Fecho rotativo das urgências “não é uma solução civilizada para um país europeu”

4 de Janeiro 2023

O médico Diogo Ayres de Campos considerou esta quarta-feira que o fecho rotativo das urgências de obstetrícia e ginecologia "não é uma solução civilizada para um país europeu”, porque quebra a ligação entre os hospitais e as grávidas.

No dia em que o diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde (SNS), Fernando Araújo, anunciou que as maternidades e blocos de partos vão continuar a abrir de forma rotativa nos primeiros três meses deste ano, num esquema semelhante ao que aconteceu no Natal e no fim de ano, Diogo Ayres afirmou no parlamento que esta medida pode ser boa “como solução temporária”, mas não a longo prazo.

Diogo Ayres de Campos, que coordenou a Comissão de Acompanhamento de Resposta em Urgência de Ginecologia, Obstetrícia e Blocos de Parto, foi hoje ouvido na Comissão de Saúde de pedido do PSD sobre o fecho de serviços de obstetrícia e foi questionado por deputados sobre quem teve a iniciativa dos encerramentos alternados.

O especialista referiu que a iniciativa é da direção executiva do SNS, mas disse que foi solicitada à comissão uma opinião sobre este plano, que considerou que “os encerramentos alternativos não são solução”.

“Como solução temporária pode ser uma boa coisa para este período mais complicado, em que há pessoas que estão de férias, mas não acho que seja uma solução civilizada para um país europeu, porque quebra a ligação entre os hospitais e as grávidas”, declarou.

Como não se consegue programar a maior parte do partos, disse, quebra-se “essa ligação e as grávidas vão mais para os cuidados privados ou então que vão procurar esses cuidados noutros hospitais”.

Na qualidade de diretor do departamento de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, Diogo Ayres de Campos disse que isso foi observado no seu hospital, que registou um aumento de cerca de 250 partos, “por causa dos encerramentos” à volta da instituição.

Além disso, esta medida também possibilita que nas horas que antecedem esse encerramento haja transferência de grávidas em trabalho de parto.

“Acho que nenhum de nós quer transferir grávidas em trabalho de parto, a não ser que não tenha outra alternativa. Não acho que seja uma solução sustentável”, defendeu, adiantando que a comissão de acompanhamento está a trabalhar com a direção executiva do SNS na avaliação de soluções alternativas a esta medida.

Segundo o especialista, o “cerne do problema” são as equipas que estão reduzidas, porque que “o SNS não é atrativo” para os médicos e enfermeiros.

Disse ainda que será “muito difícil” atrair profissionais para o SNS, devido há diferença de salários com o privado.

“Acho que podemos eventualmente conseguir que os médicos que estão a fazer prestação de serviços venham novamente para o SNS, criando algumas condições, mas no resto é difícil”, admitiu.

Diogo Ayres de Campos considerou também que o aumento de vagas do internato de ginecologia e obstetrícia para 54 “foi muito pequeno” para as necessidades.

A comissão de acompanhamento fez várias propostas ao ministro da Saúde, muitas das quais sobre salários e progressão na carreira, mas sublinhou que essa matéria é negociada com os sindicatos.

Alertou, contudo, que “sem uma rede de referenciação hospitalar, não se consegue organizar nenhuns cuidados de obstetrícia e ginecologia”.

Para o especialista, a situação que se está a viver “é o resultado de planeamento ou falta dele na última década ou mais do que isso”.

LUSA/HN

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