‘São João’ no Porto fez cirurgia “potencialmente curativa” de cancro do pâncreas

20 de Maio 2021

Um doente com cancro do pâncreas classificado como inoperável e já encaminhado para cuidados paliativos foi “resgatado” pelo Hospital de São João, no Porto, e submetido a uma cirurgia “potencialmente curativa”, disse esta quinta-feira à Lusa o cirurgião.

“O doente irá agora ser acompanhado, mas já entrou no campo das possibilidades de cura. Quando chegou ao nosso hospital estava no campo do tratamento paliativo. Agora, está a caminho do Algarve” de onde é originário, disse Humberto Cristino, cirurgião do Centro de Referência de Cancro Hepatobilio-Pancreático do Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ).

Segundo o cirurgião, “os tumores do pâncreas localmente avançados com envolvimento do tronco celíaco são muitas vezes considerados inoperáveis”.

No entanto, “atualmente e envolvendo uma abordagem multidisciplinar a cirurgia pancreática de ressecção, com a remoção completa do tumor, é o único tratamento potencialmente curativo dos tumores pancreáticos”, afirmou Humberto Cristino.

Esta intervenção, “conhecida como procedimento de Appleby, ou pancreatectomia distal com ressecção do tronco celíaca, tem sido cada vez mais realizada em centros de excelência selecionados, como é o caso do Hospital de São João, um dos únicos em Portugal a realizá-la”, explicou o médico.

Esta técnica cirúrgica “altamente complexa” de ressecção não é nova, foi desenvolvida para casos de cancro digestivo e, posteriormente, adaptada pelos japoneses ao cancro do pâncreas.

Foi depois replicada por outros países, incluindo Portugal, e representa uma nova esperança para os doentes classificados como inoperáveis.

“O cancro do pâncreas ainda hoje é uma doença muito ingrata e não existem outras formas de tratamento, além do cirúrgico. Esta técnica que agora chegou a Portugal permite resgatar os doentes considerados inoperáveis e em quimioterapia. Deste caso em particular, sabemos que biologicamente é um tumor favorável e acreditamos que este doente ainda vai ter uns bons anos pela frente”, sublinhou.

Contudo, embora este procedimento, realizado em centros de referência, permita trazer para o campo dos curáveis doentes que já tinham sido encaminhados para paliativos, o especialista acredita que “o tratamento futuro deste tumor não será o que o mundo faz atualmente”.

“Por exemplo, a hepatite C tinha uma mortalidade muito alta e hoje é tratável em 98% dos casos. Os tumores do pâncreas há 20 anos tinham uma sobrevida de 5% e hoje têm uma sobrevida de 5%, o que significa que não é este o caminho, mas esta ainda é a única esperança”, disse.

A cirurgia ao tumor do pâncreas tem vários graus de complexidade e, de acordo com essa complexidade, nem todas as instituições hospitalares estão habilitadas a realizá-la.

É por esse motivo que este cirurgião do CHUSJ apela a que os doentes com esta patologia considerados inoperáveis sejam reencaminhados para centros de referência.

“Com esta técnica, este foi o primeiro caso, mas temos feito procedimentos em doentes que foram rejeitados noutras instituições, com bons resultados”, sustentou.

Defende, por isso, que os hospitais “não devem ser donos dos seus doentes”, devem referenciá-los às instituições que têm capacidade de oferecer o mais avançado que existe para os tratar.

“Uma segunda opinião é muito importante, se o hospital considera que o caso está encerrado e não existe mais possibilidades, o doente tem o direito de recorrer a outro especialista”, porque, “com frequência, acontece que um doente a ser tratado com paliativos acaba curado”, afirmou o cirurgião.

Dos doentes diagnosticados com cancro do pâncreas apenas 15% ou 20% são operáveis, ou seja, existe “um enorme leque de doentes que não tem hipótese cirúrgica”.

Dos não operáveis, apenas 20 a 30% dos casos vão ser submetidos a outros tratamentos, como a quimioterapia.

São estes doentes que devem procurar um centro de referência para ouvir uma segunda opinião e, eventualmente, submeterem-se ao procedimento de Appleby.

O Centro de Referência de Cancro Hepatobilio-pancreático do Centro Hospitalar Universitário São João (CHUSJ), assumindo a sua alta diferenciação e capacidade inovadora, suportada por cuidados altamente especializados, é um dos que em Portugal oferece às pessoas atingidas por esta patologia, e nos casos em que é aplicável, a possibilidade de cirurgia radical potencialmente curativa.

LUSA/HN

0 Comments

Submit a Comment

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

ÚLTIMAS

ESEnfC acolhe estudantes europeus em programa inovador de decisão clínica

A Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC) recebeu 40 estudantes e oito docentes de Espanha, Finlândia, Itália e Portugal para um programa intensivo sobre competências clínicas e tomada de decisão. O evento combinou atividades online e presenciais, promovendo inovação pedagógica

VéloPsiq: bicicletas no combate ao sedentarismo psiquiátrico

O Hospital de Cascais lançou o Projeto VéloPsiq, uma iniciativa pioneira que utiliza bicicletas ao ar livre para melhorar a saúde física e mental de pacientes psiquiátricos. Com apoio da Câmara Municipal e da Cascais Próxima, o projeto promove reabilitação cardiovascular e bem-estar.

Johnson & Johnson lança série de videocasts sobre cancro da próstata

A Johnson & Johnson Innovative Medicine Portugal lançou a série “Check Up dos Factos – À Conversa Sobre Cancro da Próstata”, um conjunto de quatro vídeocasts que reúne oncologistas e urologistas para discutir temas-chave como NHTs, terapias combinadas e estudos de vida real no CPmHS.

Ronaldo Sousa: “a metáfora da invasão biológica é uma arma contra os migrantes”

Em entrevista exclusiva ao Health News, o Professor Ronaldo Sousa, especialista em invasões biológicas da Universidade do Minho, alerta para os riscos de comparar migrações humanas com invasões biológicas. Ele destaca como essa retórica pode reforçar narrativas xenófobas e distorcer a perceção pública sobre migrantes, enfatizando a necessidade de uma abordagem interdisciplinar para políticas migratórias mais éticas

OMS alcança acordo de princípio sobre tratado pandémico

Os delegados dos Estados membros da Organização Mundial da Saúde (OMS) chegaram este sábado, em Genebra, a um acordo de princípio sobre um texto destinado a reforçar a preparação e a resposta global a futuras pandemias.

MAIS LIDAS

Share This
Verified by MonsterInsights