Eram muitos, aos magotes, em grupos com mais gente do que aquela que é suposto agrupar-se em tempos de pandemia.
Curioso, desci à rua e fui atrás, a ver aonde iam. Aí a uns cinquenta metros de distância, dei comigo no largo da Junta de Freguesia, onde havia sido montada uma plateia, em jeito de anfiteatro romano, com as cadeiras alinhadas, coladas entre si, em grupos de cinco, separados uns dos outros por cerca de meio metro, de que a gente se servia como de corredor para se encaixar no amontoado.
E era mesmo um amontoado. Aí umas 250 almas, unidas para assistirem a um espectáculo de teatro experimental.
Sentei-me, o braço esquerdo a suportar o direito da vizinha da esquerda e o direito sobre uma peça de carne, cabeluda, de um qualquer brutamontes.
O tempo foi passando até que os altifalantes do espaço cénico, nos despertaram a todos, informando de que tratava de um espetáculo aprovado pela Direção Geral da Saúde, que tinha determinado como medida suficiente que os materiais, roupas e outros adereços utilizados na manifestação artística eram desinfetados antes e após cada espetáculo.
“Temos um Plano de Contingência, aprovado pela DGS”, insistia o mestre de cerimónias.
A tortura, porque foi de facto de tortura que se tratou durou cerca de 40 minutos, com tralha diversa distribuída ao público (de acordo com interpretação cénica, roupa ensanguentada de uma vítima de violência doméstica).
Fiquei aturdido. Então andoeu há quase um ano sem ver os especialistas que acompanham cada uma das minhas muitas comorbilidades, alegadamente devido ao risco associado; não tenho médico de família de carne e osso; só telefónico, pelo mesmo receio, e por esse país fora são permitidos espetáculos que não garantem um mínimo de segurança aos que a eles assistem?
Felizmente o povo é consciente. No dia a seguir, quando regressei ao hotel, tinha o quarto por arrumar. Protestei.
“A arrumadeira recusa-se a arrumar com medo do COVID. Já está assim desde março”, informou-me a gerente do estabelecimento.
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