Óscar Gaspar Presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada (APHP) Secretário de Estado da Saúde de 2009 a 2011

Saúde cada vez mais próxima… Ainda que ao longe

06/16/2020

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Saúde cada vez mais próxima… Ainda que ao longe

16/06/2020 | Opinião

Uma das implicações imediatas desta pandemia de COVID-19 foi a valorização da telemedicina.
É sabido que, só em Portugal, a afetação excecional de recursos para fazer face à crise sanitária obrigou, segundo os números oficiais, a que deixassem de ser feitas no SNS mais de 50 mil cirurgias, mais de 500 mil consultas de especialidade hospitalar e 800 mil consultas de cuidados de saúde primários.

Refira-se que, em cumprimento das orientações da Direção Geral de Saúde e também em consequência das regras de confinamento e os constrangimentos relacionados com a gestão das equipas, também os prestadores privados tiveram muito menos atividade do que seria expetável.

Médicos especialistas de diversas áreas têm vindo a alertar que os exames e meios de diagnóstico não efetuados em março, abril e maio colocam fortemente em risco a saúde de milhares de cidadãos, nomeadamente na área oncológica. A outro nível, também as associações de doentes com diabetes, hipertensão, etc têm vindo a manifestar a sua preocupação com as lacunas.

Ora, a verdade é que a situação teria sido ainda muito mais grave se não se tivesse recorrido a novas plataformas para interagir e cuidar dos cidadãos. Note-se que várias entidades acionaram e promoveram soluções específicas, que passaram, por exemplo, pela avaliação de sintomas online, pela disponibilização de consultas por telefone ou videochamada e o apoio e acompanhamento por via remota.

Pelas conclusões que já é possível tirar, nas dezenas de milhares de teleconsultas realizadas pelos hospitais privados nos últimos meses, as especialidades de Medicina Geral e Familiar, Dermatologia, Pediatria, Imunoalergologia e Psiquiatria foram as que tiveram maior procura, com vários milhares de médicos a aderirem e um nível de satisfação declarada dos doentes bastante elevada. Numa publicação recente da OCDE é dito que: “A telemedicina fornece uma opção segura para pacientes pré-triagem e para facilitar seu monitoramento remoto. Essas opções garantem o acesso à assistência a cidadãos sob confinamento e minimizam o risco de maior contágio entre cidadãos e profissionais de saúde.”

Foi identificado por diversos setores que as novas circunstâncias provocadas pelo “lockdown” permitiram implementar metodologias que andavam há anos em fase de preparação. Na saúde as tecnologias digitais têm um enorme potencial, mas, por diversas circunstâncias, nem sempre têm sido adotadas de forma célere. A verdade é que podemos falar numa verdadeira revolução digital na saúde, tão diversas são as áreas e profundas as implicações que pode ter na obtenção dos melhores resultados em saúde para os cidadãos.

Desde o suporte à decisão (interpretação de meios de diagnóstico, inteligência artificial aplicada ao rastreio e diagnóstico, etc) à medicina personalizada e à cirurgia robotizada, passando pela (auto)monitorização de sinais vitais, a realidade aumentada, a impressão 3D, a integração online de serviços.

A velocidade de transmissão de dados e o big data permitem hoje o que seria inimaginável há 10 anos
O digital pode (e deve) melhorar as condições de acesso, a qualidade da prestação e a geração de valor em saúde, mas também é uma poderosa ferramenta para a sustentabilidade dos sistemas de saúde. Por exemplo, a consultora McKinsey em parceria com a BMC (German Managed Care Association) concluiu que os provedores e seguradoras de saúde alemães poderiam economizar até 12% de seus custos, ou 34 mil milhões de euros, apenas em 2018, se o sistema de saúde alemão estivesse totalmente digitalizado. Este novo mundo digital vai também obrigar a repensar formas de gestão e algumas estruturas existentes, mas este apelo a servir mais e melhor não tem ponto de retorno.

Claro que a discussão do digital suscita questões, algumas das quais remetem para as garantias de privacidade, controlo sobre os dados pessoais e outras para o acesso. A este respeito, aconselho um artigo recentemente publicado pelo Politico (https://www.politico.eu/article/unequal-access-in-digital-health-cares-coronavirus-boom/), que enquadra o assunto em termos do exercício da nossa cidadania europeia e dos que os diversos Estados Membro estão em condições de oferecer: desde constrangimentos tecnológicos até ao facto de aparentemente as novas tecnologias poderem ser mais benéficas exatamente para quem tem menos acesso a elas (por questões de idade, literacia, etc). Também aqui se conclui que o digital e a gestão dos dados serão cruciais para melhorar os outcomes em saúde.

Um último ponto de reflexão para realçar um texto, recentemente publicado por D. José Tolentino de Mendonça em que, a propósito da Educação, refere que alguns pensadores alertam para uma certa tendência para que funcione tudo online, que “se troquem apenas mensagens digitais e que onde for possível as máquinas substituam todo o contacto entre os seres humanos”.

Mutatis mutandis, por maioria de razão, a saúde será sempre uma área de profunda relação humana, em que a dignidade e o caráter único de cada cidadão devem ser reconhecidos e respeitados e a relação com os profissionais de saúde é um elemento vital (em plena aceção da palavra) no processo de acompanhamento, tratamento e recuperação da pessoa. Dizendo de outra forma: venham as máquinas, tiremos delas o melhor partido, mas coloquemo-las no seu devido lugar, ao serviço das pessoas.

Pela parte dos hospitais privados, o nosso compromisso é de continuar a investir, no sentido de modernizarmos os serviços, tornarmos acessíveis a todos as mais modernas tecnologias e a abordagens. Pelo acesso, pelo conforto, pela transdisciplinaridade, pela procura das melhores práticas, pela qualidade comprovada na prestação dos cuidados, é também pelo digital que vamos ser capazes de melhorar as condições de saúde dos portugueses.

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