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Um ano de pandemia
Assinalamos hoje um ano de pandemia. A dia 2 de março 2020 surgiram os primeiros casos de Covid-19 em Portugal. Desde então, passámos por uma profunda alteração em todas as dimensões das nossas vidas. O mundo pandémico revelou-se recheado de incertezas, a evolução da ciência e conhecimento, em conjunto com a alterações naturais do vírus, causaram um conjunto de decisões e declarações muitas vezes contraditórias. Esta dinâmica claramente não ajudou na transmissão de uma mensagem clara e uniforme. Agora que sabemos mais sobre as dinâmicas do vírus, temos obrigação de comunicar melhor e ter uma gestão eficaz da pandemia.
A pandemia tem uma dimensão objetiva e outra subjetiva. Ambas têm de ser geridas. Em muitas ocasiões, os decisores políticos foram atrás da perceção subjetiva. É necessário antecipar a curva pandémica e comunicar de forma eficaz para influenciar a perceção subjetiva da pandemia. Aprendemos que, caso a situação comece a deteriorar-se, é preferível antecipar medidas, que produzem efeito de forma rápida, permitindo também voltar à normalidade de forma mais célere, que perpetuar medidas de curto alcance que nem controlam a pandemia nem permitem recuperar a economia.
Por falar na economia, por esta altura já deveria ser evidente que não há uma verdadeira escolha entre saúde e economia. Não devemos cair nesta falsa dicotomia, não há uma boa economia com pessoas doentes, nem saúde com economia pobre. A economia e a saúde possuem profundos vasos comunicantes, as raízes da saúde são os determinantes sociais, que são os principais preditores do estado de saúde das populações. Ter a pandemia controlada, significa melhorar a atividade económica, recuperar consumo e gerar empregos.
Outra falsa escolha, muitas vezes repetida, trata-se da opção entre realizar atividade programada ou combater a pandemia. Novamente, é uma a questão que é apresentada nos termos errados. Não se trata de uma escolha, o descontrolo da pandemia levou a que não fosse possível realizar as restantes atividades por falta de recursos. A receita é semelhante, é preciso controlar a pandemia de forma a criar condições tendo em vista a recuperação da atividade programada. Em 2020 ficaram por realizar 115 mil cirurgias, no mês de janeiro este número agravou em 18 mil. A magnitude do problema é enorme e cresce a cada semana. É necessário um programa sério, com financiamento adequado e recursos humanos, de forma a ser possível dar resposta a este problema de saúde pública.
Os equívocos do Natal não se podem repetir pela Páscoa. Problemas de comunicação, gestão errada de expectativas, associada a um aumento da circulação novas variantes e uma considerável pressão hospitalar, devem impor cautelas numa época tradicionalmente utilizada para reencontros familiares. O desconfinamento tem de ser bem planeado e comunicado, com indicadores objetivos e facilmente percetíveis por todos nós. O conhecimento das dinâmicas de transmissão do vírus, aliado ao sistema de vigilância epidemiológica, permite estratificar o país em zonas de risco e reabrir os setores com menor potencial de transmissão.
Dentro das condicionantes conhecidas, a vacinação decorre a um bom ritmo. Em breve teremos uma quarta vacina aprovada, a da Johnson, que apenas requer uma administração e não precisa de uma exigente cadeia de frio. Terá a vantagem de tornar mais célere a campanha de vacinação. Quando for possível ter os grupos prioritários vacinados, apesar de estarmos ainda longe da imunidade de grupo, estaremos com maior resiliência e segurança para reabrir o país. Não podemos obliterar o impacto que as vacinas têm na saúde global. Temos de continuar a pugnar para que as vacinas sejam um bem público global, caso contrário, corremos o sério risco de criar bolsas de circulação e mutação do Sars-CoV-2 que irão certamente fazer ricochete nos países ricos.
Estamos a entrar na última fase da pandemia, é altura de planear os próximos desafios a curto e médio prazo na saúde. O plano nacional de saúde 2021-2030 está atrasado assim como o plano de saúde mental, precisamos urgentemente deste planeamento estratégico. A atividade programada é uma verdadeira bomba relógio e a pandemia acentuou as vulnerabilidades da população. É preciso uma ação concertada sobre os determinantes sociais de forma a melhorar a equidade em saúde. A situação pandémica tem vindo a melhorar, temos bons números do índice de transmissão e de incidência. Precisamos de manter estes bons indicadores até atingirmos a imunidade de grupo.
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