Joana Figueiredo, Presidente do Conselho Fiscal e Disciplinar do Sindicato dos Médicos Dentistas do Setor Público e Social Português

A medicina dentária nos setores público, social e privado em regime de complementaridade

05/16/2025

As doenças orais afetam cerca de 3,5 milhões de indivíduos, sendo uma das principais causas globais de morbilidade, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2022. A dificuldade ou ausência de acesso aos tratamentos contribuem para o aumento do absentismo na escola e no trabalho, com consequente redução da produtividade das empresas, afetando negativamente a qualidade de vida dos indivíduos e o bem-estar geral da sociedade.

As mais recentes políticas de saúde oral e estratégias globais definidas pela OMS e pela Federação Dentária Internacional (FDI) têm como objetivo o alcance de uma Cobertura Universal da saúde oral até 2030, de acordo com o “Relatório Global do Estado da Saúde Oral”, publicado pela OMS em 2022.

Segundo o Perfil de Saúde do País 2023, elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e pelo Observatório Europeu de Sistemas e Políticas da Saúde em cooperação com a Comissão Europeia, 8,2 % da população portuguesa referiu ter necessidades de cuidados dentários não satisfeitas em 2022, uma das percentagens mais elevadas na União Europeia. As razões apontadas foram sobretudo os elevados custos, o que reflete a falta de cobertura de cuidados dentários no âmbito do Serviço Nacional de Saúde (SNS) para a maioria da população.

De acordo com o barómetro da saúde oral 2024, elaborado pela Ordem dos Médicos Dentistas (OMD) 30% dos portugueses aponta a falta de dinheiro como motivo para não realizar consultas de medicina dentária e 66% da população desconhece a existência desses serviços no SNS.

Em Portugal, o setor público assegura o acesso a cuidados de saúde oral essenciais, gratuitamente ou a preços reduzidos, para populações mais vulneráveis, como crianças, idosos ou indivíduos com necessidades especiais. O setor social que inclui organizações sem fins lucrativos disponibiliza serviços de saúde oral que complementam o SNS, proporcionando cuidados médico-dentários de qualidade e promovendo o bem-estar social. Foca-se numa abordagem mais inclusiva, satisfazendo necessidades específicas de determinados grupos sociais, como comunidades em risco ou indivíduos em situação de exclusão social, colmatando lacunas de acessibilidade.

No setor privado, a Medicina Dentária é geralmente disponibilizada como um serviço pago, com os profissionais e clínicas concorrendo entre si para atrair utentes. A complementaridade pode ocorrer por intermédio de parcerias com os setores público ou social, através de acordos ou convénios que possibilitem uma cobertura mais rápida e acessível para a população. Os planos de saúde oral oferecidos pelas seguradoras e o Programa Nacional de Promoção de Saúde Oral (PNPSO) são exemplos disso.

A complementaridade entre os setores público, social e privado da Medicina Dentária tem diversos benefícios:

  • Acessibilidade universal: cuidados de saúde oral de qualidade para todos, independentemente da sua localização geográfica ou condição socioeconómica.
  • Eficiência e sustentabilidade: prestação mais eficiente e direcionada, sem duplicação de esforços entre os setores, com otimização de recursos e redução do desperdício.
  • Qualidade dos cuidados: melhorada pela colaboração e partilha de conhecimentos entre os diferentes profissionais, no respeito e cumprimento das boas práticas.
  • Resposta às necessidades da população: adaptação dos serviços a cada comunidade específica, garantindo cuidados culturalmente sensíveis e relevantes.
  • Equidade: redução das desigualdades no acesso à saúde oral, proporcionando cuidados a grupos mais desfavorecidos ou em situações de risco.

O regime concorrencial potencializa a competição por utentes e recursos entre os setores público, social e privado. Os riscos inerentes são a fragmentação dos serviços no acesso aos cuidados de saúde oral, causando desigualdades entre os indivíduos mais vulneráveis, com exclusão de alguns grupos populacionais e o incentivo à prestação de serviços de baixa qualidade ou desnecessários, em detrimento da saúde global dos utentes.

O caminho para a saúde oral em Portugal deve assentar na complementaridade entre os diferentes setores, com um modelo que garanta o acesso universal e a qualidade dos cuidados. A realização de uma parceria público-privada com os setores social e privado poderia funcionar através da emissão de um cheque-dentista Reabilitação, emitido pelos médicos dentistas do SNS e que permitisse a reabilitação dos doentes quer no setor social, quer no privado.

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