanta sérias questões sobre o futuro do sistema de saúde em Portugal. A falta de clareza sobre os objetivos e a ausência de um plano robusto para implementar estas mudanças têm gerado preocupação entre profissionais e utentes, que exigem esclarecimentos urgentes.
PR/HN/MM
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