Minha saúde, o meu direito. É o lema escolhido pela Organização Mundial de Saúde para ilustrar o dia mundial de saúde de 2024. Numa altura em que o acesso aos cuidados de saúde encontra-se, um pouco por todo o mundo, ameaçado, o lema para este ano não poderia ter sido mais acertado.
Todos têm direito a ter acesso a cuidados de saúde de qualidade. Para isso, os sistemas de saúde têm de ser construídos segundo critérios de equidade e solidariedade. Não há outra forma de garantir o acesso universal aos cuidados de saúde.
A poluição e as alterações climáticas são um problema do presente, não do futuro. São uma das maiores causas de mortalidade e morbilidade. Como sempre, são as zonas mais pobres e desfavorecidas que mais sofrem o efeito da poluição e o consequente aumento das desigualdades em saúde. As alterações climáticas condicionam o acesso aos cuidados. Lutar pelo direito à saúde significa, necessariamente, defender políticas que promovam a sustentabilidade ambiental.
Apenas 140, dos 195 países, reconhecem que a saúde é um direito fundamental. São ainda menos os que passam das palavras aos atos, deixando 4.5 mil milhões de pessoas sem acesso a cuidados de saúde básicos. O ciclo de pobreza doença nunca será quebrado sem um sólido compromisso na defesa e promoção da saúde.
O direito à saúde também se intersecciona com outro problema muito sentido em Portugal: a habitação. Como defender o acesso equitativo a cuidados de saúde se a habitação não oferece o mínimo de condições? Se é demasiada fria ou quente, se é demasiado húmida ou se vivem demasiadas pessoas num pequeno espaço? Querer uma habitação digna para todos também é contribuir para a melhoria do estado de saúde da população.
Cerca de 12% dos portugueses encontram-se em situação de insegurança alimentar moderada a severa. Ou seja, mais de um em cada dez portugueses nunca terá condições para garantir o direito à saúde. Um corpo sem alimentação adequada, nunca será um corpo saudável. E sem sequer abordar as escolhas alimentares. Podemos comer o suficiente em termos calóricos, mas com escolhas erradas, promovidas por políticas erradas que cedem aos determinantes comerciais da saúde, também não teremos saúde. Enquanto houver pessoas com insegurança alimentar, o acesso à saúde nunca será pleno.
Minha saúde, o meu direito. Impossível sem segurança no trabalho, sem boas condições laborais, sem leis que equilibrem o desequilíbrio de forças sempre presente nos locais de trabalho. Mas mesmo com leis adequadas, de nada servem se a regulação continuar, como até agora, inexistente.
Os determinantes políticos da saúde fazem-se sentir em várias dimensões das nossas vidas. Em Portugal, uma das mais intensas é na taxa de atividade física. Segundo o Eurostat, Portugal é segundo país europeu onde os adultos menos andam a pé ou de bicicleta e dos que menos praticam exercício físico de forma regular. Não deveria ser surpreendente. Quando todo o planeamento urbano é centrado no carro, é natural que as pessoas sigam o incentivo que os seus decisores políticos criam. Sem coragem para romper com este ciclo, continuaremos na causa da Europa por longos anos.
O que é preciso para que “a minha saúde, o meu direito” seja realmente atingido? Mais e melhor democracia. É nos países democráticos que existe melhor saúde. É nas democracias que as pessoas têm maior agência e maior escrutínio. É a democracia, com todas as suas imperfeições, que cria os incentivos para que os políticos respondam às necessidades de saúde da população. Quando hoje muitos prometem o autoritarismo como resposta para todos os problemas, imaginários ou reais, é importante lembrar que sem democracia não há saúde para todos.
Falei de saúde sem nunca ter falado de profissões, hospitais ou doenças. Porque para ter saúde é preciso muito mais que o moderno equipamento de imagem, ou o domínio da mais recente técnica cirúrgica. É preciso uma verdadeira aposta na promoção da saúde e uma abordagem centrada nos determinantes sociais da saúde, com foco na equidade.
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