“Infelizmente ainda não estamos a deslumbrar uma cura. Queria alertar que há pessoas que vivem muito impactadas por esta doença e lançar números que remetem para algo milagroso não é a realidade. A cirurgia da enxaqueca é experimental e não é para qualquer doente. A ser considerada, em último caso, é para uma minoria de doentes. Temos muitas opções válidas antes da cirurgia”, disse Raquel Gil-Gouveia.
Em declarações à agência Lusa, a presidente da SPC reconheceu que “o tratamento da enxaqueca precisa de inovação” porque “embora existam terapêuticas clássicas e de reconhecida eficácia, ainda existem doentes que não respondem aos fármacos”.
No entanto, a SPC diz estar preocupada “com a divulgação recente de estudos pequenos ou observacionais ou de casos clínicos sobre uma técnica cirúrgica” para curar a enxaqueca quando, insistiu Raquel Gil-Gouveia, “não existe cura”.
“Fala-se em curas até 80%. Esse valor é claramente astronómico. Há uma certa preocupação da nossa parte porque essas técnicas cirúrgicas não estão ainda devidamente fundamentadas na ciência. Não há nenhuma recomendação nacional, internacional ou mundial sobre intervenção cirúrgica para a enxaqueca”, frisou.
Segundo Raquel Gil-Gouveia o procedimento cirúrgico para curar a enxaqueca, a ser efetuado, “só pode ser efetuado como ensaio clínico ou porque a pessoa se submete por não ter outra alternativa e já experimentou tudo”.
“Mas é importante o alerta de que isto é um procedimento experimental”, sublinhou a presidente da sociedade e médica neurologista.
Sobre uma doença que também tem base genética e que é considerada a segunda causa mundial dentro do indicador “anos vividos com incapacidade”, usado entre a comunidade científica para medir o impacto na funcionalidade no dia a dia, Raquel Gil-Gouveia disse que “existe resposta” e aconselhou os doentes a procurar ajuda.
“Há muitos fármacos em ‘pipeline’, uns para sair que já foram aprovados, outros em investigação. Existe também uma vertente mais interventiva e menos médica: existem aparelhos estimuladores que tentam modelar a função do cérebro para tentar controlar a enxaqueca”, descreveu.
Raquel Gil-Gouveia aconselhou a procura de informação junto da SPC, bem como da MiGRA Portugal – Associação de Doentes com Enxaqueca e Cefaleia, e contou que os médicos de família têm recebido “cada vez mais” formação sobre esta área.
“Há muitas pessoas que se conformam e pensam que não há nada a fazer. ‘A minha mãe já tinha esta doença, o meu pai também, tenho de ver assim’. Mas há o que fazer. Há mais fármacos, há estimuladores e há alterações de estilo de vida que melhoram muito. Se sente que a enxaqueca está a tomar conta da sua vida, procure ajuda”, concluiu.
Um estudo de investigadores da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), divulgado em 28 de junho, revela que o tratamento cirúrgico da enxaqueca é um procedimento “seguro e eficaz” e pode representar melhorias “significativas” na qualidade de vida dos doentes.
De acordo com dados enviados à agência Lusa pela FMUP, “uma em cada três pessoas com enxaquecas não melhora com fármacos”.
“A cirurgia pode ser uma alternativa para travar este distúrbio que afeta a qualidade de vida das pessoas”, afirmou o professor da FMUP, António Costa Ferreira.
Este médico publicou, em colaboração com as investigadoras Sara Henriques, Alexandre Almeida e Helena Peres, um estudo na revista Annals of Plastic Surgery, uma publicação médica dedicada à cirurgia plástica e reconstrutiva.
LUSA/HN
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