CHEGA/Pedro Frazão: “Queremos acabar com a Direção Executiva”

03/04/2024
Conhecidos pela sua forte oposição às políticas de Saúde da esquerda, o CHEGA promete um novo paradigma na Saúde. No especial Legislativas 2024, o partido garantiu ao HealthNews que "o acesso à saúde será uma promessa cumprida" caso resultem vencedores nas próximas eleições. Pedro Frazão, o médico veterinário que volta a liderar a lista por Santarém, afirma que o CHEGA quer reverter algumas das reformas mais importantes do Serviço Nacional de Saúde. "Queremos alterar o Estatuto do SNS e revogar a previsão do diretor executivo", sublinhou. 

HealthNews (HN)- O CHEGA tem sido um partido altamente crítico de promessas não cumpridas, sobretudo no que toca ao anterior Executivo. Com o CHEGA, o acesso à saúde será uma promessa cumprida?

Pedro Frazão (PF)- Sim. O CHEGA tem como grande prioridade que os portugueses possam aceder a cuidados de saúde de excelência e de forma atempada. Para isso, acreditamos que devem ser utilizados os três pilares do sistema: o público, o privado e social. Os cuidados podem ser prestados por cada um destes três setores. O que importa é que as pessoas consigam aceder às consultas, aos exames e às cirurgias em tempo útil. Esse é o paradigma do nosso programa, portanto queremos agilizar o Serviço Nacional de Saúde para que as pessoas possam ter um acesso mais rápido e de maior qualidade.

HN- Que medidas pensam adotar para garantir o acesso universal dos utentes aos cuidados de saúde?

PF- Em primeiro lugar temos que reformar a Lei de Bases da Saúde, da qual temos sido bastante críticos, para que possamos introduzir novos modelos de gestão, como por exemplo as parcerias público-privadas. Queremos alterar o Estatuto do Serviço Nacional de Saúde e revogar a previsão do diretor executivo, uma vez que achamos que é uma figura redundante que, só no seu gabinete e na sua estrutura, gasta dez milhões de euros ao Orçamento de Estado por ano.

Em segundo lugar, defendemos que sempre que se verifique um esgotamento dos Tempos Máximos de Resposta Garantidos (TMRG), o utente seja automaticamente referenciado para o setor privado ou social. Esta referenciação tem de acontecer de forma muito rápida e eficaz, garantido aos portugueses os cuidados de saúde atualizados.

Em terceiro lugar, queremos que sejam promovidos rastreios regulares para conseguirmos identificar precocemente condições de saúde potencialmente problemáticas. Acreditamos que os grandes ganhos devem estar na prevenção das doenças de maior prevalência e com grande impacto na saúde pública. Se os rastreios forem feitos de forma maciça a toda a população, ao fim de poucos anos podemos ter ganhos em saúde muito importantes.

HN- Voltando às reformas na gestão do SNS. O CHEGA vai pôr fim à Direção Executiva do SNS e tirar do papel a extinção das Administrações Regionais de Saúde (ARS)?

PF- De facto, queremos acabar com a Direção Executiva. Em relação às ARS, estas acabaram por não ser extintas. Estamos em fevereiro e as Administrações Regionais de Saúde continuam a funcionar exatamente como funcionavam em dezembro. Nada mudou, tanto do ponto de vista financeiro, como do ponto de vista prático e administrativo. Embora tivesse havido uma reforma no papel, todos os que trabalhamos na área da Saúde sabemos que pouco mudou.

Queremos é voltar a um sistema que seja prático e célere. É por isso que defendemos também a melhoria dos sistemas informáticos que estão à disposição dos profissionais. Tem que haver uma uniformização e uma fiabilidade dos programas para podermos verdadeiramente desburocratizar a Saúde. Isto passa desde logo pela introdução da ficha única do utente. Esta terá de poder ser consultada aos vários níveis, isto é, desde a farmácia comunitária até ao centro de saúde e ao hospital.

O CHEGA quer ainda criar um inventário nacional dos profissionais de saúde. Está para ser feito em Portugal desde 2015… É impossível o Governo gerir bem os recursos humanos quando não sabe quantas pessoas tem em cada classe profissional; não sabe as suas qualificações nem as suas motivações.

HN- O CHEGA reconhece no seu programa a importância de devolver ao SNS “a capacidade de atrair e fixar profissionais”, alertando que entre fevereiro e outubro de 2023, 1.780 profissionais de saúde abandonaram o SNS. Que medidas propõem para “estancar esta sangria”? O recurso a médicos estrangeiros é uma opção para o CHEGA?

