Em entrevista ao HealthNews, a responsável pela organização do evento, Filomena Pereira avançou alguns dos principais temas que serão abordados no evento. O 6CNMT junta especialistas provenientes dos Estados-Membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, da Europa e de todo o mundo.
HealthNews (HN)- O 6º Congresso Nacional de Medicina Tropical decorre a finais de abril. Qual a importância do evento?
Filomena Pereira (FP)- A missão do Instituto de Higiene e Medicina Tropical é precisamente a formação, a investigação e a prestação de serviços à comunidade na área da saúde global e das regiões tropicais em particular. Portanto, falar sobre saúde global e patologias tropicais, que é no fundo tudo aquilo que nos afeta a todos, faz com que este evento seja da maior importância. Este encontro permite a discussão do impacto destas infeções e doenças e a forma como estas podem colocar em causa a sustentabilidade dos sistemas em todo o mundo.
HN- Quais os principais tópicos que serão discutidos no encontro e quais foram os principais critérios na escolha dos temas que fazem parte do programa científico?
FP- Escolhemos as doenças que nos levantam maior preocupação. Tendo em conta que a saúde é global, é a nossa obrigação debruçarmo-nos e contribuirmos para a melhoria do estado de saúde de todas as populações. É por esta mesma razão que no congresso iremos falar de: Doenças Tropicais Negligenciadas; Síndromes Febris nos Trópicos; Doenças Emergentes, Surtos e Epidemias; Doenças Não Transmissíveis e Oncológicas; VIH e Tuberculose; Medicina Point-Of-Care nos Trópicos; Acidentes Ofídicos e a Covid-19.
HN- Quais são as doenças tropicais negligenciadas que mais preocupam os especialistas e porquê?
FP- Temos muitas doenças negligenciadas que nos preocupam, nomeadamente a schistosomose, a leishmaniose e fúngicas como micetoma, cromoblastomicose e outras micoses profundas sistémicas, assim como o envenenamento por mordedura de cobra. E são estas que vamos discutir no congresso. Numa altura em que a Organização Mundial da Saúde faz campanhas no sentido de diminuir o número de infeções por estas doenças faz todo o sentido que estas também sejam abordadas no nosso congresso. Para tal, vamos contar com a participação de vários especialistas nacionais e internacionais.
HN- Qual o impacto das alterações climáticas no aparecimento de surtos e epidemias de doenças tropicais em países não endémicos?
FP- Há determinadas doenças, nomeadamente aquelas que são transmitidas por vetores, que com o efeito das alterações climáticas em países não endémicos têm tendência a surgir nestes países porque os vetores passam a existir, principalmente num mundo global como o nosso, em que facilmente circulam de um lado para o outro.
Se estas doenças não forem convenientemente prevenidas podem ser criadas entropias no sistema e causar mais morbilidade e mortalidade nas populações. Geralmente, quanto menos sustentabilidade as ações de saúde tiverem menos respostas serão disponibilizadas e a prevenção acaba por não ter os efeitos desejados.
HN- Como é que os países europeus se devem adaptar a estes novos tipos de riscos?
FP- Sobretudo com a prevenção. Por exemplo, no caso da malária que é um dos temas abordados no programa pré-congresso, faz-se no sentido de estarmos perante uma doença de risco para as nossas populações devido ao efeito das alterações climáticas. O mesmo acontece quando falamos de dengue. Portanto, ao abordamos todas estas patologias no congresso, falamos sobre as medidas que devem ser implementadas para diminuir a carga que possa haver destas doenças mais tarde.
HN- Considera que a pandemia mudou a perceção sobre o risco das doenças infeciosas e tropicais?
FP- Infelizmente, já era sabido que uma pandemia poderia vir a acontecer e as medidas de prevenção foram mínimas ou quase nenhumas… Portanto, tenho sérias dúvidas de que a perceção tenha mudado, embora uma experiência passada sirva sempre para melhorarmos alguns aspetos. Não sei se termos tido esta pandemia vai fazer com que da próxima tudo corra melhor porque para isso não só era preciso uma reflexão profunda sobre o que aconteceu, como uma mudança na forma como cuidados do ambiente e no modo como vemos a saúde, que deve ser vista como anteriormente mencionado de uma forma global, em que todos e não só os profissionais de saúde devem ter o seu papel, nomeadamente os decisores políticos. Por exemplo, muitas destas epidemias/pandemias têm origem na destruição da floresta e não estou a ver a curto prazo que o cenário melhore.
HN- Para terminar, que palavras deixa a todos os que irão participar?
FP- Queremos que as pessoas que participam no congresso discutam e partilhem informação científica verdadeira e credível porque só assim se podem analisar os problemas, de modo a tentar conduzir a alguma mudança porque só assim teremos a confiança das pessoas para ajudarem nas ações necessárias.
No fundo, a minha mensagem para os participantes é trazerem novas ideias e que as discutam de modo a melhorar a saúde das nossas populações.
Entrevista de Vaishlay Camões
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