Os investigadores precisam, por outro lado, que as infeções com variantes pré-Omicron forneceram uma imunidade natural “substancialmente reduzida” contra a reinfecção com a estirpe Omicron BA.1., em que 10 meses após a primeira infeção a proteção era apenas de 36%.
O trabalho publicado ontem na revista científica The Lancet constitui a análise “mais abrangente” feita até agora sobre o nível de proteção e extensão desta após o contágio por diferentes variantes daquele vírus, embora não inclua dados sobre a infeção com a variante Omicron XBB e as suas sublinhagens.
Foram revistos e analisados 65 estudos de 19 países, que comparam “a redução do risco de covid-19 entre indivíduos não vacinados contra uma reinfecção por SARS-CoV-2 e indivíduos não vacinados sem infeção anterior até setembro de 2022”, refere um comunicado de divulgação do estudo.
De acordo com a investigação, o nível e a duração da imunidade “contra reinfecção, doença sintomática e doença grave” são pelo menos iguais aos fornecidos por duas doses das vacinas de mRNA (Moderna, Pfizer-BioNtech) para as estirpes Alpha, Delta e Omicron BA.1.
“A vacinação é o modo mais seguro de conseguir imunidade, enquanto a obtenção da imunidade natural (através do contágio) deve ser ponderada face aos riscos de doença grave e morte associados à infeção inicial”, diz Stephen Lim, do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME, na sigla em inglês) na Escola de Medicina da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, o autor principal da análise, citado no comunicado.
Caroline Stein, também do IHME e coautora do estudo, assinala que “as vacinas continuam a ser importantes para todos” para proteger quer as populações de alto risco, como os maiores de 60 anos e os que já têm outras doenças.
“Isto também inclui populações que não foram infetadas anteriormente e grupos não vacinados, bem como os que foram infetados ou receberam a última dose da vacina há mais de seis meses”, adianta, defendendo que a imunidade natural e a situação em relação à vacinação devem ser tidas em conta para “obter uma imagem completa do perfil de imunidade de um indivíduo”.
Desde janeiro de 2021, foram divulgados vários estudos sobre a eficácia da infeção pelo SARS-CoV-2 na redução do risco de reinfeção e como a imunidade vai diminuindo com o tempo, mas nenhum avaliava de forma abrangente quanto tempo duraria a proteção após a infeção natural contra diferentes variantes.
A análise dos dados de 21 estudos sobre a infeção com uma variante pré-Omicron “estimou que a proteção contra a reinfecção de uma variante pré-Omicron foi de cerca de 85% no primeiro mês e caiu para cerca de 79% após 10 meses”, enquanto a imunidade natural conseguida com “uma infeção da variante pré-Omicron contra a reinfeção da variante Omicron BA.1 foi menor (74% num mês) e diminuiu mais rapidamente para 36% em cerca de 10 meses”.
“No entanto, a análise de cinco estudos relatando doenças graves (hospitalização e morte) revelou que a proteção (a este nível) permaneceu universalmente alta durante 10 meses: 90% para as ancestrais alfa e delta e 88% para a Omicron BA.1”.
Outros seis estudos que avaliaram a proteção especificamente contra sublinhagens da variante Omicron (BA.2 e BA.4/BA.5) indicavam que a proteção era bastante menor quando a infeção anterior era de uma variante pré-Omicron, mas que se mantinha a “um nível mais alto” quando a infeção anterior se deveu à estirpe Omicron, de acordo com o estudo divulgado ontem pela Lancet.
Segundo outro dos coautores do estudo, Hasan Nassereldine, do IHME, a menor proteção das infeções com as estirpes ancestrais em relação à variante Omicron e às suas sublinhagens reflete as mutações que ocorreram e que lhes permitem “escapar da imunidade adquirida mais facilmente do que outras variantes”.
“Os dados limitados que temos sobre a proteção da imunidade natural da variante Omicron e das suas sublinhagens sublinham a importância de uma avaliação contínua, principalmente porque se calcula que tenham infetado 46% da população em todo o mundo entre novembro de 2021 e junho de 2022”, diz o cientista, adiantando serem também necessárias mais investigações para “avaliar a imunidade natural de variantes emergentes e analisar a proteção fornecida por combinações de vacinação e infeção natural”.
Os autores do estudo “Proteção da infeção com SARS-CoV-2 contra a reinfeção: uma revisão sistemática e meta-análise” observam que o trabalho tem algumas limitações, dado serem limitados os dados sobre a variante Omicron BA.1 e as suas sublinhagens, bem como sobre situação em África.
Adiantam que os cálculos sobre a proteção também podem ter sido influenciados por serem limitados os dados disponíveis além dos 10 meses após a infeção inicial, bem como por serem registadas de modo diferente ou incompleto informações, por exemplo, sobre uma infeção anterior ou internamentos hospitalares.
Desde 01 de junho de 2022, estima-se que a pandemia de covid-19 causou 17,2 milhões de mortes (6,88 milhões das quais foram registadas) e 7,63 mil milhões de infeções e reinfeções, segundo o estudo, que adianta que “uma grande proporção dessas infeções ocorreu após 14 de novembro de 2022”.
“A imunidade conferida por infeções deve ser ponderada juntamente com a proteção conseguida com a vacinação na avaliação dos encargos futuros com a covid-19, fornecendo indicações sobre quando os indivíduos devem ser vacinados e sobre políticas que tornem a vacinação obrigatória para trabalhadores ou restrinjam o acesso a locais onde o risco de transmissão é alto (…), com base no estado imunológico”.
Na quarta-feira, a Agência Europeia do Medicamento (EMA na sigla em inglês) defendeu a vacinação anual contra a covid-19, advertindo que a doença “representa ainda uma carga significativa” para os sistemas de saúde na Europa.
O outono, “o início da estação fria”, foi considerado a melhor altura para a administração da vacina contra a covid-19, coincidindo com a época para a inoculação de vacinas contra outros vírus respiratórios (como o da gripe).
No final de janeiro, a Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciou que o seu Comité de Emergência dos Regulamentos Internacionais tinha decidido manter o nível máximo de alerta para a pandemia da covid-19.
Embora o comité tenha reconhecido que a pandemia pode estar a aproximar-se de um ponto de viragem, decidiu que “não há dúvida” de que o coronavírus SARS-CoV-2 continuará a ser um agente patogénico permanentemente estabelecido em seres humanos e animais para o futuro e, por conseguinte, é criticamente necessária uma ação de saúde pública a longo prazo, indicou a OMS em comunicado.
A covid-19 é uma doença respiratória infecciosa pandémica causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, um tipo de vírus que foi detetado há três anos na China, disseminando-se rapidamente pelo mundo, e que assumiu várias variantes e subvariantes, umas mais contagiosas do que outras.
Em Portugal, a vacinação contra a covid-19 iniciou-se em 27 de dezembro de 2020, tendo, desde então, sido administradas, de forma faseada, doses primárias e doses de reforço.
LUSA/HN
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