“Não tinha conhecimento das feridas, até ao momento em que assinei o relatório de alta”, referiu Letícia Agostinho, na primeira sessão do julgamento, no Tribunal de Évora, após ouvir a acusação lida pela presidente do coletivo que está a julgar o caso.
A responsável é um dos 10 arguidos, oito atuais e antigos funcionários da SCM de Alandroal, a instituição e a respetiva provedora, que começaram a ser julgados por maus-tratos contra uma utente do lar que acabou por morrer.
Na primeira sessão, em que faltou uma das arguidas, três recusaram, nesta fase do julgamento, prestar declarações em tribunal, tendo os restantes acusados manifestado intenção de dar a sua versão dos acontecimentos.
Sem a presença dos outros arguidos que aceitaram falar, a diretora técnica foi a primeira a prestar declarações, tendo respondido a perguntas da juíza presidente do coletivo, Celeste Mendonça, sobre o funcionamento do lar e o quotidiano e relação com a idosa.
“As questões de saúde eram reportadas à enfermeira e ao médico”, indicou, frisando que, ainda que a sua responsabilidade fosse gerir o lar, não lhe cabia dar instruções na área da saúde às funcionárias.
Segundo Letícia Agostinho, as orientações para mudar de posição ou levantar utentes mais debilitados eram dadas pelos profissionais de saúde.
Em relação ao caso da idosa, a diretora técnica sublinhou que não lhe deram conhecimento “nem verbal, nem por escrito” da existência de úlceras de pressão no corpo da utente e que no livro de ocorrências também não havia registo das feridas.
Esclareceu ainda que soube da existência das úlceras de pressão quando recebeu a informação da enfermeira para elaborar o relatório de alta, aquando da mudança da utente para um outro lar em Vendas Novas.
“Até sair, a dona Lucinda esteve sempre com aspeto limpo e cuidado, bem vestida e com cheiro agradável”, respondeu, após ser questionada pela juíza presidente se não tinha notado o cheiro a carne putrefacta, como consta na acusação.
A responsável relatou que a idosa chegou a pernoitar na instituição quando ainda só frequentava o centro de dia da SCM de Alandroal, pois o marido e cuidador quando ficava alcoolizado “não tinha condições e ela ficava intranquila”.
“O lar prestou todos os cuidados a este agregado familiar que devia e que podia e, por vezes, até excedeu as suas responsabilidades”, acrescentou.
No final da primeira sessão, nem os arguidos, nem os advogados se mostraram disponíveis para prestar declarações aos jornalistas.
Além da diretora técnica, também são arguidos quatro ajudantes de lar, uma técnica de fisioterapia, um médico, uma enfermeira, a SCM de Alandroal e a provedora, todos acusados pelo Ministério Público de um crime de maus-tratos agravado pelo resultado.
Segundo a acusação, o caso remonta a dezembro de 2014, quando foram detetadas “múltiplas úlceras de pressão” no corpo da utente, de 83 anos, após ser transferida do lar da SCM de Alandroal para um outro em Vendas Novas.
Uma úlcera na zona da anca direita não cicatrizou e, quase dois meses depois da mudança, a utente foi transportada para o hospital de Évora, com vómitos, febre e prostração, acabando por morrer às 01:00 do dia seguinte, devido a uma infeção generalizada.
LUSA/HN
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