Uma simples alteração no sistema informático do Serviço Nacional de Saúde (SNS) pode revolucionar o diagnóstico e tratamento da Doença Renal Crónica (DRC) em Portugal. Um grupo de 17 especialistas em Nefrologia, Medicina Geral e Familiar e Patologia Clínica, no âmbito do programa NEPHRODetect, entregou às autoridades de saúde três recomendações cruciais, entre as quais a criação de dois códigos informáticos que permitirão rastreios mais rápidos e eficientes.
A DRC, que afeta 9,8% da população adulta portuguesa, é uma patologia silenciosa e subdiagnosticada, com mais de 98% dos doentes a desconhecerem a sua condição. Atualmente, cerca de 20 mil pessoas estão em diálise, a fase terminal da doença. Para combater este cenário, os especialistas propõem a introdução de dois novos códigos no sistema informático do SNS, que facilitarão a prescrição e emissão de resultados de exames essenciais ao diagnóstico: a Taxa de Filtração Glomerular estimada (TFGe) e a albuminúria (RAC).
Atualmente, o sistema de saúde português não dispõe destes códigos específicos, o que dificulta a uniformização dos diagnósticos. Com a alteração proposta, os médicos de família terão acesso a ferramentas que permitirão não só um diagnóstico mais preciso, mas também um registo padronizado no Registo de Saúde Eletrónico (RSE). Edgar Almeida, ex-diretor do Serviço de Nefrologia do Hospital Beatriz Ângelo e presidente da Sociedade Portuguesa de Nefrologia, explica que a TFGe e a RAC são fundamentais para avaliar o risco de progressão da doença e comorbilidades associadas.
Além dos códigos de prescrição, os especialistas recomendam a codificação da DRC na Classificação Internacional de Cuidados Primários (ICPC2) e a atualização das normas da Direção-Geral da Saúde (DGS). Atualmente, a DRC não possui um código único no sistema informático, ao contrário de outras doenças como a diabetes ou a hipertensão. Esta lacuna impede o conhecimento exato da dimensão do problema e dificulta o planeamento de estratégias eficazes.
A implementação destas medidas permitirá uma maior uniformização no diagnóstico e tratamento da DRC, independentemente da especialidade do médico ou da localização geográfica. Além disso, a deteção precoce da doença possibilitará a utilização de medicamentos modificadores de prognóstico, que podem retardar significativamente a progressão para diálise e reduzir a mortalidade.
O NEPHRODetect, que integra especialistas de diversas áreas, foi criado para analisar as orientações internacionais sobre a DRC e propor um documento de consenso para Portugal. As recomendações já foram partilhadas com as autoridades de saúde e publicadas na revista Acta Médica Portuguesa.
A DRC tem um impacto significativo na qualidade de vida dos doentes e representa um custo elevado para o sistema de saúde. A implementação destas medidas poderá não só melhorar o prognóstico dos doentes, mas também reduzir a carga económica associada à doença. Com uma maior consciencialização e ferramentas adequadas, Portugal poderá inverter o cenário atual, onde se destaca como o país da União Europeia com o pior desempenho no combate à DRC.
PR/HN/MM
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