PF- Para o CHEGA os médicos portugueses estarão sempre em primeiro lugar. Somos reconhecidos mundialmente por uma formação académica de excelência. Este reconhecimento é feito tanto na Medicina, como na Farmácia e na Enfermagem. Portanto, é inadmissível que estejamos a perder os nossos encéfalos para o estrangeiro, não os conseguindo captar. No Serviço Nacional de Saúde, sob o ponto de vista mais específico, o que é necessário é que sejam atendidas as justas reivindicações das classes profissionais, nomeadamente a questão das carreiras e da tabela salarial dos médicos, enfermeiros e farmacêuticos hospitalares. Mas não é só esta questão remuneratória que importa, os profissionais de saúde têm de sentir que são valorizados dentro das suas instituições. Para isso é necessário que existam boas condições de trabalho, que haja liberdade para conjugar a profissão com a família e com o percurso académica, sendo algo muito desejado nesta área. Penso que desta forma vai ser possível voltar a captar os melhores profissionais para o Serviço Nacional de Saúde. Os médicos quando saem fazem-no com alguma mágoa e em último reduto. Estes especialistas saem porque se sentem muito mal tratados e desiludidos.

HN- O CHEGA quer revogar a Portaria no 411-A/2023, que regula o Índice de Desempenho das Equipas das Unidades de Saúde Familiar. Como pensam avaliar a eficiência e produtividade dos médicos nas USF modelo B?

PF- A razão pela qual queremos revogar essa portaria é porque ela entra em linha de conta com o número de Meios Complementares de Diagnóstico Terapêutica e o nível de prescrição. Para o CHEGA esta medida é um atentado à independência científica e à boa prática médica. Os médicos não podem estar a ser avaliados pelo número de exames e de medicamentos que prescrevem, até porque as populações são muito diferentes. Portanto, consideramos que essa portaria não está bem construída. A avaliação tem de assentar em dois pilares: os índices de produção do próprio médico, tal como acontece nos CRI, e os ganhos em saúde da população. É preciso que se comecem a avaliar, de uma vez por todas, a erradicação ou diminuição de determinadas patologias. Essa tem de ser uma consequência da boa ação médica. Os profissionais de saúde têm de ser recompensados quando, nas suas listas, conseguem ter estes ganhos em saúde.

HN- O partido quer promover a segurança dos profissionais de saúde. Que medidas propõem?

PF- O CHEGA já propôs essas medidas em sede da iniciativa legislativa, na Assembleia da República, mas simplesmente foram cilindradas pela maioria absoluta. Em Portugal, não podemos escamotear o facto de que, todos os dias, pelo menos um enfermeiro é agredido ou é algo de assédio. Por isso é que propusemos que a agressão a um funcionário do Serviço Nacional de Saúde seja tornado um crime público.

HN- O partido tem sido bastante insistente sobre o tema da pressão migratória na Saúde. No que toca às políticas de acesso à saúde dos imigrantes, quais as medidas defendidas pelo CHEGA? Os imigrantes devem ter pleno acesso ao SNS?

PF- Este é um aspeto muito importante. Temos falado com vários conselhos de administração. Recentemente, a propósito da crise que tem sido verificada na Ginecologia e Obstetrícia, falámos com os responsáveis da Maternidade Alfredo da Costa onde nos foi dito que cerca de quarenta por cento dos nascimentos são de mães estrangeiras, sendo que a maioria não fala português nem inglês. São grávidas que não foram acompanhadas, que aparecem no final do tempo de gestação, algumas inclusivamente em trabalho de parto, e que são recém-chegadas do estrangeiro. Não podemos esquecer que a doutora Marta Temido se demitiu no decurso de um problema relacionado com esta questão – uma grávida estrangeira com complicações que veio para Portugal apenas para ter o seu bebé e que acabou por morrer. Portanto, temos de encarar este problema porque existe um turismo médico dirigido a Portugal. É um turismo que vem para o SNS. Muitas pessoas com doenças graves vêm para o nosso país porque sabem que ao aterrarem têm imediatamente acesso ao nosso serviço de saúde. É um assunto que tem que ser estudado e enfrentado. Os recursos do Serviço Nacional de Saúde não devem estar disponíveis para todas as pessoas do mundo que queiram vir fazer turismo médico. É um problema que tem que ser visto com humanismo, mas também com pragmatismo… Os recursos são limitados e os portugueses têm que vir primeiro no atendimento.

HN- O CHEGA alerta que “em breve, e a este ritmo, mais de 2 milhões de portugueses estarão sem médico de família”. A cobertura de toda a população é uma promessa realista? Como pensam garantir a sua concretização?

PF- Começa desde logo pela valorização das carreiras e pela remuneração dos médicos, de acordo com a sua produção naquilo que nas Unidades de Saúde Familiar modelo B. O CHEGA quer criar uma figura que é a figura do “gestor da UCSP/USF”. Será uma pessoa que deve coordenar e apoiar as equipas de saúde nas áreas administrativas, de gestão e na resolução de conflitos, libertando médicos e enfermeiros para fazerem aquilo que sabem: acompanhar e tratar os seus utentes. Com esta medida administrativa e independência das próprias unidades de cuidados primários, consideramos que podemos agilizar e muito aquilo que são as listas de espera para se obter o médico de família.

