Baptista Leite chegou a Lviv há uma semana, a convite da Associação dos Ucranianos em Portugal e das autoridades locais, e realça a tranquilidade das ruas de uma cidade europeia, que se sobressalta com os frequentes avisos de possibilidade de ataques com mísseis e se transforma num enorme ‘bunker’ em poucos minutos.
“Nos hospitais onde tenho trabalhado, encontrei também esse contraste: temos a realidade das consultas normais e temos a realidade que se passa debaixo de terra, nos subterrâneos, para onde quase tudo é transportado quando soam as sirenes de aviso de ataques”, disse Baptista Leite à Lusa, numa conversa telefónica.
Embora seja deputado do PSD na Assembleia da República, Ricardo Baptista Leite está em Lviv a fazer valer as suas competências de médico, num sistema rotativo que já lhe permitiu passar por dois hospitais em serviços tão distintos como a maternidade, cuidados intensivos neonatais, consultas externas, cardiologia de intervenção e reabilitação.
Baptista Leite elogia o esforço que o pessoal de saúde na Ucrânia, em plena invasão russa, está a fazer, em condições “particularmente difíceis”, salientando que, nos dois hospitais regionais por onde passou, apenas três médicos saíram dos seus serviços, para irem trabalhar para outro país.
“Estes são funcionários que acabavam de atravessar dois anos de pandemia de Covid-19 e que foram sujeitos a este tremendo esforço, de fazer funcionar hospitais em ambiente de guerra, com condições mínimas”, explicou.
Os ordenados destes médicos e enfermeiros são muito baixos, na ordem das poucas centenas de euros mensais, mas que, apesar de toda a situação, estão a ser mantidos pelos depauperados cofres do Estado ucraniano.
Os hospitais possuem muito pouco material e todo e qualquer investimento de modernização ficou suspenso com a invasão russa, que começou no final de fevereiro.
Por isso, diz Baptista Leite, são tão importantes as iniciativas de ajuda humanitária, que chegam um pouco de todo o lado.
A Associação de Ucranianos em Portugal lançou recentemente uma campanha para a compra de equipamento para os Cuidados Intensivos de recém-nascidos do hospital regional de Lviv, procurando obter um sistema de tubulação de oxigénio, bem como um gerador a diesel para garantir a energia nos serviços.
Desde março que os cuidados intensivos neonatais dos hospitais de Lviv passaram para instalações subterrâneas, em regime permanente, onde os profissionais de saúde trabalham sem luz natural, debaixo de elevadas temperaturas, em condições muito difíceis.
Mas desde o início da guerra, já nasceram sete bebés no ‘bunker’ transformado em maternidade.
Outra situação que impressionou o parlamentar português a prestar serviço de voluntariado em Lviv foi a conversão de parte importante de um dos hospitais para serviços de reabilitação física e motora, para tratar os mutilados de guerra que chegam diariamente da frente de guerra, no ocidente da Ucrânia.
Tal como o impressionou a tenda que foi montada no meio de um hospital para responder a um eventual ataque químico e que ali continua, símbolo dos riscos que este conflito ainda poderá trazer.
“Todos têm de se adaptar. Há um grande espírito de sacrifício de toda a população, sabendo que a guerra trouxe novas necessidades”, disse Baptista Leite.
Os serviços de cuidados de saúde mental são particularmente procurados e as enfermarias estão totalmente lotadas, com muitos dos médicos a prestar serviço à distância, por telefone, aos soldados ucranianos que se encontram na frente de batalha.
E esta é uma guerra que veio para ficar, sente o deputado, que tem falado com muitas pessoas que, embora sem terem provas para sustentar a sua perceção, acreditam que o conflito com a Rússia vai durar até à primavera do próximo ano.
“Não sei de onde lhes vem essa convicção. Mas muita gente me passa essa mensagem”, constatou o agora médico voluntário, que salienta ainda o patriotismo da população e o forte sentimento europeísta, sobretudo depois de Bruxelas ter aceitado o estatuto de candidato da Ucrânia à entrada na União Europeia.
“E todos, mas todos, acreditam que esta guerra apenas pode ter um fim: a vitória total da Ucrânia. Para os ucranianos, qualquer cedência que agora fosse feita a Moscovo seria um passo para uma futura tentativa de nova invasão russa”, concluiu Baptista Leite.
LUSA/HN
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