Há cerca de três anos, Carmo Bastos começou a sentir dificuldade em escrever, em lavar os dentes e a engatar as mudanças no carro. Estes e outros pequenos sinais sugeriam-lhe que seria uma tendinite, mas depois de vários tratamentos de despiste e exames, o diagnóstico chegou: doença de Parkinson.
Naquele dia, recorda, “estava completamente descontraída” na consulta, mas a notícia fez com que ficasse “colada à parede”. Seguiram-se várias horas, dias e semanas de reorganização da sua própria vida e de “tentar aceitar” uma doença que surgia em idade precoce.
“Não sabemos, dentro do quadro da doença, o caminho que vai seguir em nós”, contou à Lusa.
Os primeiros meses foram de “expectativa”, na tentativa de perceber se a evolução seria rápida ou lenta, se as implicações seriam imediatas e se os sintomas seriam ligeiros.
A par de alguma medicação, Carmo começou a fazer desporto regularmente, alternando entre o ténis, o pilates e o andar a pé. No banco onde exercia um cargo de gestão de equipa, optou por deixar a função.
“Enquanto o desporto é o principal redutor dos sintomas, o ‘stress’ é o principal indutor. A certa altura, achei que precisava de mais tempo para mim e de uma função menos desgastante”, observou.
Enquanto abrandava o ritmo da sua vida, procurou por mais informação sobre a doença e outros doentes. O que encontrou “não se enquadrava no que procurava”, nem se sentia representada.
“O tipo de estímulos que uma pessoa com 30, 40 ou 50 anos precisa é completamente diferente do tipo de estímulos de uma pessoa mais velha. As pessoas estão no auge da carreira, têm filhos pequenos, outras ambições e objetivos”, disse.
Carmo sentiu que era preciso “mudar a tónica”. Procurou junto de especialistas e, em julho de 2021, criou a Young Parkies Portugal, uma associação que junta todos os envolvidos no processo: doentes, médicos, cuidadores, investigadores e fisioterapeutas.
“Não queremos ser uma associação assistencialista, quase paliativa. O objetivo é dar conteúdos, ter conferências, informação, aulas ‘online’ e ‘coaching’”, esclareceu Carmo, que vê agora a associação ganhar forma e ser lançada em ‘site’.
O ‘site’ permitirá, acredita Carmo, criar “espírito de comunidade” e fazer com que as pessoas com Parkinson se sintam bem, tenham confiança e não “carreguem o peso da doença sozinhas”.
Foi através de uma “cilada” armada por Carmo e pelo investigador Tiago Outeiro que João Massano, médico neurologista do Hospital de São João, conheceu os meandros por detrás da Young Parkies Portugal e a ela se associou.
“Os nossos doentes têm de ter uma voz mais audível e juntando-se, trocando ideias, tudo isso é facilitado e lhes confere um certo conforto”, observou o médico, que não ficou indiferente ao perceber que a iniciativa partia dos próprios doentes.
“Isso sensibilizou-me muito e dá uma força muito diferente à associação”, contou à Lusa.
Em Portugal, estima-se que entre 18 e 20 mil pessoas tenham doença de Parkinson, sendo que em cerca de 10% destas a doença se manifesta antes dos 50 anos, o que é considerado Parkinson juvenil.
A grande maioria dos casos de Parkinson juvenil tem origem em mutações genéticas que ajudam, “apesar de tudo”, a certificar o diagnóstico que é essencialmente clínico.
Com os sintomas a manifestarem-se em diferentes frentes, além das conhecidas implicações motoras, os avanços científicos têm tentado procurar formas de tornar a Levodopa [fármaco indicado para o tratamento] “mais eficaz durante mais tempo”.
Parte da investigação está também a debruçar-se sobre “moléculas e estratégias moleculares” na tentativa de encontrar as proteínas que estão na génese da doença de Parkinson. A par disso, esclareceu João Massano, a investigação sobre a doença tem apostado no desenvolvimento de novas tecnologias.
Criada para informar, integrar e acompanhar pessoas com Parkinson juvenil, a Young Parkies Portugal lançou na sexta-feira a sua página na Internet, estando nos planos futuros a organização de ‘bootcamps’ e a abertura de centros.
LUSA/HN
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