Programas de combate à malária em África em colapso após cortes “catastróficos” dos EUA

3 de Junho 2025

O congelamento do financiamento dos EUA à luta contra a malária está a paralisar programas de prevenção em África e a travar avanços em investigação genética, ameaçando décadas de progresso no controlo da doença e na inovação científica.

O abrupto corte de financiamento dos Estados Unidos à iniciativa global de combate à malária está a causar uma crise sem precedentes em África, com consequências graves tanto para a saúde pública como para a investigação científica. A decisão, tomada no âmbito das reformas do Presidente Donald Trump, levou à suspensão do President’s Malaria Initiative (PMI), um programa de cinco anos que apoiava 15 países africanos na luta contra a doença.

Modelos internos da USAID, divulgados recentemente, apontam para um cenário alarmante: o colapso do PMI poderá resultar em 18 milhões de novos casos e 160 mil mortes adicionais por ano. Os efeitos já se fazem sentir no terreno, com relatos de racionamento de testes rápidos no Uganda, interrupção da distribuição de redes mosquiteiras na Etiópia e uma crescente escassez de medicamentos essenciais em vários países, alguns dos quais têm reservas para menos de três meses. Para além do impacto humano, a malária custa anualmente 12 mil milhões de dólares à economia africana devido à perda de produtividade.

A ameaça não se limita à saúde. O corte de fundos põe em risco avanços científicos cruciais, nomeadamente na área da investigação genética. O sequenciamento dos genomas do Plasmodium falciparum e do vivax, no início dos anos 2000, revolucionou a luta contra a malária, permitindo identificar genes e mecanismos de resistência. Hoje, a integração de dados genéticos do parasita, do ser humano e do mosquito é vital para monitorizar surtos e desenvolver medicamentos de precisão. No entanto, estes progressos dependem de financiamento contínuo e colaboração internacional.

A inteligência artificial (IA) está a transformar o combate à malária, desde a previsão de surtos através da análise de dados climáticos e de mobilidade, até ao desenvolvimento de diagnósticos automáticos e à modelação de proteínas para acelerar o desenho de novos fármacos. Contudo, persistem desafios éticos, como o risco de enviesamento dos modelos e a questão do acesso equitativo a novas terapias.

Apesar das dificuldades, a inovação continua: em países como a Zâmbia, estão a ser testadas soluções ecológicas, como pellets bacterianos para eliminar larvas de mosquito, e mosquitos geneticamente modificados para interromper a transmissão do parasita. As vacinas R21 e RTS,S já estão a ser implementadas em 19 países africanos, com resultados promissores na redução de casos graves.

A crise atual expõe a necessidade de parcerias genuínas e de capacitação local, evitando práticas de “ciência colonial”. O envolvimento de investigadores e comunidades africanas é fundamental para garantir soluções sustentáveis e eficazes. Alguns países, como a Nigéria, já começaram a investir recursos próprios para compensar a retirada dos fundos americanos, mas especialistas alertam que, sem uma resposta global urgente, décadas de progresso poderão ser perdidas.

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NR/HN/ALphaGalileo

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