Educação e Saúde serão novas competências dos municípios apesar de pouca adesão

30 de Março 2022

O Governo definiu sexta-feira como o prazo para descentralizar para os municípios competências na Educação e na Saúde, apesar do baixo ritmo da adesão voluntária ao processo, com vários autarcas a afirmar que não estão preparados para as desenvolver.

As competências no âmbito da Ação Social, que os municípios também deveriam assumir em 01 de abril, só passam definitivamente para as autarquias em 01 de janeiro de 2023, uma vez que o diploma setorial que pormenorizava as tarefas a descentralizar pela administração central foi promulgado apenas em fevereiro deste ano.

Dois governos PS e dois ministros depois, seis anos de negociações e mais de um ano após a data inicialmente prevista como definitiva para que os municípios assumissem competências em 20 áreas, caberá agora a Ana Abrunhosa, que hoje toma posse como a terceira ministra socialista responsável pela descentralização, conduzir este processo até à sua conclusão.

A descentralização de competências do Estado central para os municípios tem sido nas últimas décadas tema das várias campanhas partidárias e legislaturas e foi assumida como a “grande reforma do Estado” pelo primeiro-ministro, António Costa, decorrendo de uma lei-quadro aprovada em 2018, depois de dois anos de negociações entre o Governo, os municípios e os partidos no parlamento, marcados por críticas de autarcas e da esquerda à direita.

A própria aprovação da lei-quadro que estabeleceu as transferências foi também acompanhada de polémica, já que o PS estabeleceu então um acordo com o PSD no parlamento, deixando de lado os seus parceiros de ‘geringonça’, que votaram contra.

A lei-quadro estabeleceu a descentralização em 20 áreas, de uma forma genérica, que depois seriam desenvolvidas em diplomas setoriais.

Na ideia do ministro Adjunto Eduardo Cabrita, que iniciou o processo, o plano era aprovar o mais rapidamente possível estes diplomas para que, entretanto, os 278 municípios do continente fossem aceitando as competências progressivamente, a partir de 2019, até que em 01 de janeiro de 2021 essas tarefas fossem obrigatórias para todos.

No entanto, aquando da promulgação da lei-quadro, em agosto de 2018, já o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, alertava para um possível “alijar das responsabilidades do Estado” e avisava que não estava garantida a aprovação dos diplomas complementares, o que tornaria imprevisível a aplicação temporal da lei.

De facto, a negociação e a aprovação das leis setoriais, uma a uma, foram de progresso lento.

Em agosto de 2020, a meio ano do prazo estabelecido e quando a legislatura já era outra, a segunda ministra a tutelar as autarquias, Alexandra Leitão, reprogramou para 01 de abril de 2022 as competências nas três áreas mais difíceis de negociar e, por isso, mais atrasadas: Educação, Saúde e Ação Social.

No caso da Ação Social, que Alexandra Leitão considerou “um trabalho difícil”, o diploma setorial foi apenas promulgado no início de fevereiro deste ano, pelo que o Governo, já em final de mandato, voltou a prorrogar a possibilidade de aceitação desta competência pelos municípios até ao último dia de 2022.

A dois dias de se tornarem definitivas, e segundo o mais recente balanço do Governo – que não atualizou estes números, após pedido da agência Lusa, por estar no final do mandato -, apenas 28% (57) de um universo de 201 municípios que podem assumir competências na Saúde as aceitaram e 45% (125 em 278) aceitaram voluntariamente competências na Educação.

A proposta rejeitada do Orçamento do Estado para 2022 previa, através do Fundo de Financiamento da Descentralização, 832 milhões de euros para o exercício da Educação, Saúde e Ação Social pelos municípios entre abril e dezembro.

Os autarcas, que sempre reivindicaram mais tarefas próprias por serem quem melhor as pode desempenhar numa lógica de proximidade às populações, aprovaram genericamente as áreas propostas pelo Governo, mas avaliaram como insuficientes as verbas que as acompanhavam e exigiram “estudos que identificassem, em concreto e em termos globais, qual o património, os recursos humanos e financeiros” envolvidos.

Além das vozes individualmente dissonantes, em meados de janeiro de 2020, um grupo de autarcas liderados pelo presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, publicou a “declaração do Rivoli” e instou o Governo a suspender a obrigatoriedade prevista na lei para a transferência de competências, retomando o “processo negocial” com os municípios, por considerar que o “calendário é impossível”.

No final do ano passado, após o chumbo do Orçamento para 2022, foram os autarcas social-democratas a exigirem um adiamento e na semana passada os presidentes das câmaras de Lisboa e do Porto pediram o mesmo a António Costa, com o autarca do Porto, Rui Moreira, a anunciar ter interposto uma providência cautelar para travar o processo.

Apesar dos pedidos, a ministra Alexandra Leitão manteve a recusa de adiamento, por considerar que, no caso da Educação, não se justifica e porque, no caso da Saúde, “a transferência efetiva” só se dará quando forem assinados autos entre o Governo e cada município, apesar de ter admitido não existir uma “fasquia temporal” para a assinatura destes autos.

Quanto às restantes 17 competências dos municípios, o Governo considerou-as transferidas em 01 de janeiro de 2021 e são nas áreas da Cultura, Habitação, Justiça, Atendimento ao cidadão, Gestão do património imobiliário público, Vias de comunicação, Praias, Áreas portuárias, Transporte em vias navegáveis interiores, Cogestão de áreas protegidas, Proteção civil, Policiamento de proximidade, Segurança contra incêndios, Estacionamento público, Jogos de Fortuna e de azar, Arborização e rearborização e Associações de bombeiros.

LUSA/HN

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