Maria (nome fictício), de 41 anos, deveria estar entre os 66% dos portugueses que já têm a vacinação completa, mas uma reação alérgica na toma da primeira dose fez com que ficasse a meio do processo. As autoridades de saúde recomendam que o prazo entre as duas doses seja de 21 dias, mas no caso de Maria já passaram quatro meses.
O seu processo esteve no Hospital de Torres Vedras e está agora no Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, onde os serviços aguardam o aval das autoridades de saúde para o poderem concluir.
“Temos feito pedidos sucessivos de autorização para usar as vacinas e temos recebido sempre negas. Dizem-nos que não o podemos fazer”, contou à Lusa fonte do Hospital Beatriz Ângelo, acrescentando que o processo de Maria “não é caso único”, apesar de “serem poucos”.
Sem autorização à vista, a equipa do Beatriz Ângelo já tentou transferir estes casos para outras unidades hospitalares, nomeadamente para o Hospital Santa Maria, em Lisboa, que lhes revelou estarem com os mesmos problemas, acrescentou a mesma fonte.
Até ontem, o Hospital Beatriz Ângelo continuava a aguardar “uma resposta da ARS (Administração Regional de Saúde) para obter autorização para usar as vacinas neste contexto”.
Questionada pela Lusa, a ‘task force’ que coordena o processo de vacinação sublinha que os casos de reações alérgicas à vacina são prioritários nas consultas de imunoalergologia e que “não há falta de vacinas nos hospitais”, sendo “alocadas, semanalmente, mil vacinas” para estes casos.
Maria estranha ser uma exceção, tendo em conta que o seu caso passou por dois hospitais diferentes, mas com problemas semelhantes: Em ambos foi-lhe dito que em vez de vacinas, havia listas de espera.
Ser professora valeu-lhe a prioridade no processo de vacinação. Tomou a primeira dose a 17 de abril, mas a cara inchou e o caso teve de ser reavaliado.
A Linha Saúde 24 encaminhou-a para o médico do centro de saúde, que acabou por desvalorizar a situação. Quando regressou ao centro de vacinação, em maio, a segunda dose foi-lhe negada e o processo seguiu para o serviço de Imunoalergologia do Hospital de Torres Vedras.
A imunoalergologista de Torres Vedras disse-lhe que havia uma “lista de espera de 300 pacientes relacionados com alergias à vacinação covid”, lê-se na denúncia enviada a vários organismos, desde a Direção-Geral de Saúde, à ‘task force’ e à Entidade Reguladora da Saúde (ERS).
Depois de Torres Vedras, Maria foi transferida para o Hospital de Loures, onde teve a primeira consulta em julho. A médica disse-lhe que “o Hospital não dispunha de vacinas para ser testada”, conta Maria na queixa a que a Lusa teve acesso.
Fonte do Hospital Beatriz Ângelo confirmou não ter autorização para utilizar as vacinas, apesar dos insistentes pedidos para dar seguimento aos “poucos casos” que têm.
Passados quatro meses da toma da primeira dose, Maria continua sem ser contactada e lamenta que a ERS tenha arquivado a queixa sem nunca lhe responder.
Teresa (nome fictício), 44 anos, também tem o processo de vacinação suspenso por causa do seu historial de reações alérgicas que a obrigam a ser vacinada num hospital.
Do centro de saúde para o Hospital D. Estefânia, em Lisboa, Teresa seguiu para o Hospital de São Lázaro. A psicóloga queixa-se de estar à espera há mais de um mês, o que a preocupa porque lhe disseram que, nesta altura do ano, havia médicos de férias e poucas vacinas.
À Lusa, o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central (CHULC) garantiu que não faltam vacinas nem existem listas de espera e que Teresa “será convocada para o próximo processo de vacinação”.
Além disso, acrescenta o CHULC, Teresa foi referenciada a 13 de julho e a sua consulta de avaliação “aconteceu dois dias depois”.
Este tipo de vacinação é realizada por “uma equipa totalmente dedicada e de acordo com critérios clínicos” e os processos são desenhados tendo em conta o número de referenciações, explicou o CHULC.
Também a Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica (SPAIC) estranha que “haja listas de espera”, admitindo que possa haver “uma espera de duas ou três semanas”.
“A imunoalergologia tem sido sobrecarregada com dezenas de pedidos por dia, o que faz sentido, porque neste momento a nossa prioridade é apoiar o processo de vacinação”, disse a vice-presidente da SPAIC em declarações à Lusa.
Ana Morete, que é também diretora do Serviço de Imunoalergologia do Hospital de Aveiro e está à frente da coordenação da vacinação contra a Covid-19 em meio hospitalar, garante que “há sempre vacinas”.
“No meu hospital já vacinei centenas de doentes. Semanalmente pedimos as vacinas que precisamos e nunca tive um ´não´”, acrescentou Ana Morete.
LUSA/HN
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