A educação terapêutica é uma área fundamental da Medicina e “a diabetes tem aqui um papel pioneiro e mais avançado do que qualquer outra doença, pois foi a primeira a colocar a educação como um ato fundamental”, afirmou José Manuel Boavida nas 26 Jornadas Nacionais Patient Care, realizadas entre 7 e 8 de abril no Centro de Congressos de Lisboa.
Aquilo que hoje se espera de uma pessoa com uma doença crónica «é todo um tratado de Medicina», acrescentou o presidente da APDP na sua intervenção sobre “Educação terapêutica da pessoa com diabetes. Avaliação da situação em Portugal”. Nas doenças crónicas «95% dos cuidados não estão nas nossas mãos mas nas mãos dos doentes. Doença e pessoa não são indissociáveis e temos de as conseguir integrar».
Em 1924, pouco tempo após a descoberta da insulina, o “New York Times” interrogava-se: “quem será responsabilizado ao prescrever insulina a analfabetos?”. Em Portugal, o Prof. Pulido Valente escrevia, em 1925, na sua obra “Lições sobre diabetes”: “mais do que em qualquer doença o médico será aqui o educador. A sua função é menos tratar o doente do que ensiná-lo a tratar-se ele próprio”.
“A função de tratar o doente, que é aquela que os profissionais de saúde mais assumem, tem que ser complementada com a atividade do próprio doente, no cumprimento, na adesão, na compreensão dos objetivos médicos e dos objetivos de saúde”, defendeu o presidente da APDP. “A educação é um investimento e não uma tomada de tempo dos profissionais de saúde, como é vista muitas vezes pelas autoridades de saúde. Necessitamos de dominar a educação para atingir todo o nosso potencial”.
Contudo, “não temos conseguido chegar onde poderíamos chegar”. Diversas meta-análises demonstram que os resultados, nomeadamente na adesão ao tratamento, “são insatisfatórios”.
“O grande problema é que a diabetes não é uma doença simples de tratar» e as doenças crónicas, “sendo controladas pelo próprio doente, exigem um papel diferente do médico e do paciente”.
“Somos formados nas faculdades para tratar a doença e esquecemo-nos do mundo subjetivo, daquilo que são as ideias pré-concebidas do doente em relação ao diagnóstico, ao tratamento, a experiência vivida, as expetativas, os medos e tudo aquilo que constitui o seu dia-a-dia”, explicou José Manuel Boavida, chamando a atenção para a necessidade fundamental de “fazer o doente descrever as dificuldades, reformulá-las, analisar as causas, elaborar estratégias e definir objetivos”.
Em Portugal “não existe qualquer planeamento ou financiamento sobre educação terapêutica”, lamentou. “Quando se fala em consultas fala-se em observação do doente e tempos para a prescrição mas nunca se fala em tempos para a educação. Está dependente da disponibilidade e da formação de cada um de nós, da nossa experiência e da nossa aprendizagem”.
Neste contexto, o especialista assinalou que “a experiência da APDP continua a ser muito isolada, mas é evidente que existem outras por todo o país, por múltiplos serviços, que tentam continuar esse caminho”.
A consulta de diabetes nos Cuidados de Saúde Primários “constituiu um passo relevante com a criação de equipas com enfermeiros mais dedicados, mas foi uma educação não estruturada, aleatória, individualizada e ocasional”.
O projeto ABC da Diabetes, “proposto por mim na Direção-Geral da Saúde para que todo o doente com um diagnóstico de diabetes tivesse imediatamente seis aulas sucessivas de educação, de caráter semanal, sobre diabetes e o seu controle, nunca foi aprovado”.
“É preciso continuar a criar centros de educação em diabetes reconhecidos pela International Diabetes Federation ”, referiu José Manuel Boavida, apontando que “a educação precisa de ter múltiplas formas. Atividades mais lúdicas de nutrição, de acompanhamento da atividade física ou as atividades ao ar livre, são todas elas fundamentais».
Texto de Adelaide Oliviera
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