Há várias décadas que, no seio da (actual) União Europeia, vivemos, periodicamente, com quadros estratégicos de Saúde e Segurança do Trabalho (o actual, para o período de 2021 a 2027).
A prevenção das “doenças ligadas ao trabalho”, entendidas como todas as situações patológicas em que o trabalho, de algum modo, influencia negativamente a saúde não tem, contudo e aparentemente, merecido suficiente atenção, pelo menos em relação à atenção dada aos acidentes de trabalho.
Nesta estratégia 2021-2027 são fixados três grandes objectivos:
- Melhorar a prevenção de acidentes e de doenças no local de trabalho;
- Antecipar e gerir a mudança no novo mundo do trabalho, resultante das transições ecológica, digital e demográfica;
- Aumentar a preparação para responder a futuras crises sanitárias.
A formulação é genérica e no primeiro objectivo, presume-se que se refere à prevenção das “doenças relacionadas com o trabalho”, “maltratadas” e esquecidas há décadas, de que o cancro “ligado” ao trabalho é um bom exemplo. Há contudo um mau indício, na língua inglesa o texto refere-se a “workplace illnesses” e não a “work-related diseases” ou “occupational diseases”. Aparentemente são usados como sinónimos, ainda que disease e illness possam não ter exactamente o mesmo significado (e restam ainda disorder e sickness). Certo, certo, é que doença profissional não é sinónimo de doença relacionada com o trabalho!
Se a influência negativa dos factores de risco profissionais na saúde de quem trabalha já tinha alguma complexidade, agora, com este texto, aumenta-se a complexidade com as tais “workplace illnesses” que “inovam” em Patologia e Clínica do Trabalho ou, pelo menos, acrescentam alguma incerteza.
O segundo objectivo estratégico aponta para grandes mudanças no mundo do trabalho, quer em relação aos trabalhadores, quer em relação às transformações que vão ocorrendo nas condições de trabalho que colocam, de facto, importantes desafios, também nas relações trabalho/saúde (doença).
O último objectivo estratégico é determinado, totalmente, pela actual situação pandémica e, salvo melhor opinião, era desnecessário. De facto a Saúde Pública enquadra a saúde em todas as políticas e essa preparação de resposta a novas emergências, deveria ser um desígnio nacional e não propriamente um objectivo “específico” da Saúde Ocupacional (ou, se se preferir da Saúde e Segurança do Trabalho). Compreende-se, todavia, que a intensidade do impacto da actual pandemia também se transmita às políticas sectoriais, neste caso do Trabalho e da Saúde.
A melhor estratégia deveria, contudo, ser a da inclusão da protecção da saúde (e também da segurança) de quem trabalha nas boas práticas do exercício de qualquer actividade, por oposição à perspectiva mais habitual de a considerar algo que se “acrescenta” a essas boas práticas. Enquanto tal não for a cultura empresarial ou organizacional dominante corre-se o risco de a perspectivar mais como um custo do que como um investimento. E isso não ajuda nada a protecção da saúde (e da segurança) dos trabalhadores nos locais de trabalho que se presume que seja o pretendido.
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