João Pereira Martins fala sobre DPOC: “A maior negligência foi minha”

11/16/2021
Foi aos 58 anos que, o antigo Tenente-Coronel, recebeu a notícia de que estaria dependente do oxigénio para poder viver. Fumador desde a adolescência, João Pereira Martins admite que nunca valorizou os primeiros sinais da doença e hoje conta na primeira pessoa as graves sequelas que o tabaco deixou na sua saúde. “Quando saio de casa tenho período limitado de oxigénio”. Apesar das limitações que enfrenta, a sua atitude é a de alguém que aprecia cada instante que a vida lhe proporciona.  

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HealthNews (HN)- Quando e como foi diagnosticada a doença?

João Pereira Martins (JPM)- Foi há sete anos. Durante a noite comecei a sentir-me muito mal e a minha mulher disse para irmos para o Hospital das Forças Armadas. Consegui chegar vivo. Entrei nas urgências e tive uma paragem cardiorrespiratória. Fui entubado e estive internado durante mais de um mês.

HN- O diagnóstico foi realizado numa fase em que a doença já se encontrava numa fase avançada. Como viveu esse momento?

JPM- Eu já me sentia com alguns problemas respiratórios e tinha os tornozelos muito inchados mas não ligava e não queria saber. Já tinha ido a umas consultas mas nunca me falaram de DPOC, os médicos só me receitavam um ou dois broncodilatadores. 

Quando tive consciência daquilo que se estava a passar, fiquei triste comigo próprio e também sem saber como seria a minha vida futura. Depois de me ter sido dada a alta, fui para casa com oxigénio e, a partir desse momento, nunca mais pude estar sem oxigénio.  

HN- Olhando para trás não considera que houve negligência por parte dos médicos que não souberam associar as suas queixas à DPOC?

JPM- Não diria tanto. Eu não me dirigia ao médico com frequência. Só ia quando me sentia bastante mal e como na altura já estava na reserva não era acompanhado. A maior negligência foi minha e eu tenho plena consciência disso. Fui fumador durante mais de trinta anos. 

HN- E nunca lhe passou pela cabeça as consequências que o tabagismo poderia ter na sua saúde?

JPM- Quando estava no serviço fazia exames regularmente e nunca foi detetada nenhuma anomalia alarmante e, por isso, nunca liguei muito. Quando cheguei ao fim da minha carreira e vim para casa, a minha vida passou a ser inativa. Embora não fumasse, passava muito tempo sentado, a ver televisão, a ler e pouco me mexia. Tudo isso, acompanhado de alguma gripe ou uma pneumonia que eu não tratava imediatamente, piorou a minha situação. Eu só ia ao hospital quando não me podia praticamente mexer. 

HN- Que tipo de tratamento foi indicado?

JPM- Primeiro, estou dependente do oxigénio. Tomo vários medicamentos para normalizar a tensão, para o funcionamento dos rins, para a circulação do sangue e também para o estômago. A medicação é uma pequena ajuda que facilita o trabalho dos meus pulmões e do meu coração. 

HN- Quais as limitações que enfrenta no seu quotidiano devido à doença?

JPM- A dependência do oxigénio é a principal. Não posso ir a lado nenhum sem levar a máquina comigo e, se for mais do que um dia, tenho que transportar a máquina que utilizo durante o dia e outra que uso à noite. 

Quando saio de casa tenho um período limitado de oxigénio, pelo que não posso andar muito livremente. 

HN- Foi difícil a sua adaptação ao oxigénio?

JPM- No início tinha vergonha de sair à rua com o aparelho respiratório… Não queiram sentir aquilo que sentimos quando olham para nós. 

HN- E qual o papel que a sua mulher tem tido ao longo destes anos?

JPM- Se não fosse a minha mulher e o meu filho certamente não estaria vivo. Foi a minha mulher que me disse, naquele 04 de fevereiro de 2014, para irmos ao hospital. Desde que vim para casa que lhe tenho dado muito trabalho. Não posso fazer grandes esforços. É a minha mulher que me atura, me anima e ajuda em tudo o que pode. Ela é o meu sustento. Muitas vezes lhe digo: se tu um dia morres, eu três dias depois morro porque não me aguento sozinho. 

HN- A pandemia teve algum impacto na sua saúde física e mental?

JPM- Já não faço tanto exercício como fazia. Antigamente ia três ou quatro vezes por semana ao ginásio e fazia hidroginástica. Hoje em dia já não vou por causa da pandemia mas, para compensar, comprei uma passadeira cá para casa. Faço mais de mil metros. 

Na verdade, já não saio muito de casa. Antigamente era eu que fazia as compras mas atualmente a minha mulher não me permite que vá ao supermercado. 

HN- Sem ser a atividade física há alguma outra atividade que o motive?

JPM- Comecei a cantar. Estou num coro de doentes respiratórios chamado ‘Respirar a Música’, um projeto que começou em 2019. Durante a pandemia mantivemos os nossos ensaios através de plataformas online, todas as quintas-feiras à tarde. Temos um maestro profissional contratado pela Linde que faz exercícios respiratórios e vocais connosco. No coro, criamos músicas e cantamos todos os géneros musicais. 

HN- Viveu na pele as sequelas do consumo de tabaco. Que mensagem deixa a todas as pessoas que desvalorizam os impactos do tabagismo na saúde?

JPM- Nunca fumem e lembrem-se que o prazer que eventualmente podem sentir que o tabaco vos proporciona, é um prazer falso. É algo que não compensa o impacto negativo a longo prazo que o ato de fumar poderá trazer. 

 

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Estudante do 2º ano do Curso de Especialização em Administração Hospitalar da ENSP NOVA; Vogal do Empreendedorismo e Parcerias da Associação de Estudantes da ENSP NOVA (AEENSP-NOVA); Mestre em Enfermagem Médico-cirúrgica; Enfermeiro especialista em Enfermagem Perioperatória na ULSEDV.

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