HN- Mas voltando à pergunta, é ou não realista atribuir médico de família para todos os utentes? Todos os partidos prometem esta medida. 

PF- Todos os partidos prometem, mas poucos o fazem. É por isso que temos de criar umas Unidades de Saúde Familiar 2.0. Isto é, um novo paradigma.

HN- Entre as prioridades para a saúde é apontada a modernização do SNS, “fazendo uso das inovações tecnológicas e inteligência artificial, garantindo assim uma maior informatização, eficiência operacional e, consequentemente, um melhor serviço prestado ao utente”. O Chega pensa dotar os CSP de equipamento tecnológico que permita a internalização dos exames complementares de diagnóstico?

PF- Sim. Temos de equipar os Cuidados de Saúde Primários de alguns meios complementares de diagnóstico, como eletrocardiogramas, raio x, gasimetria e avaliação laboratorial que permita diagnosticar e tratar casos mais complexos. Isso vai evitar a deslocação para o hospital e retirar a pressão sob as consultas de especialidade. Com essa atualização das Unidades de Saúde Familiar 2.0 vamos conseguir captar mais médicos. Em Portugal não há falta de médicos. Portugal tem é falta de médicos a trabalhar no SNS. Portanto, se estes profissionais forem valorizados e estiverem motivados para tirarem a sua especialidade de Medicina Geral e Familiar tenho a certeza que eles corresponderão.

No fundo, esta medida vai permitir ao médico de família fazer diagnósticos mais céleres, ao mesmo tempo em que se retira peso orçamental, uma vez que evita a contratualização de prestadores de serviço nas análises clínicas ou nos exames complementares de diagnóstico mais simples.

HN- A nível hospitalar, quais as fragilidades que identificam e que pretendem ver melhoradas?

PF- Vai ter que se avançar com a construção dos hospitais que estão prometidos há décadas. Nestes últimos oito anos, o Partido Socialista não inaugurou um único hospital. Já o setor privado, sim, inaugurou várias unidades hospitalares. Portanto, temos que avançar com a construção do Hospital do Seixal, do Algarve, de Lisboa Oriental e do Oeste. É claro que a nível da gestão e da organização temos de promover uma reorganização, dando autonomia aos conselhos de administração. Esta pseudo reforma das Unidades Locais de Saúde que foi feita, para o CHEGA é apenas uma reforma de “maquilhagem”. As ULS continuam altamente dependentes das autorizações do Ministério das Finanças e continuam altamente politizadas… Os conselhos de administração são feitos por nomeação política e não por meritocracia. Os próprios administradores hospitalares queixam-se que as suas próprias carreiras também não são valorizadas e atualizadas. O CHEGA defende que ao fim de cada mandato, as pessoas devem ser recompensadas pelos bons resultados que demonstraram ou, se for o caso contrário, responsabilizados por aquilo que aconteceu de menos bom.

HN- Afirmou que o partido quer voltar a implementar as PPP nos hospitais. Existe outras áreas do SNS que pensam poderem ser entregues à gestão privada?

PF- Sim, desde logo nos Cuidados de Saúde Primários. Para o CHEGA é totalmente atendível que um consórcio de médicos se queira juntar e queira fazer uma clínica de CSP para garantir, a uma população que está desprotegida, a prestação de cuidados de Medicina Geral e Familiar.

HN- Fala das USF modelo c?

PF- Sim. Estão legisladas, mas nunca foram implementadas por falta de vontade política. Em Portugal, temos muitas áreas da saúde em que o conhecimento científico e a melhor prática estão no setor privado. Ora, daí ser reconhecido, sem nenhum tipo de preconceito ideológico, que este deve ser aproveitado pelo Serviço Nacional de Saúde.

HN- Agora sobre a saúde preventiva. Defendem a atualização do Plano Nacional de Vacinação, “garantindo a disponibilidade de vacinas essenciais, sobretudo para a população infantil”. De que vacinas falam?

PF- Não quisemos mencionar especificamente nenhum serotipo vacinal para não sermos acusados, pelos partidos da esquerda, de estarmos a beneficiar os grandes grupos farmacêuticos. No entanto, posso dizer-lhe que do ponto de vista do Plano Nacional de Vacinação para as crianças, o que achamos que há uma necessidade premente é a vacina para o Vírus Sincicial Respiratório. A imunização das crianças permite a grandes ganhos em saúde, com uma diminuição abrupta dos internamentos com infeções respiratórias.

Para os adultos, defendemos a inclusão da vacina do HPV e a vacina para o herpes zoster no Plano Nacional de Vacinação. Esta infeção é responsável por uma condição bastante gravosa que é a Zona.

Entrevista de Vaishaly Camões

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