Tratamentos caseiros de conjuntivite preocupam autoridades moçambicanas

8 de Abril 2024

A crescente notificação de casos de complicações severas da conjuntivite hemorrágica no atual surto da doença em Moçambique, após tratamentos caseiros e autotratamento, está a motivar cegueira e a preocupação das autoridades sanitárias em Sofala.

“Neste momento temos 36 doentes internados por complicações severas, (…) torna-nos difícil dizer se perderão ou não a visão, porque o grau de infeção e inflamação é alto e neste momento estamos a lutar para reduzir a inflamação”, explicou a diretora clínica do Hospital Central da Beira (HCB), na província de Sofala, Ana Tambo.

Em causa, explicou, está o facto de grande parte dos doentes afetados pela conjuntivite no surto que afeta várias províncias do país recorrerem ao autotratamento com prática inadequadas – reportadas noutros províncias -, lavando os olhos com urina, limão ou piripiri.

“Alguns, com certeza, vão perder a visão, isto por causa de más práticas”, reconheceu a clínica, acrescentando que entre estes doentes, alguns terão de ser submetidos a cirurgia.

Ainda assim, a diretora clínica do HCB, o maior hospital do centro do país, disse que nos últimos dias o número de casos de conjuntivite reduziu significativamente, dos anteriores 150 diários para cerca de 50: “Podemos dizer que neste momento os números tendem a cair a cada dia”.

A Lusa noticiou na sexta-feira que mais 11 pessoas ficaram cegas em Moçambique, na província de Cabo Delgado, após recorrerem a “tratamento caseiro” para a conjuntivite.

“Tivemos três casos com perda total de visão nos dois olhos. Os outros oito tiveram perda de visão não na totalidade, ou seja, apenas um olho de cada um deles se perdeu totalmente”, disse o diretor clínico do Hospital Provincial de Pemba, Cristóvão Matsinhe.

Em causa está “o tratamento caseiro da conjuntivite, com destaque para colocação de urina nos olhos, pasta dentrífica, água da praia e piripiri”.

A província de Cabo Delgado foi das primeiras a ser afetada pelo surto de conjuntivite, chegando a mais de mil casos diários, número que atualmente reduziu para 50, segundo as autoridades locais.

Dados revelados pelo diretor clínico do Hospital Provincial de Pemba indicam que até agora foram registados 11.174 casos de conjuntivite bacteriana e 155 de conjuntivite hemorrágica.

“Neste momento temos a situação mais ou menos controlada. Nestas últimas semanas estamos a ter um registo diário abaixo de 50 casos de conjuntivite hemorrágica, o que para nós é satisfatório”, assegurou.

Nove pessoas ficaram cegas, na província de Nampula, norte de Moçambique, devido a “perfurações irreversíveis” provocadas pelo recurso a substâncias como urina e combustível contra a conjuntivite hemorrágica.

“Há nove pacientes que tiveram que retirar os olhos. Estes pacientes chegaram com perfurações graves” e “numa fase irreversível” devido à automedicação contra a conjuntivite hemorrágica, afirmou na quarta-feira Sândia Sumbane, médica oftalmologista do Hospital Central de Nampula.

“Há casos de pacientes que fazem a lavagem com a urina, alguns com água e sabão em forma de gotas no olho, são pacientes que tiveram conjuntivite hemorrágica e a maior parte deles não se dirigiram à unidade sanitária, preferiram fazer automedicação”, acrescentou Sândia Sumbane.

No dia 22 de março, o presidente da Confederação das Associações Económicas de Moçambique (CTA), Agostinho Vuma, alertou, em Maputo, que o surto de conjuntivite que afeta várias regiões do país está a condicionar a produtividade das empresas.

“A emergência do surto de conjuntivite está a afetar a produtividade laboral. As empresas têm estado a dispensar os funcionários afetados, que ficam mais de 15 dias em casa, afetando o desempenho das empresas”, disse Vuma.

O Ministério da Saúde indicou recentemente que aumentaram para aproximadamente 17 mil os moçambicanos infetados pelo adenovírus que causa a conjuntivite hemorrágica, particularmente nas províncias de Nampula e de Sofala.

LUSA/HN

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